Governo avalia relicitar a Estrada de Ferro Carajás após impasse com a Vale, em meio a divergências sobre indenização e futuro das concessões ferroviárias.
O Ministério dos Transportes passou a avaliar a relicitação da Estrada de Ferro Carajás (EFC), eixo ferroviário de 997 km operado pela Vale entre Parauapebas (PA) e o porto de São Luís (MA).
A movimentação ocorre após o fracasso das negociações para repactuar as concessões da empresa e da revisão, pela ANTT, do cálculo de indenização por bens não amortizados, que caiu de cerca de R$ 19 bilhões para aproximadamente R$ 8,5 bilhões em valor presente.
Procurada, a companhia afirma que “adotará as medidas necessárias para assegurar seus direitos” e sustenta que os contratos prorrogados em 2020 seguem válidos até 2057.
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Governo aciona AGU e Infra S.A. para viabilizar eventual retomada
Segundo integrantes do governo, o Ministério dos Transportes encaminhou pedido formal à AGU para mapear caminhos jurídicos que permitam a retomada do ativo, caso a relicitação avance.
Em paralelo, a estatal Infra S.A. foi acionada para desenvolver estudos técnicos sobre um possível novo certame da EFC.
A área técnica vê a EFC como ativo estratégico para o escoamento de minério e para a integração com a malha nacional.
A avaliação ganhou força depois que as tratativas com a Vale, iniciadas para corrigir distorções apontadas na prorrogação feita em 2020, não produziram consenso.
Revisão da ANTT muda a conta da indenização à concessionária
O impasse se agravou quando a ANTT refez a estimativa dos ativos ferroviários ainda não amortizados vinculados às concessões.
A agência passou a adotar parâmetros que, na avaliação do governo, refletem de forma mais fiel o valor presente desses bens reversíveis, reduzindo a indenização potencial de cerca de R$ 19 bilhões para R$ 8,5 bilhões.
Para o Ministério dos Transportes, a revisão abriu espaço para exigir compensações adicionais na repactuação.
A mineradora, por outro lado, classificou a mudança como ruptura do que havia sido pactuado e rejeitou as novas bases, o que inviabilizou a assinatura do acordo.
Protocolo de 2024 previa pacote de R$ 17 bilhões
As negociações haviam avançado em dezembro de 2024, quando governo e Vale firmaram um protocolo de repactuação.
Pela proposta, a empresa faria um aporte adicional de R$ 11 bilhões, com R$ 4 bilhões pagos de imediato como “ajuste regulatório preliminar” e R$ 7 bilhões condicionados à mediação do TCU nas etapas finais do acordo.
O pacote incluía ainda R$ 6 bilhões que o governo pretendia direcionar à construção de uma nova ferrovia ligando Rio de Janeiro e Espírito Santo, completando o montante de R$ 17 bilhões.
A revisão da indenização pela ANTT, porém, alterou a equação econômico-regulatória e travou a conclusão do entendimento.
Vale notifica mercado e mantém validade dos contratos
Sem consenso, a Vale comunicou ao mercado em 28 de agosto que não houve acordo com a União e a ANTT dentro do prazo estipulado para a repactuação da EFC e da Estrada de Ferro Vitória a Minas (EFVM).
No mesmo informe, reiterou que os termos aditivos assinados em 16 de dezembro de 2020, que prorrogam as concessões até 2057, permanecem em vigência.
A empresa também declarou que “permanece comprometida com as bases gerais para a repactuação estabelecidas no acordo celebrado em 30 de dezembro de 2024”, sem abrir mão de recorrer aos instrumentos administrativos e judiciais cabíveis.
EFC na mira; EFVM tende a seguir com a empresa
Enquanto a EFC entrou no radar de relicitação, a avaliação interna do governo é que não há, neste momento, questionamento relevante sobre a manutenção da EFVM sob gestão da Vale.
O contrato da Vitória a Minas está atrelado à obrigação de a concessionária construir o primeiro trecho da Ferrovia de Integração Centro-Oeste (Fico), entre Mara Rosa (GO) e Água Boa (MT), com 383 km.
Na hipótese de relicitação da EFC, o governo estuda aproveitar recursos de outorga e eventuais contrapartidas para acelerar projetos estruturantes da malha, como a Fiol e obras logísticas na Bahia, além de melhorar a capacidade de escoamento na faixa Norte.
Essa diretriz vinha sendo discutida nas tratativas, mas não houve consenso sobre o desenho final.
O que está em jogo para a logística nacional
A Estrada de Ferro Carajás é o principal corredor do minério de ferro extraído em Carajás, conectando as minas ao Porto de Itaqui, em São Luís.
Qualquer alteração no operador ou no regime contratual afeta planejamento de investimentos, capacidade de transporte e tarifas praticadas no corredor.
Além do impacto direto na Vale, a decisão define precedentes regulatórios sobre a metodologia de cálculo de indenizações por bens reversíveis em extinção antecipada de concessões.
O tema tem repercussões sobre outros contratos do setor de infraestrutura e é acompanhado por investidores e órgãos de controle.
Próximos passos dependem de pareceres e de aval do TCU
A AGU trabalha em pareceres para orientar a viabilidade jurídica de uma eventual retomada e novo leilão.
A Infra S.A. prepara estudos técnicos, que embasarão uma decisão política sobre seguir ou não com a relicitação da EFC.
Qualquer solução definitiva deve passar pelo TCU, responsável por validar os termos econômicos e regulatórios.
Até que haja deliberação, seguem válidos os contratos em vigor.
O governo indica que buscará maximizar contrapartidas para a malha nacional, enquanto a Vale afirma que defenderá seus direitos dentro das regras do contrato e do marco legal das concessões.
Por que o governo deveria relicitar a EFC agora ou insistir em uma nova rodada de negociações com a Vale para fechar uma repactuação mais robusta?