Data center do TikTok em Caucaia pode consumir tanta água quanto toda a população da cidade — em uma região que já enfrenta secas severas.
O Ceará está prestes a receber um dos maiores data centers da América Latina, com capacidade estimada para consumir até 1 gigawatt de energia. Quem está por trás do projeto é a gigante chinesa ByteDance, dona do TikTok, que avalia a construção da unidade no complexo industrial e portuário de Pecém. O objetivo? Transformar o estado nordestino em um polo global de processamento de dados, inteligência artificial e computação em nuvem.
O investimento é estimado em mais de R$ 50 bilhões, segundo fontes próximas às negociações. A estrutura inicial terá 300 megawatts de potência, mas poderá triplicar de tamanho. Trata-se de uma infraestrutura comparável ao consumo de energia de cidades inteiras. Segundo um estudo obtido pelo Intercept Brasil, o consumo previsto será equivalente ao de 2,2 milhões de pessoas — e pode atingir a marca de 3,2 milhões se o centro atingir sua capacidade máxima.
Um projeto grandioso nascido no sertão
A proposta está sendo liderada pela Casa dos Ventos, empresa brasileira especializada em energia renovável, com foco em projetos eólicos e solares. Ela já obteve a licença prévia junto à Secretaria do Meio Ambiente do Ceará e aguarda as autorizações finais do Ministério de Minas e Energia e do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). A escolha do local não é casual: o porto de Pecém oferece logística internacional e está conectado a parques eólicos próximos, facilitando o uso de energia 100% limpa para abastecer o centro de dados.
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O sistema de resfriamento da estrutura usará circuito fechado, o que significa que a água utilizada não será descartada após o uso, mas recirculada dentro da estrutura — uma tentativa de mitigar o impacto em uma região que sofre, historicamente, com a escassez hídrica. Mesmo assim, os números preocupam: a estimativa é de que o consumo de água represente 0,045% da demanda residencial de todo o município de Caucaia. Pode parecer pouco, mas em uma área com histórico de secas prolongadas, qualquer pressão adicional sobre os recursos hídricos é motivo de alerta.
Desenvolvimento ou ameaça silenciosa?
Por trás do otimismo econômico — o projeto promete gerar milhares de empregos e consolidar o Brasil como destino global para tecnologia de ponta — há um debate silencioso ganhando força. O consumo energético massivo e a demanda por água levantam preocupações sobre o impacto ambiental e social desse tipo de empreendimento em regiões vulneráveis. E há uma ironia evidente: a escolha de uma cidade como Caucaia, que já enfrentou crises hídricas severas, para abrigar um dos maiores consumidores de eletricidade e água do país.
Para o governo federal, trata-se de um marco estratégico. O próprio vice-presidente Geraldo Alckmin tem acompanhado as negociações, vendo no projeto uma chance de posicionar o Brasil como hub de inteligência artificial e processamento de big data. A expectativa é que o TikTok use a estrutura para acelerar o desempenho de seus algoritmos, desenvolver produtos em tempo real e armazenar dados localmente, de acordo com exigências da legislação brasileira.
A previsão é que as obras comecem ainda em 2025, com conclusão parcial prevista para 2027. Até lá, outros gigantes da tecnologia — como Amazon, Google e Microsoft — também estudam projetos semelhantes no país, todos interessados em explorar a vantagem comparativa do Brasil: uma matriz energética limpa e abundante, baseada em hidrelétricas, eólicas e solares.
Mas especialistas alertam: sem um planejamento adequado, a corrida pelos data centers pode gerar uma nova crise energética. Já há atrasos em linhas de transmissão, gargalos em licenciamento e falhas na regulação ambiental. O caso do Ceará pode servir de exemplo — ou de aviso.