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Um buraco gigantesco — com área equivalente à da Suíça — surgiu no gelo marinho da Antártida

Escrito por Fabio Lucas Carvalho
Publicado em 22/04/2025 às 15:21
Antártida
Foto: REPRODUÇÃO
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Estudo mostra que combinação de padrões de vento, temperatura e salinidade provocou a abertura da rara polínia antártica

O que parecia ser apenas mais um inverno na Antártida se transformou em uma descoberta científica impressionante. No meio da imensidão gelada do continente, cientistas da NASA observaram algo completamente fora do comum: uma mancha escura e enorme no gelo marinho.

Esse fenômeno, chamado de polínia, surpreendeu especialistas por sua dimensão e localização.

Um buraco do tamanho da Suíça

A polínia chamou atenção desde a primeira aparição. Ela cresceu até alcançar a extensão da Suíça e ficou visível por semanas, em uma área completamente cercada por gelo.

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O mais intrigante era sua distância da costa e sua posição sobre um platô submerso conhecido como Maud Rise. Após o gelo se recompor, os cientistas começaram a investigar como algo assim poderia ocorrer tão longe da terra firme.

O que são polinias?

As polinias são aberturas temporárias no gelo marinho. No Oceano Antártico, o mar funciona como um “bolo de camadas”: uma cobertura de água fria e menos salgada por cima, repousando sobre águas mais quentes e salgadas. Essas diferenças de densidade mantêm o sistema relativamente estável.

Para que uma polínia se forme, é preciso que essa estabilidade seja quebrada. O sal precisa subir, tornando a camada superior mais densa, o que inicia um processo de convecção. Quando isso acontece, o gelo se rompe, o calor escapa e o oceano libera gases.

Polínias que surgem perto da costa são mais comuns, causadas por ventos que empurram o gelo para longe. Já as que ocorrem em alto-mar, como a de Maud Rise, são mais raras e exigem uma combinação precisa de fatores.

O enigma de Maud Rise

Maud Rise é uma elevação submersa de 1.402 metros. Nos anos 1970, satélites detectaram uma polínia gigantesca nessa mesma região durante três invernos consecutivos. Na época, os cientistas imaginaram que o fenômeno seria recorrente. No entanto, desde então, ele tem aparecido apenas esporadicamente e por curtos períodos.

Em 2017, a polínia retornou em grande escala, reacendendo o interesse científico. Um grupo de pesquisadores liderado por Aditya Narayanan, da Universidade de Southampton, decidiu investigar. Eles usaram robôs flutuantes, focas marcadas com sensores e modelos oceânicos para entender o fenômeno.

Fatores que explicam o fenômeno

Durante os invernos analisados, o Giro de Weddell — uma corrente oceânica que gira no sentido horário — se intensificou. Isso trouxe camadas de água mais quentes e salgadas à superfície, o que enfraqueceu o gelo por baixo.

Contudo, esse derretimento deveria causar um resfriamento na camada superior, interrompendo o processo. Mas algo impediu isso.

Segundo o professor Fabien Roquet, da Universidade de Gotemburgo, era necessário que mais sal chegasse à superfície para manter a convecção ativa.

As tempestades extratropicais ajudaram, empurrando gelo marinho e trazendo água salgada até Maud Rise. Também houve contribuição dos chamados “rios atmosféricos”, nuvens úmidas que aquecem a superfície.

O papel do transporte de Ekman

Outro fator decisivo foi identificado em um conceito físico antigo: o transporte de Ekman. Quando o vento sopra sobre o oceano, a rotação da Terra faz com que a água superficial se desloque em um ângulo. Esse movimento empurrou água salgada diretamente para a região norte de Maud Rise, justamente onde a polínia se formou.

Segundo o pesquisador Alberto Naveira Garabato, também da Universidade de Southampton, esse transporte foi o elemento final necessário. As tempestades ajudaram não só a mover o gelo, mas também a posicionar a água correta no local certo.

Com a convecção em curso, o buraco no gelo liberou mais de vinte vezes o calor que normalmente escaparia por uma camada intacta. No final de setembro, a polínia congelou novamente.

Impacto global do fenômeno

Embora localizado na Antártida, o fenômeno pode ter efeitos em todo o planeta. A professora Sarah Gille, da Universidade da Califórnia em San Diego, explicou que os efeitos de uma polínia permanecem na água por anos.

Ela pode influenciar o caminho das correntes oceânicas, modificar a forma como o calor se distribui e até alterar a circulação global. Durante o processo, a água rica em carbono sobe à superfície e libera CO₂. Já a salmoura, rica em oxigênio, afunda e reforça correntes profundas.

Esse processo alimenta a chamada “correia transportadora” das correntes globais, que tem papel fundamental na regulação do clima mundial.

O que esperar dos próximos invernos

O futuro das polinias depende das mudanças no clima. O mecanismo observado em Maud Rise precisa de um giro mais forte e tempestades intensas, condições que podem se tornar mais frequentes com o aquecimento global.

Desde 2016, cientistas notaram uma tendência de queda no volume de gelo marinho na Antártida. Até então, ele se mantinha estável. A mesma água quente e salgada que formou a polínia em 2017 agora parece estar afinando o gelo nas bordas do continente.

Pesquisadores vão continuar monitorando a região durante os próximos invernos. Mesmo que a polínia não volte a se formar, sua presença recente mostrou que a Antártida ainda guarda segredos.

E mais do que isso: o que acontece no gelo do extremo sul pode ter efeitos bem distantes dali, influenciando oceanos, climas e ecossistemas em todo o planeta.

O estudo completo sobre a polínia de Maud Rise foi publicado na revista Science Advances.

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Fabio Lucas Carvalho

Jornalista especializado em uma ampla variedade de temas, como carros, tecnologia, política, indústria naval, geopolítica, energia renovável e economia. Atuo desde 2015 com publicações de destaque em grandes portais de notícias. Minha formação em Gestão em Tecnologia da Informação pela Faculdade de Petrolina (Facape) agrega uma perspectiva técnica única às minhas análises e reportagens. Com mais de 10 mil artigos publicados em veículos de renome, busco sempre trazer informações detalhadas e percepções relevantes para o leitor. Para sugestões de pauta ou qualquer dúvida, entre em contato pelo e-mail flclucas@hotmail.com.

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