Disputa entre gigantes da indústria automotiva expõe divergências sobre incentivos fiscais e produção nacional, levando o governo a intervir com medida que tenta equilibrar competitividade, geração de empregos e avanço de novas tecnologias no Brasil.
O Brasil assistiu a um intenso confronto entre grandes montadoras tradicionais e a chinesa BYD, que conseguiu mobilizar o governo para tentar mediar o embate com uma medida de compromisso.
A tensão teve início quando a BYD solicitou ao governo redução do imposto de importação sobre veículos semidesmontados (SKD) e desmontados (CKD), em operação iniciada em sua unidade na antiga fábrica da Ford em Camaçari (BA), adquirida por R$ 287,8 milhões.
O pedido era para que SKD pagasse 10% e CKD apenas 5% de imposto.
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As montadoras Volkswagen, Toyota, Stellantis (controladora de marcas como Fiat, Jeep e Peugeot) e GM reagiram com uma carta ao presidente Lula, manifestando que tais benefícios poderiam gerar desemprego, desequilíbrio na balança comercial, dependência tecnológica e “um legado de desemprego, desequilíbrio da balança comercial e dependência tecnológica”.
Reação da BYD às críticas
Em contrapartida, a BYD respondeu com críticas ácidas: afirmou que “os dinossauros surtam”, acusando as concorrentes de tentarem barrar veículos elétricos mais acessíveis para a classe média.
A empresa alegou que o tom das tradicionais tinha “o tom dramático de quem acaba de ver um meteoro no céu”.
Segundo a fabricante, o problema não seria o meteoro, mas o fato de que ele estaria “sendo bem recebido pelos consumidores — aqueles mesmos que, por décadas, foram obrigados a pagar caro por tecnologia velha e design preguiçoso”.
A BYD acrescentou ainda que “chega uma empresa chinesa que acelera fábrica, baixa preço e coloca carro elétrico na garagem da classe média, e os dinossauros surtam”.
Decisão do Gecex-Camex
Diante da escalada, o Comitê Executivo de Gestão da Câmara de Comércio Exterior (Gecex-Camex) decidiu adotar uma solução intermediária.
Ficou definido que a alíquota máxima de importação de 35% para veículos eletrificados desmontados ou semidesmontados será aplicada a partir de janeiro de 2027, antecipando em um ano e meio o prazo que era julho de 2028.
Em paralelo, foi autorizada uma cota de isenção total de impostos por seis meses, limitada a US$ 463 milhões, para a importação de kits CKD e SKD.
Repercussão no setor automotivo
A decisão foi bem recebida pelas fabricantes tradicionais e pela Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea).
Igor Calvet, presidente da entidade, considerou o prazo como “o máximo aceitável sem colocar em risco os investimentos atuais e futuros da cadeia automotiva nacional” e enfatizou a esperança de que a discussão fosse encerrada sem possibilidade de renovação.
A Volkswagen destacou que decisões como essa promovem “segurança jurídica, previsibilidade e um ambiente saudável de concorrência”.
Já a GM avaliou que a medida representa “um passo importante em direção a um ambiente regulatório mais justo e competitivo”.
Meio-termo entre inovação e proteção da indústria
Analistas interpretam que o governo buscou um meio-termo válido: as montadoras tradicionais conquistaram a antecipação da cobrança da alíquota plena, enquanto a BYD e outras empresas novas mantêm um espaço de transição para finalizar suas estruturas produtivas no país.
O acordo coloca um ponto final momentâneo na acirrada disputa pública, ao mesmo tempo em que abre caminho para que a BYD e similares avancem com seus planos de nacionalização, dentro de parâmetros fiscais mais claros.
Já as montadoras tradicionais reforçam sua defesa da indústria nacional e da geração de empregos.
Qual desses elementos – antecipação do imposto, cota temporária de isenção ou o impacto sobre a cadeia de autopeças – será mais decisivo para o futuro da indústria automotiva brasileira?