Estratégia do Tesouro Nacional visa conter a forte pressão gerada pela concorrência com debêntures de infraestrutura isentas de imposto e por incertezas fiscais, em um movimento que o mercado financeiro apelidou de “cancelamento branco”.
O Tesouro Nacional decidiu pisar no freio e reduzir a oferta ao mercado das NTN-Bs (Notas do Tesouro Nacional – Série B), seus títulos públicos atrelados à inflação (IPCA) com vencimentos mais longos. A medida é uma resposta direta à crescente dificuldade de vender esses papéis em condições favoráveis, pressionado por taxas cada vez mais altas exigidas pelos investidores. Nos bastidores, a ação é vista como uma manobra necessária para evitar a deterioração do custo da dívida pública federal.
Segundo a reportagem da Folha de S. Paulo, essa crise em torno dos títulos de inflação continua mesmo após a derrubada de uma Medida Provisória que buscava aumentar impostos sobre aplicações concorrentes. O problema central é a competição com as debêntures de infraestrutura, que possuem isenção de Imposto de Renda e se tornaram muito mais atraentes para o capital. Essa distorção força o governo a pagar mais caro para financiar suas operações, um cenário que tende a se agravar com o ciclo de investimentos em projetos privados.
A concorrência fiscal e o “cancelamento branco”
A principal fonte de pressão sobre o Tesouro vem da diferença tributária.
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Enquanto o investidor de títulos públicos paga uma alíquota de Imposto de Renda que varia entre 15% e 22,5%, quem aplica em debêntures de infraestrutura é isento.
Essa vantagem permite que as empresas emissoras desses títulos privados captem recursos oferecendo taxas menores, algo que o governo não consegue replicar sem arcar com um custo financeiro maior, conhecido como prêmio de risco.
Diante desse quadro, a estratégia do Tesouro foi diminuir drasticamente o volume de títulos ofertados nos leilões, no que o mercado apelidou de “cancelamento branco”.
Na prática, a ação equivale a quase suspender as vendas. Lotes que em setembro chegaram a 150 mil e 750 mil títulos foram reduzidos para apenas 50 mil nos leilões mais recentes.
Trata-se de uma tática para dar tempo ao mercado e não ser forçado a aceitar taxas de juros consideradas excessivamente altas.
Estratégia para 2026 e o custo da dívida
Analistas apontam que a decisão do Tesouro também está conectada a um planejamento de longo prazo.
Segundo Luis Felipe Vital, estrategista-chefe da Warren Rena, o órgão está emitindo mais títulos do que os vencimentos (uma rolagem de 130%) para reforçar o chamado “colchão de liquidez” para 2026, um ano eleitoral tradicionalmente desafiador.
A meta é garantir recursos para cobrir as contas do governo por mais de oito meses sem depender de novos leilões em caso de turbulências.
No entanto, essa necessidade de caixa esbarra no custo gerado pelas distorções de mercado.
Paulo Valle, ex-secretário do Tesouro, explica que a concorrência com as debêntures incentivadas cria um subsídio pago pelo governo, que é obrigado a oferecer juros maiores.
A manutenção desse benefício fiscal foi duramente criticada pelo ex-presidente do Banco Central, Armínio Fraga, que classificou a medida como uma “barbeiragem” sem justificativa econômica ou social, que interfere diretamente no financiamento da dívida pública.
A decisão do Tesouro de reduzir a oferta de títulos IPCA é uma manobra defensiva em um cenário complexo.
De um lado, precisa se preparar para os desafios fiscais dos próximos anos; de outro, lida com uma concorrência que eleva seus custos.
A forma como essa equação será resolvida impactará diretamente o bolso dos investidores e a saúde das contas públicas.
Você concorda com essa mudança? Acha que isso impacta o mercado? Deixe sua opinião nos comentários — queremos ouvir quem vive isso na prática.