STJ decide que idoso vítima de golpe em empréstimo não tem direito automático a indenização. Justiça mantém devolução do valor, mas exige prova do sofrimento moral, gerando polêmica no país.
Em abril de 2024, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tomou uma decisão que dividiu opiniões e levantou forte debate sobre a proteção jurídica de idosos no Brasil. Por maioria de votos, a 3ª Turma do STJ decidiu que a simples fraude em empréstimo consignado não garante automaticamente indenização por dano moral, mesmo quando há desconto indevido no benefício do aposentado.
A decisão repercutiu em todo o país e acendeu o alerta entre especialistas em direito do consumidor e proteção ao idoso, que veem o julgamento como um retrocesso na defesa de uma das populações mais vulneráveis do sistema bancário.
O caso que chegou ao STJ
O processo analisado envolvia um aposentado que descobriu descontos em seu benefício do INSS referentes a um empréstimo consignado que ele nunca contratou. O idoso entrou na Justiça pedindo a devolução dos valores e uma indenização por danos morais, alegando que sofreu abalo emocional e constrangimento.
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Embora o banco tenha sido condenado em primeira instância, a instituição recorreu ao STJ, que acabou reformando parte da decisão. A corte manteve a obrigação de devolver o dinheiro descontado indevidamente, mas entendeu que o dano moral não é automático — ou seja, precisa ser comprovado caso a caso.
Segundo o relator “a fraude por si só não presume sofrimento moral, pois pode ocorrer sem conhecimento imediato do consumidor. É necessário demonstrar o abalo concreto sofrido pela vítima”.
O que a decisão significa na prática
A partir desse entendimento, os tribunais de todo o país devem seguir a mesma linha: quando há golpe ou fraude em empréstimos consignados, o idoso terá direito à devolução do valor, mas não necessariamente à indenização por dano moral, a menos que comprove o prejuízo emocional, psicológico ou social.
Em outras palavras, não basta provar que o empréstimo foi fraudulento — é preciso demonstrar como o golpe afetou sua vida pessoal, seja por humilhação, perda de crédito, constrangimento público ou abalo psicológico.
Reação de aposentados e especialistas
A decisão causou forte indignação entre aposentados e entidades de defesa do consumidor. Para os especialistas em direito bancário, o julgamento “abre brecha para que bancos se eximam de responsabilidade, mesmo em casos de falha evidente na segurança”.
“A maioria dos idosos enganados sequer entende o que aconteceu até ver o desconto no benefício. Exigir prova de sofrimento é desumano. O simples fato de ter sido lesado já fere a dignidade”, afirmou uma jurista ao portal Conjur.
O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) também se manifestou, defendendo que a vulnerabilidade do idoso deveria ser reconhecida automaticamente nesses casos. Segundo o órgão, o golpe financeiro contra aposentados não é apenas uma fraude, mas uma violação de direitos humanos que merece tratamento especial.
Um problema que só cresce
Dados do Banco Central e da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) apontam que os golpes de empréstimos consignados contra idosos aumentaram 64% entre 2021 e 2024. Somente em 2024, foram registradas mais de 1,2 milhão de reclamações sobre descontos indevidos em benefícios do INSS.
Em muitos casos, os criminosos usam dados pessoais vazados e firmam contratos falsos por telefone ou plataformas digitais, com assinaturas eletrônicas falsificadas. A maioria das vítimas descobre o problema apenas quando o valor já foi descontado do salário ou aposentadoria.
O entendimento do STJ e seus limites
O STJ reafirmou que os bancos têm responsabilidade objetiva (ou seja, respondem pelos danos causados por falhas de segurança), mas deixou claro que o dano moral precisa ser analisado individualmente.
Assim, a devolução do valor descontado continua garantida, mas a indenização dependerá de prova de sofrimento concreto. Essa decisão se baseia em precedentes anteriores da própria corte (como o REsp 2.077.825/SP), que consolidam a ideia de que “a mera cobrança indevida não gera, por si só, dano moral”.
Impacto social e jurídico
A decisão preocupa especialistas em direitos da pessoa idosa porque pode reduzir a efetividade das ações judiciais movidas por vítimas de fraudes. Na prática, o idoso que for enganado terá mais dificuldade em obter indenização, já que o dano moral agora precisa ser demonstrado com laudos, provas ou testemunhos.
A decisão do STJ representa um novo capítulo no embate entre direitos do consumidor e proteção jurídica dos idosos. Embora mantenha a devolução dos valores em casos de golpe, a exigência de comprovação do dano moral cria um obstáculo para milhares de vítimas que, muitas vezes, não têm acesso a meios de prova ou orientação jurídica adequada.
Mais do que uma discussão legal, o caso reacende o debate sobre como o sistema financeiro e a Justiça brasileira tratam a vulnerabilidade dos idosos, que continuam sendo os principais alvos de fraudes e empréstimos não autorizados.