Maioria do STF autorizou penhora do único imóvel do fiador em ações de aluguel, acirrando disputa judicial e impulsionando alternativas como seguro-fiança e caução. Entenda impactos, riscos e caminhos para preservar o patrimônio no cenário atual.
O Supremo Tribunal Federal firmou, em 26 de maio de 2022, o entendimento de que o imóvel de família do fiador pode ser penhorado para quitar dívidas de aluguel, pouco importando se o contrato é residencial ou comercial.
A tese, aprovada por maioria, enterrou anos de controvérsia e colocou em alerta quem já atua, ou pensa em atuar, como garantia em locações imobiliárias.
Entenda a decisão do STF
No Recurso Extraordinário 1.307.334, os ministros declararam que “é constitucional a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação, seja residencial, seja comercial”.
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A orientação passou a ser aplicada de forma uniforme pelos tribunais estaduais tão logo o acórdão foi publicado.
Em junho do mesmo ano, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça repetiu o raciocínio no Tema 1.091, o que vinculou juízes de todo o país.
Por que o risco aumentou
Os locadores, amparados pela jurisprudência consolidada, vêm recorrendo diretamente ao patrimônio do fiador quando o inquilino deixa de pagar.
Paralelamente, a inadimplência evolui.
Dados da plataforma Superlógica mostram que a taxa média de atraso nos aluguéis chegou a 3,59 % em junho de 2025, o patamar mais alto em doze meses e quase um ponto percentual acima do verificado no mesmo período de 2024.
O segmento residencial de alto padrão mantém índice ainda maior, beirando 6,5 %, o que reforça a percepção de que nenhum nicho está blindado contra calotes.
A conjugação desses fatores leva a uma explosão de execuções judiciais — e, consequentemente, de penhoras — porque a etapa probatória costuma ser mínima: basta comprovar a fiança e a dívida vencida para que o juiz determine a constrição do bem.
Quem pode ser atingido
O efeito da tese alcança contratos firmados antes ou depois de 2022.
Vale a data da execução, não a assinatura.
Também não há distinção entre locações residenciais e comerciais.
Mesmo que o imóvel gravado seja o único bem da família — e portanto protegido, em regra, pela Lei 8.009/90 — a exceção prevista no artigo 3º, inciso VII, prevalece: a casa pode ir a leilão para satisfazer o débito do inquilino.
Alternativas para reduzir a exposição patrimonial
Uma parcela crescente de locadores e inquilinos busca substitutos ao fiador tradicional.
Entre janeiro e agosto de 2024, o seguro-fiança arrecadou R$ 1,147 bilhão, crescimento de 25,7 % ante igual intervalo de 2023, segundo a Confederação Nacional das Seguradoras.
O interesse não é casual: para o inquilino, o produto dilui o custo em parcelas mensais; para o proprietário, garante indenização rápida em caso de atraso.
- Seguro-fiança: contratado pelo inquilino, cobre aluguel e encargos mediante prêmio que varia entre um e um mês e meio de locação por ano.
- Título de capitalização: funciona como caução reforçada; o locatário adquire o título, que permanece bloqueado até o fim da relação e pode ser resgatado se não houver dívida.
- Depósito-caução: permitido pela Lei do Inquilinato, limita-se a três aluguéis e nem sempre cobre períodos longos de inadimplência.
- Fiança bancária: carta de garantia emitida por banco, com tarifa anual em torno de 6 % do montante coberto, após análise de crédito rigorosa.
- Substituição de garantia: o fiador pode pedir exoneração a qualquer momento e oferecer outra proteção; o locador tem trinta dias para aceitar ou rejeitar.
Passo a passo para deixar a fiança
Quem já assumiu o papel de fiador e deseja sair deve notificar o locador por escrito, solicitando a exoneração.
Na mesma comunicação, é preciso apresentar nova garantia, como apólice de seguro ou outro fiador.
Recebida a carta, corre prazo de trinta dias para que o proprietário manifeste concordância ou apresente objeções.
Caso não haja resposta ou a substituição não ocorra, o antigo fiador ainda responde por até 120 dias contados da ciência, período concebido para evitar fraude contra credores.
Dúvidas frequentes nos tribunais
Muitos se perguntam se a venda do imóvel penhorado extinguiria a dívida.
A resposta é negativa: a penhora acompanha o preço, e o cartório só transfere a propriedade se o valor da execução for pago integralmente.
Outra questão recorrente envolve o direito social à moradia.
O STF já examinou o artigo 6º da Constituição ao fixar a tese, motivo pelo qual recursos posteriores têm obtido êxito ínfimo.
Importa frisar que o precedente não se estende a contratos de comodato ou empréstimo gratuito; seu alcance limita-se às locações regidas pela Lei 8.245/91.
Linha do tempo da controvérsia
O debate chegou ao STF em 2021, quando o assunto entrou em pauta no plenário virtual.
Em maio de 2022, a Corte concluiu o julgamento do Tema 1127.
Pouco mais de um mês depois, o STJ replicou a posição no rito dos repetitivos.
Desde 2024, decisões de tribunais estaduais confirmam penhoras sobre o único imóvel do fiador, consolidando o entendimento e reduzindo ainda mais a margem para recurso.
Impacto no mercado de garantias locatícias
Corretoras relatam aumento de até 30 % na procura por seguro-fiança desde a virada de 2025.
Bancos ampliam a oferta de cartas de fiança a pequenas e médias empresas, enquanto imobiliárias incentivam depósitos-caução maiores para compensar a volatilidade econômica.
A tendência é que a figura do fiador pessoa física se torne exceção, reservada a contratos de curta duração ou perfis de inquilinos com baixo score de crédito.
Com as novas regras em vigor e a execução mais célere, você ainda estaria disposto a colocar seu único imóvel em jogo para garantir o contrato de outra pessoa?