Representantes das energias renováveis criticam a Medida Provisória 1.304 e alertam para impactos negativos na geração distribuída. Durante evento em São Paulo, líderes do setor pedem mais diálogo e denunciam a pressão de grandes grupos do setor elétrico.
As discussões sobre a Medida Provisória 1.304/2025, que propõe mudanças nas regras de subsídios e incentivos do setor elétrico, têm provocado intensa mobilização entre representantes das energias renováveis. A proposta, que perde validade se não for votada até 7 de novembro, é vista com preocupação por entidades ligadas à geração distribuída (GD) — especialmente a solar fotovoltaica, uma das fontes que mais crescem no país.
Durante a 5ª edição do Canal Conecta, realizada entre os dias 20 e 21 de outubro no CREA-SP, em São Paulo, líderes do setor revelaram bastidores das negociações em Brasília e criticaram a condução do debate sobre a MP. Para eles, as mudanças podem representar um retrocesso no avanço da energia limpa e na democratização do acesso à geração própria.
Representantes do setor criticam a condução do governo e defendem a GD
O presidente do Movimento Solar Livre (MSL), Hewerton Martins, foi enfático ao questionar a forma como a GD vem sendo tratada nas discussões. Segundo ele, há uma tentativa de culpar a geração distribuída por problemas estruturais do sistema elétrico brasileiro.
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Estado amplia significativamente incentivos para energia renovável
“Faz sentido a geração distribuída, que representa 5,6% da energia do país em 2024, ser apontada como responsável por mais de 90% dos problemas do setor elétrico brasileiro?”, provocou Martins.
O executivo destacou que relatórios da EPE, ANEEL e ONS comprovam que nunca houve apagão causado por GD, e alertou que o país está desperdiçando energia limpa. Ele citou ainda que, segundo o Plano Decenal de Energia (PDE), a única fonte que dobra de tamanho é a térmica.
“O Brasil está jogando energia solar fora. Quando olhamos o relatório da EPE, a única fonte que dobra de tamanho é a térmica. O solar cresce, mas não dobra. Como é possível o PDE prever um aumento tão grande de térmicas para equilibrar o sistema?”, questionou.
Energias renováveis e o empoderamento do consumidor
Martins lembrou que a regulamentação da geração distribuída, criada em 2012, teve como objetivo principal empoderar o consumidor e permitir que cidadãos pudessem gerar sua própria energia. No entanto, com a popularização dos sistemas fotovoltaicos e a redução dos custos, o avanço da GD passou a incomodar grandes grupos do setor elétrico tradicional.
“O que os grandes grupos querem é tirar a parte da GD. Eles não esperavam que o preço da energia solar caísse tanto nem que ela caísse nas graças da população mais humilde”, afirmou o presidente do MSL.
Ele ressaltou que o acesso à tecnologia tem sido um fator de inclusão social e econômica. Segundo Martins, as classes média e baixa finalmente começaram a se beneficiar da geração própria, o que gerou desconforto nas empresas que dominam o mercado.
Com tom crítico, ele ironizou a incoerência das instituições:
“Quando instalam painéis solares no Palácio do Supremo é um projeto de eficiência energética. Mas quando o consumidor faz o mesmo, vira problema.”
Heber Galarce denuncia omissão e defende choque de gestão no setor energético
O presidente do Instituto Nacional de Energia Limpa (INEL), Heber Galarce, também se manifestou com preocupação sobre o andamento das discussões no Senado. Ele relatou o clima das audiências públicas e destacou que as vozes do setor solar pareciam isoladas.
“A impressão que eu tive nas últimas audiências era de que estávamos representando o setor solar contra muita gente. Espero sinceramente que o Palácio comece a olhar para esse problema”, afirmou.
Galarce criticou o discurso de “justiça e competição equilibrada” usado pelos defensores da MP, que, segundo ele, escondem o verdadeiro objetivo: retirar subsídios apenas da geração distribuída.
“Durante a comissão da MP 1.304, disseram que a GD prejudicava o setor por causa dos subsídios. Eu me levantei e sugeri — em tom provocativo — tirar os subsídios de todos. Ninguém levantou a mão. Ou seja, querem tirar só da GD.”
O dirigente também acusou lideranças do setor elétrico de omissão.
“Existe uma grande omissão e covardia de figuras importantes, que não enfrentam a raiz do problema — a necessidade de um choque de gestão no Ministério de Minas e Energia. É mais fácil atacar o nosso setor”, afirmou.
Mobilização nacional e protestos antes da COP 30
Diante do cenário de incertezas, os representantes do setor anunciaram planos de mobilização nacional. Segundo Martins e Galarce, está em andamento a organização de uma grande manifestação antes da COP 30, que será realizada em Belém (PA).
O objetivo é chamar a atenção internacional para o que consideram um risco à sustentabilidade e ao direito dos consumidores de gerar a própria energia.
“Estamos buscando autorizações para o ato. Queremos mostrar que o Brasil está prestes a destruir milhares de empregos e a limitar o direito do consumidor de gerar a própria energia”, afirmou Martins.
A iniciativa pretende reunir empresas, técnicos e consumidores em defesa da geração distribuída, da transição energética justa e da preservação dos avanços conquistados nas energias renováveis.