Crise do leite no Paraná leva produtores à beira do colapso: “Se compro comida para meus filhos, não tenho ração para as vacas”, alerta um dos afetados.
A cadeia produtiva do leite no Paraná vive uma crise tão profunda que produtores rurais afirmam estar diante de dilemas impensáveis: “Se compro comida para meus filhos, não tenho ração para as vacas”. Essa fala dramática, pronunciada em audiência pública na Assembleia Legislativa do Paraná, expõe o colapso econômico que tantos agricultores enfrentam hoje.
O cenário é complexo: a competição com importações de leite em pó, altos custos de insumos como ração, energia elétrica e combustíveis, além de margens cada vez mais apertadas, têm levado muitos produtores à beira da desistência. E a crise não é apenas econômica, é existencial: milhares de famílias do interior dependem dessa atividade para sobreviver.
A origem do drama: importação de leite em pó e preços que afundam
Na audiência na Alep (Paraná), o produtor Meysson Vettorello, de Santa Tereza do Oeste, falou com franqueza sobre a situação: “O produtor de leite hoje está sangrando. Vai chegar o dia em que ele vai ter que escolher se compra alimento para a família ou ração para as vacas.”
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Esse tipo de desabafo, embora chocante, reflete uma realidade ratificada por projetos de lei em tramitação no estado:
- O Projeto de Lei 888/2023 propõe proibir a reidratação de leite em pó importado, impedindo que esse produto seja transformado em leite fluido e vendido como local.
- O Projeto 417/2025 exige que indústrias informem previamente o preço que pagarão por litro de leite antes da coleta.
Ambas as iniciativas visam dar maior previsibilidade e força negocial aos produtores, que hoje muitas vezes são reféns das flutuações de mercado e da pressão competitiva.
Custos crescentes, margens que somem
O problema não é apenas o preço do leite, mas o custo para produzi-lo. Os insumos básicos para a pecuária leiteira no Paraná são ração, medicamentos, energia, transporte — estão em escalada. Nesse cenário, uma vaca exige ração, manutenção e cuidados que pesam cada vez mais no bolso do produtor.
Quando o preço pago pelo litro de leite mal cobre esses custos, sobra pouco — ou nada — para remunerar o agricultor ou sustentar sua família.
A importação de leite em pó, muitas vezes mais barata, entra no mercado interno com vantagem competitiva, pressionando ainda mais os preços.
Segundo relatos captados na audiência, muitos produtores já estão operando no vermelho, acumulando dívidas e perdendo patrimônio.
Os efeitos humanos: famílias no limite
O agronegócio costuma ser visto como setor robusto, mas, dentro dele, o produtor de leite familiar está entre os mais vulneráveis. Ele não lida apenas com leitelhões e vacas; lida com filhos, contas e expectativas.
Quando o custo de produzir supera o retorno e quando decisões como “comprar alimento para meus filhos” ou “dar ração para as vacas” surgem, a crise ultrapassa o econômico: se torna moral e social. Muitas famílias estão avaliando abandonar a atividade, migrar para outras culturas ou até deixar o campo em busca de renda.
Esse êxodo representaria não apenas o fim de tradição rural, mas o desabastecimento local e uma fragilização maior das cadeias alimentares regionais.
A resposta legislativa: lei como socorro ou estorvo?
A Assembleia Legislativa do Paraná reagiu à altura, convocando reuniões para debater as soluções e projetos de lei. Nas falas dos deputados, prefeitos e produtores, ecoa a urgência de medidas:
- Barreiras à importação predatória
- Transparência na negociação entre laticínios e produtores
- Incentivos fiscais e subsídios estratégicos
Mas existe um risco: burocracia demorada e lobby da indústria podem tornar as boas intenções letra morta. Ou seja, legislar não basta é preciso implementar e fiscalizar.
Enquanto o Paraná se debate, outros estados produtores já enfrentaram crises semelhantes, com casos de produtores largando a atividade diante de margens zeradas. O Brasil, país que exporta soja, carne e grãos, vê seu setor lácteo fragilizado por decisões que dependem não apenas do produtor, mas de políticas públicas, comércio internacional e regulação.
O risco de se repetir cenários extremos, produtores sucumbindo é real. E uma cadeia estratégica como a do leite não pode ser ignorada em tempos de insegurança alimentar global
A fala de Vettorello: “Se compro comida para meus filhos, não tenho ração para as vacas”, resume em poucas palavras o desespero de quem vive intensamente na fronteira entre produzir alimento e sobreviver.
A crise do leite no Paraná exige respostas urgentes: não é mais tempo de conversa, mas de ação concreta. E o Brasil inteiro deve acompanhar de perto, porque o que acontece nas pequenas propriedades também afeta o prato do consumidor urbano.
E você, leitor: aceitaria que uma crise conduza o produtor a esse dilema? Ou acha que o Estado precisa interferir com força para garantir a sobrevivência da atividade rural e do alimento no nosso país?