O Desertec prometia transformar o Saara em usina solar global e gerar eletricidade limpa para a Europa. Entenda por que o projeto fracassou e o que restou da iniciativa.
O Desertec, projeto lanรงado em 2009 com apoio de empresas europeias e paรญses do norte da รfrica, tinha como meta transformar o Saara em uma usina solar global e fornecer eletricidade limpa para a Europa. A proposta previa a construรงรฃo de grandes usinas de energia solar no deserto, combinadas a parques eรณlicos, e a transmissรฃo da eletricidade por cabos de alta tensรฃo atรฉ o continente europeu. O projeto prometia gerar atรฉ 15% da demanda elรฉtrica europeia atรฉ 2050.
Apรณs anos de estudos e investimentos iniciais, o Desertec nรฃo saiu do papel como planejado. A iniciativa, que chegou a reunir empresas como Siemens, ABB, RWE e Deutsche Bank, foi descontinuada em sua forma original. Hoje, o Desertec รฉ lembrado como um dos maiores fracassos do setor de energias renovรกveis no perรญodo recente.
O que o projeto Desertec previa
O projeto solar no Saara previa a instalaรงรฃo de usinas de energia solar concentrada (CSP), grandes campos fotovoltaicos e parques eรณlicos em รกreas do deserto e do norte da รfrica. A energia seria transportada por linhas HVDC (corrente contรญnua de alta tensรฃo) atravรฉs do Mediterrรขneo, com destino a paรญses como Espanha, Itรกlia e Franรงa.
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Estudos da รฉpoca indicavam que o Saara recebe em apenas seis horas mais energia do Sol do que o mundo consome em um ano. A proposta era transformar essa abundรขncia em uma fonte confiรกvel de eletricidade limpa para dois continentes.
Por que o projeto Desertec fracassou
Vรกrios fatores explicam por que o projeto Desertec fracassou. Entre os principais estรฃo:
Instabilidade polรญtica
A partir de 2010, com o inรญcio da Primavera รrabe, o norte da รfrica passou a enfrentar um cenรกrio de instabilidade. A inseguranรงa na regiรฃo afastou investidores e dificultou acordos entre os governos envolvidos no projeto.
Custos elevados
O Desertec exigia investimentos da ordem de โฌ400 bilhรตes para a construรงรฃo das usinas e das linhas de transmissรฃo. Enquanto isso, o preรงo da energia solar na Europa comeรงou a cair rapidamente, graรงas ao avanรงo tecnolรณgico e ร produรงรฃo descentralizada em telhados e terrenos prรณximos dos centros consumidores.
Complexidade tรฉcnica
Construir uma rede elรฉtrica integrada entre vรกrios paรญses com diferentes normas, legislaรงรตes e interesses polรญticos se mostrou um desafio maior do que o previsto. O projeto esbarrou em dificuldades logรญsticas e regulatรณrias para conectar os sistemas de forma segura e eficiente.
Crรญticas ao modelo
Organizaรงรตes e especialistas questionaram o conceito centralizador do Desertec. O projeto foi acusado de reforรงar desigualdades e atรฉ de ter traรงos de โeco-colonialismoโ, ao usar terras e recursos de paรญses africanos majoritariamente para atender ร demanda europeia.
O que restou do Desertec
Embora o Desertec tenha falhado como projeto global, a ideia de aproveitar a energia solar no deserto permanece. Diversos paรญses da regiรฃo avanรงaram com projetos prรณprios de energia renovรกvel, como o complexo Noor, no Marrocos, e Shams 1, nos Emirados รrabes Unidos.
O consรณrcio original foi desfeito e substituรญdo por iniciativas menores, como o projeto TuNur, na Tunรญsia, que planeja exportar energia solar para a Europa em menor escala. A Desertec Foundation segue atuando como organizaรงรฃo de defesa da energia limpa, mas sem projetos de grande porte em andamento.
O fracasso do Desertec mostrou os limites de um modelo baseado em grandes redes de exportaรงรฃo de energia em regiรตes politicamente instรกveis. A proposta de criar uma usina solar no Saara para atender ร Europa revelou-se economicamente inviรกvel e tecnicamente complexa, num momento em que a geraรงรฃo distribuรญda ganhou forรงa no mundo inteiro.
Mesmo assim, o Desertec deixou um legado: ajudou a colocar o potencial dos desertos na agenda global da transiรงรฃo energรฉtica e inspirou novos projetos regionais mais realistas e viรกveis.