1. Início
  2. / Petróleo e Gás
  3. / Proposta de tarifa de transporte de gás natural de curta distância mira reduzir custos de transporte e incentivar investimentos na malha central de gasodutos
Localização SE Tempo de leitura 6 min de leitura

Proposta de tarifa de transporte de gás natural de curta distância mira reduzir custos de transporte e incentivar investimentos na malha central de gasodutos

Escrito por Flavia Marinho
Publicado em 05/07/2022 às 15:11
Atualizado em 19/07/2022 às 15:04
gás natural - transporte - Sergipe - GNL
Gasoduto – Imagem EnergiaHoy

A Tarifa de Curta Distância (TCD) facilitará a monetização da produção nacional esperada do projeto Sergipe Águas Profundas (SEAP), da Petrobras

Um importante debate foi iniciado no estado de Sergipe (SE), ligado ao avanço do novo mercado de gás natural. Na quarta (22/06), foi apresentada ao diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) uma proposta de criação de tarifa de transporte de gás natural de curta distância (“Tarifa de Curta Distância” ou “TCD”), que internacionalmente também é conhecida como short haul.

A Tarifa de Curta Distância tem como ideia principal que a mesma seja destinada de maneira exclusiva ao transporte de gás natural, que é injetado na rede a partir da Unidade de Processamento de Gás Natural (UPGN) ou do Terminal de Gás Natural Liquefeito (GNL). Os mesmos se localizam dentro de um estado e é destinado ao consumo no próprio estado.

Esta medida é inserida num esforço regulatório mais amplo que Sergipe vem aplicando para modernizar a sua estrutura regulatória e desenvolver um mercado consumidor variado, que pode pavimentar uma retomada econômica mais focada na reindustrialização do estado.

Porém, é extremamente importante que haja segurança no suprimento de gás natural e uma infraestrutura adequada de transporte. A Tarifa de Curta Distância (TCD) destina todos os requisitos a reduzir os custos de transporte e, em paralelo, incentivar a consolidação de investimentos na malha central de gasodutos.

Short haul assegura condições para tornar o preço do gás natural o mais competitivo possível

É esperado, desta forma, que sejam atraídos novos carregadores e, por consequência, que se torne possível ampliar a oferta: monetizando os recursos naturais nacionais do offshore através do UPGN ou garantindo maior flexibilidade de fornecimento por meio dos terminais de GNL.

A premissa é assegurar condições para tornar o preço do gás natural o mais competitivo possível, através de uma diversificação de fornecedores (mercado nacional e internacional) e consumidores (indústria de fertilizantes, petroquímicos, cimento, cerâmica e vidro).

Em paralelo a tudo isso, é criado um incentivo de tais carregadores para que seja cobrada uma tarifa reduzida de transporte para a curta distância, evitando assim investimentos que fujam da malha central de transporte em um momento tão “sensível” para a consolidação da infraestrutura no país.

TCD busca mitigar o risco de fuga do sistema (by-pass)

Deste modo, a TCD busca mitigar o risco de fuga do sistema (by-pass) e promover a adesão de novos carregadores que desempenhem papel importante na transição para um mercado competitivo.

Esta modalidade tarifária está alinhada com as diretrizes estratégicas deste setor, que estão previstas na legislação, em especial na Resolução do Conselheiro Nacional Política Energética (CNPE) em 03/2022, bem como na recente prática tarifária de privilegiar o fator locacional no cálculo tarifário que vêm sendo adotada pelo ANP.

Short Haul também é adotado, ou ao menos permitido, na experiência regulatória internacional de variadas jurisdições de referência como Inglaterra, Canadá, Estados Unidos e Argentina.

Incentivo facilitará a monetização da produção nacional esperada do projeto Sergipe Águas Profundas (SEAP), da Petrobras.

De modo concreto, em Sergipe, tal medida regulatória contribuirá para consolidação do hub de gás natural e do polo de fertilizantes que serão de suma importância para o desenvolvimento do estado.

O hub de gás natural é composto pelo terminal de GNL das Centrais Elétricas de Sergipe (CELSE), com capacidade de armazenamento de 170 mil m3/dia de GNL e regaseificação de até 21 milhões de m3/dia.

Se for considerado que o consumo da termoelétrica Porto de Sergipe I, de 1.551MW, quando despachado, fica na ordem de 7 milhões de m3/dia, é nítida a enorme disponibilidade para suprimento de gás natural para outros usos a serem explorados e que dependerão do surgimento de um mercado consumidor.

Este incentivo também facilitará a monetização da produção nacional esperada do projeto Sergipe Águas Profundas (SEAP), da Petrobras.

Com relação ao polo de fertilizantes, existem projetos como o de extração de potássio da Vale no complexo Taquari-Vassoura e nos municípios de Capela e Japaratuba, cuja viabilização dependerá de fornecimento de gás a preço competitivo, sendo estimado o consumo na fase inicial de 760 mil m3/dia de gás natural.

Neste cenário, a TCD incentivará que novos carregadores que recebam o gás no terminal de GNL realizem o transporte do insumo pela malha central ao invés de construírem gasodutos dedicados de curta distância, na medida em que a destinação final seria em local próximo.

Caso contrário, existe o risco de investimentos relevantes em infraestrutura de forma a atender interesses específicos, resultando em ineficiência de investimentos nos gasodutos.

É fundamental que a TCD tenha aplicação direcionada, uma vez que um universo vasto de beneficiários poderia resultar no efeito rebote de oneração demasiada dos demais carregadores e, consequentemente, consumidores aumentando o custo do gás.

Por tal motivo, a proposta apresentada é destinada apenas ao transporte de gás natural injetado na rede a partir de um estado e destinado ao consumo nesse próprio estado.

É Importante ressaltar que o objetivo da proposta em questão não é limitar a sua aplicação ao estado de Sergipe, mas beneficiar todos os estados da federação que se enquadrem em tais circunstâncias.

Modelos de tarifa de transporte de gás natural por distância

Ainda que o short haul tenha várias formas de implementação, a partir de estudos preliminares da experiência estrangeira sobre o tema em questão, foram identificados dois possíveis modelos que estariam em conformidade com o ordenamento jurídico brasileiro e alinhados com a política regulatória de transição do mercado.

Um primeiro modelo tem como base o cálculo da TCD no custo de construção e operação de eventual gasoduto dedicado de distribuição que concorreria com a malha de transporte.

Uma segunda opção seria elaborar uma tarifa que privilegie o fator locacional do transporte de maneira que a parcela tarifária baseada na distância tenha maior “peso” na apuração total da tarifa, como por exemplo a metodologia de Distância Ponderada pela Capacidade (Capacity Weighted Distance – “CWD”), adotada na Europa e nas chamadas públicas do Gasbol.

Esses modelos de Tarifa de Curta Distância estão em plena conformidade com o arcabouço jurídico brasileiro e alinhados com as diretrizes estratégicas para o desenho do novo mercado de gás natural estabelecido pelo CNPE, não representando violação à vedação de tratamento discriminatório, que é um dos principais pilares da regulação de compartilhamento de infraestruturas essenciais (i.e. essential facilities).

A partir de uma análise preliminar de marcos regulatórios em jurisdições estrangeiras de referência, que também aderem como princípios reguladores do transporte de gás a isonomia entre agentes e a proibição de subsídios cruzados indevidos, verifica-se que a diferenciação de tarifa não resultaria necessariamente em prejuízo aos demais usuários.

Em paralelo, tal medida suaviza riscos relevantes para os sistemas nacionais de transporte de gás ao atrair e solidificar investimentos em infraestrutura e fluxos de gás.

É de se esperar que tal iniciativa fomente um importante debate com a ANP, que desempenha papel central na regulamentação e promoção do novo mercado de gás, a fim de aprofundar medidas regulatórias concretas e incentivos que acelerem a transição para um mercado competitivo de gás natural.

por – epbr

Flavia Marinho

Flavia Marinho é Engenheira pós-graduada, com vasta experiência na indústria de construção naval onshore e offshore. Nos últimos anos, tem se dedicado a escrever artigos para sites de notícias nas áreas da indústria, petróleo e gás, energia, construção naval, geopolítica, empregos e cursos. Entre em contato para sugestão de pauta, divulgação de vagas de emprego ou proposta de publicidade em nosso portal.

Compartilhar em aplicativos