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Problema de Trump não é “moeda dos BRICS”, mas o sistema de pagamentos da China que dribla o SWIFT e desafia a supremacia do dólar no comércio global

Escrito por Noel Budeguer
Publicado em 13/08/2025 às 20:01
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A China acelera o CIPS, sistema que desafia o SWIFT e pode redesenhar o mapa financeiro global, ameaçando o domínio do dólar nos próximos anos

Aqui, o verdadeiro choque não é a “moeda dos BRICS”, mas sim a arquitetura de pagamentos que a China está construindo — e que pode reduzir o poder de influência de Washington sobre as finanças globais. Em vez de substituir o dólar de forma abrupta, Pequim está ampliando alternativas ao sistema SWIFT e incentivando liquidações em yuans: um caminho mais silencioso, técnico e, até agora, muito mais eficaz.

A virada estratégica: da “moeda BRICS” aos trilhos de pagamento

Durante meses, o debate público se concentrou em uma hipotética moeda comum dos BRICS. Mas o verdadeiro movimento está no CIPS (Cross-Border Interbank Payment System), a rede chinesa que permite a troca de mensagens e a liquidação de operações em RMB fora do SWIFT. O CIPS não “mata” o dólar; ele reduz sua dependência ao criar trilhos paralelos, especialmente para o comércio com a Ásia, Oriente Médio e América Latina. Em 2024, o CIPS processou ¥175,49 trilhões (cerca de US$ 24,5 trilhões), um aumento de 43% em relação ao ano anterior, com 8,2 milhões de transações. Em março de 2025, já contava com 170 participantes diretos e 1.497 indiretos, alcançando 119 países.

Funciona na prática? Sinais do mercado

A adoção avança pelo comércio exterior. O maior banco do Sudeste Asiático, DBS, registrou em 2024 um aumento de 30% nos fluxos de liquidação em yuans para exportadores chineses e crescente demanda de parceiros no Oriente Médio e América Latina. Isso mostra que empresas reais já estão otimizando custos e reduzindo riscos cambiais ao utilizar os trilhos criados por Pequim, mesmo com o dólar ainda predominando.

Líderes dos países-membros do BRICS — Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul, Egito, Etiópia, Irã, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos — reunidos em um marco histórico para ampliar a cooperação política, econômica e estratégica entre as nações.

O vetor geopolítico: sanções, dólar e “desdolarização”

Desde 2022, a exclusão financeira e o congelamento de ativos elevaram o risco de “arma­tu­ri­za­ção” do dólar. Isso incentivou a construção de infraestruturas próprias (SPFS da Rússia, CIPS da China). Moscou já expandiu sua rede para mais de 550 instituições em 24 países, e há avanços na interconexão funcional entre SPFS e CIPS, criando resiliência contra sanções. Nada disso destrona o dólar agora, mas diversifica canais e reduz a capacidade coercitiva dos Estados Unidos.

mBridge: o experimento multilateral com CBDC

Paralelamente, China e parceiros regionais impulsionam o Project mBridge, uma plataforma de pagamentos transfronteiriços baseada em moedas digitais de bancos centrais (CBDCs) para uso interbancário. Após testes com transações reais, o projeto atingiu a fase de MVP em 2024. O Banco de Compensações Internacionais (BIS) deixou a operação, que agora é liderada pelos bancos centrais participantes (China, Hong Kong, Tailândia, Emirados Árabes Unidos e, mais recentemente, Arábia Saudita). Embora ainda não substitua o SWIFT, já demonstra que a liquidação instantânea multimoeda sem bancos correspondentes é tecnicamente viável.

A resposta política dos EUA: tarifas e pressão

O ponto que envolve Donald Trump não é tanto a “moeda BRICS”, mas o temor de perda de influência caso um sistema paralelo ganhe força e reduza o papel do dólar. O ex-presidente chegou a ameaçar com tarifas de 100% sobre países do BRICS se criarem mecanismos que contornem a moeda americana, o que pode encarecer politicamente a adoção de uma divisa comum e, paradoxalmente, acelerar a coordenação de alternativas de pagamento.

O que muda para empresas e bancos?

Custos e prazos. O CIPS permite liquidar diretamente em RMB com menos intermediários, reduzindo tarifas e acelerando transferências. Onde antes era necessário enviar mensagens pelo SWIFT e liquidar em dólares, agora é possível faturar e pagar em RMB, sobretudo em cadeias comerciais em que a China é fornecedor ou cliente dominante. Risco de sanções. Para países sujeitos a medidas financeiras, diversificar trilhos diminui a vulnerabilidade a bloqueios de mensageria ou compensação. Liquidez. Embora o yuan ainda tenha menor profundidade de mercado que o dólar, a China ampliou linhas de swap e bancos de compensação em RMB para aumentar a oferta da moeda em praças internacionais.

Esquema ilustrativo do funcionamento de uma transferência internacional via sistema SWIFT, onde o Banco A (remetente) envia a instrução de pagamento através da rede SWIFT ao banco correspondente (Banco C), que processa e intermedeia a operação, encaminhando os fundos ao Banco B (destinatário).

O que não está acontecendo (e precisa ser esclarecido)

Não existe hoje uma “moeda BRICS” em operação. O consenso político e técnico para criar uma moeda comum está distante: economias heterogêneas, regimes cambiais diferentes e prioridades de política econômica divergentes. O caminho mais provável é a regionalização dos pagamentos (maior uso de moedas locais no comércio) e a coexistência de vários sistemas — com o dólar ainda dominante pelo tamanho do mercado e pela segurança jurídica.

Riscos e limites da estratégia chinesa

Dependência tecnológica e governança. O CIPS cresce, mas muitos participantes ainda têm forte exposição ao sistema financeiro americano, o que impede que seja “à prova de sanções” caso intermediários limitem operações. CBDCs interbancárias. O mBridge provou viabilidade técnica, mas ainda enfrenta dúvidas sobre governança e adesão; pesquisas indicam entusiasmo limitado e a BIS já não o apoia. Padronização. Enquanto isso, o SWIFT moderniza sua mensageria (ISO 20022) e projetos ocidentais como o Agorá exploram melhorias com dinheiro tokenizado sobre a infraestrutura atual.

O que acompanhar nos próximos 12 a 24 meses

  1. Participação do comércio em RMB em rotas estratégicas (energia com o Golfo, commodities com a América Latina).
  2. Expansão de participantes do CIPS e instalação de novos bancos de compensação RMB.
  3. Integração entre SPFS e CIPS e seu uso efetivo por bancos médios.
  4. Avanços do mBridge (novos membros, pilotos com valores maiores) frente aos progressos do SWIFT/Agorá.
  5. Reações de Washington: sanções secundárias, novas regras de conformidade e/ou incentivos para modernizar pagamentos dentro do sistema do dólar.

O “problema” para Trump não é uma moeda BRICS inexistente, mas a consolidação de infraestrutura que permite negociar e liquidar fora do ecossistema dominado pelo dólar. Se o CIPS continuar crescendo e o mBridge amadurecer, o poder de coerção financeira dos EUA não desaparece, mas tende a se diluir nas margens — e, na geopolítica, margens que movem dezenas de trilhões de yuans fazem toda a diferença.

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Edmar
Edmar
17/08/2025 22:16

Do jeito que a China é deve tá fabricando dólar já.

Ricardo Oliveira
Ricardo Oliveira
17/08/2025 13:09

O mundo hoje não pode mais ser subordinado a qualquer país.
Os USA sempre teve o controle do sistema financeiro, lá passa todo tipo de irregularidades, desde que pague a parte dos Americanos. Narcotráfico, autocratas, ditadores, mafiosos, etc. Sempre usam o sistema Americano.
Hoje em dia tem que os países negociarem em suas moedas ou qualquer meio que acharem bom para eles. Soberania é fundamental.
Tomara que tenha varios sistemas de transações e negócios e cada um use o melhor no momento. Concorrência é bom!
Temos que parar com vassalagem em relação aos Americanos, não somos mais colônias.
Brasil é soberano e nosso povo tem coragem, não vamos aceitar chantagem nem traidores.
Viva nossa soberania.

Jorge
Jorge
17/08/2025 11:36

Em análise, tem que verificar que a China está com crise no sistema financeiro, verifique que um dos maiores bancos lá entrou em falência.
Por isso é usado o sistema do dólar.
Outro ponto são os cartéis do tráfico que aproveitam o sistema chinês para contrabandear.
Não trata de direita e esquerda e sim segurança.
O Lula é um **** expiatório que que implantar o sistema comunista, isso está na contra-mão do mundo , uma vez que esse sistema coloca seu país em opressão.
Não duvide que isso já está acontecendo no Brasil, onde os cartéis do tráfico já tem seus tentáculos nas cortes e em seus sistema judiciário, só veja e leia o quanto estão sendo solto.
Lembre que se vc não tem segue em andar na rua, se tem medo de ser assaltado, algo está errado

Noel Budeguer

Sou jornalista argentino, baseado no Rio de Janeiro, especializado em temas militares, tecnologia, energia e geopolítica. Busco traduzir assuntos complexos em conteúdos acessíveis, com rigor jornalístico e foco no impacto social e econômico.

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