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Presas de mamute de 400 mil anos esculpidas por humanos antigos podem representar a mais antiga prova de inteligência pré-histórica

Escrito por Fabio Lucas Carvalho
Publicado em 26/04/2025 às 17:25
humanos, mamute
Foto: Reprodução
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Achado sugere que habilidades cognitivas avançadas surgiram muito antes do que se acreditava na história humana

Nas planícies do oeste da Ucrânia, uma descoberta chamou a atenção do mundo científico. Pesquisadores escavando um solo antigo encontraram fragmentos de marfim que podem mudar o entendimento sobre as capacidades dos primeiros humanos. O achado, realizado no sítio arqueológico Medzhibozh A, revelou 24 pequenos pedaços de marfim provenientes de presas de mamutes extintos.

À primeira vista, pareciam apenas fragmentos quebrados, mas um olhar mais atento revelou algo impressionante.

Marfim moldado com cuidado

Os cientistas observaram que algumas peças tinham marcas que não eram resultado de quebras acidentais.

Vários fragmentos mostravam sinais de lascamento deliberado, moldados com técnicas semelhantes às usadas na fabricação de ferramentas de pedra.

O Dr. Vadim Stepanchuk, arqueólogo ucraniano que liderou o estudo, afirmou à Smithsonian Magazine que artefatos de marfim do Paleolítico Inferior nunca haviam sido encontrados até então.

O local da descoberta, situado no Vale do Bug do Sul, a cerca de 300 quilômetros ao sul de Kiev, já havia revelado ferramentas de sílex, quartzo e ossos de animais extintos, como cavalos e rinocerontes-lanosos. No entanto, a presença de marfim trabalhado surpreendeu a todos.

“A descoberta foi realmente inesperada”, disse Stepanchuk à IFLScience. O marfim, diferente da pedra, é mais macio, desgasta-se facilmente e não mantém um fio cortante. Mesmo assim, pelo menos 14 fragmentos exibiam sinais claros de modificação, como cicatrizes de lascamento, pontas moldadas e até um núcleo característico da técnica “bipolar na bigorna”, onde o material é colocado sobre uma rocha e golpeado com outra para formar lascas.

Artefatos sem função prática

Apesar do trabalho minucioso, as peças não parecem ter sido feitas para uso prático. Stepanchuk explicou à New Scientist que os fragmentos não podem ser chamados exatamente de “ferramentas”.

Eles não apresentam indícios de utilidade prática ou tecnológica, o que levanta dúvidas sobre sua verdadeira finalidade.

Os cientistas propuseram algumas hipóteses. Talvez fossem ferramentas de treinamento, criadas por adultos para ensinar crianças a técnica de lascar materiais.

Seus formatos se assemelham a ferramentas reais, mas a fragilidade do marfim impediria seu uso no trabalho diário. Outra possibilidade é que fossem experimentos, tentativas de trabalhar com um material novo quando a pedra de qualidade não estivesse disponível.

Uma terceira hipótese é mais simbólica: assim como crianças modernas desenham por simples expressão, esses fragmentos podem ter sido criados por impulso imitativo ou criativo, sem uma função definida.

O antropólogo Gary Haynes, da Universidade de Nevada, que não participou da pesquisa, destacou que, se as interpretações forem corretas, elas reforçam a ideia de uma inteligência complexa já presente em hominídeos pré-modernos.

Indícios de uma inteligência diferente

Se comprovada a fabricação intencional dos fragmentos, a descoberta aponta para capacidades cognitivas antes subestimadas nos primeiros hominídeos. Embora nenhum fóssil humano tenha sido encontrado no local, os pesquisadores acreditam que os autores dessas peças podem ter sido do grupo Homo heidelbergensis.

“O estudo do marfim começou sem uma hipótese específica”, explicou Stepanchuk. Mas as marcas incomuns levaram os cientistas a investigar mais profundamente.

Para fortalecer a hipótese de fabricação humana, eles planejam comparar os padrões de fratura dos fragmentos com os das presas de elefantes modernos, verificando se existem diferenças significativas entre quebras naturais e artificiais.

Até o momento, os primeiros objetos de marfim moldados conhecidos datavam do Paleolítico Superior, entre 50.000 e 10.000 anos atrás. Alguns artefatos associados aos neandertais têm cerca de 120.000 anos. A descoberta em Medzhibozh pode antecipar essa linha do tempo em aproximadamente 400.000 anos, situando esses objetos no Paleolítico Inferior.

Isso sugere que, mesmo tão cedo, comunidades pré-humanas já experimentavam, ensinavam e possuíam comportamentos sociais complexos. Stepanchuk afirma que, mesmo neste estágio inicial da evolução, os hominídeos podem ter se engajado em atividades sociais ou imitativas.

Primeiras lições da história

A descoberta levanta a possibilidade emocionante de que, há 400.000 anos, alguém tenha ensinado outra pessoa — talvez uma criança — a moldar o marfim, não por necessidade prática, mas como uma forma de transmitir conhecimento ou estimular habilidades. Uma verdadeira “aula” pré-histórica, ocorrendo muito antes da chegada dos humanos modernos.

As evidências dessa atividade podem representar um dos primeiros registros de ensino deliberado da história da humanidade. Mais estudos e análises comparativas ainda serão necessários para confirmar essa hipótese.

As descobertas foram publicadas no International Journal of Osteoarchaeology, e prometem alimentar novas pesquisas sobre a inteligência e o comportamento dos primeiros hominídeos.

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Fabio Lucas Carvalho

Jornalista especializado em uma ampla variedade de temas, como carros, tecnologia, política, indústria naval, geopolítica, energia renovável e economia. Atuo desde 2015 com publicações de destaque em grandes portais de notícias. Minha formação em Gestão em Tecnologia da Informação pela Faculdade de Petrolina (Facape) agrega uma perspectiva técnica única às minhas análises e reportagens. Com mais de 10 mil artigos publicados em veículos de renome, busco sempre trazer informações detalhadas e percepções relevantes para o leitor. Para sugestões de pauta ou qualquer dúvida, entre em contato pelo e-mail flclucas@hotmail.com.

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