Porto de Pecém e Suape passam por transformação bilionária para exportar hidrogênio verde: píeres ampliados, usinas acopladas e contratos com Europa e Ásia prometem colocar o Brasil no centro da maior revolução energética do século
Dois portos nordestinos estão prestes a redefinir o papel do Brasil no cenário energético global. Pecém, no Ceará, e Suape, em Pernambuco, se tornaram epicentros de megaprojetos bilionários voltados para a exportação de hidrogênio verde e seus derivados, como amônia e e-metanol.
Se no passado essas regiões foram sinônimo de exportação de minério e petróleo, agora elas podem se tornar os grandes corredores de saída da energia limpa brasileira para a Europa e a Ásia. O que está em jogo é um mercado que pode movimentar trilhões de dólares até 2050 e reposicionar o Brasil como protagonista da transição energética global.
Pecém: o hub mais avançado
O Porto do Pecém lidera a corrida. Apoiado pelo Banco Mundial e pelo programa H2Brasil, financiado pela Alemanha, o complexo já conta com dezenas de memorandos de entendimento assinados com multinacionais interessadas em instalar usinas de hidrogênio verde.
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Entre os projetos anunciados, estão plantas que podem somar 500 MW de capacidade, transformando energia solar e eólica em hidrogênio e, posteriormente, em amônia para exportação. O porto já tem acordo direto com o Porto de Roterdã, na Holanda, criando um corredor verde que pode abastecer toda a União Europeia em poucos anos.
Além disso, empresas chinesas como a Envision e a estatal SPIC já confirmaram interesse em fornecer equipamentos e investir na região, mostrando que o Ceará se tornou palco de uma disputa geopolítica silenciosa entre Europa e China.
Suape: o polo de e-metanol
Em Pernambuco, o Porto de Suape segue caminho parecido. Já recebeu projetos voltados para a produção de e-metanol, combustível sintético obtido a partir do hidrogênio verde combinado com CO₂ biogênico. O investimento inicial anunciado ultrapassa R$ 2 bilhões e envolve parcerias com grupos internacionais.
Suape também foi incluído pelo Ministério de Minas e Energia como um dos hubs estratégicos do Plano Nacional do Hidrogênio (PNH2), o que deve garantir acesso a linhas de financiamento federais e internacionais. A expectativa é que o porto se torne referência na exportação de derivados de hidrogênio para o mercado asiático, especialmente Japão e Coreia do Sul.
A corrida da infraestrutura
Transformar Pecém e Suape em plataformas de exportação de hidrogênio verde exige obras de infraestrutura gigantescas:
- Ampliação de píeres para movimentar navios especializados no transporte de amônia e metanol.
- Construção de áreas exclusivas para armazenar derivados de hidrogênio em segurança.
- Instalação de gasodutos internos para conectar usinas de produção aos terminais portuários.
- Integração com parques solares e eólicos já em operação no Nordeste, que fornecem a eletricidade renovável necessária para a eletrólise.
O custo total ainda não foi consolidado, mas especialistas estimam que os investimentos em infraestrutura ultrapassem R$ 15 bilhões nos próximos anos.
Europa e Ásia de olho no Nordeste
Os primeiros contratos já apontam quem serão os principais compradores: União Europeia e Ásia. A Alemanha, que busca reduzir sua dependência do gás russo, já declarou interesse em importar hidrogênio verde brasileiro. O Porto de Roterdã assinou memorandos para receber amônia do Ceará.
Do outro lado do mundo, Japão e Coreia do Sul já sondam o Brasil como fornecedor alternativo de energia limpa para alimentar sua indústria pesada, altamente dependente de combustíveis fósseis.
Essa procura internacional reforça o peso estratégico de Pecém e Suape: quem dominar esses hubs controlará a porta de saída do hidrogênio verde brasileiro para o mundo.
O risco de exportar apenas energia bruta
Apesar do otimismo, especialistas alertam: o Brasil corre o risco de repetir o erro histórico de exportar apenas matéria-prima barata. Se o hidrogênio produzido no Nordeste for vendido como amônia para consumo europeu, o país pode perder a chance de desenvolver uma cadeia industrial interna de maior valor agregado, como siderurgia verde, fertilizantes sustentáveis e combustíveis sintéticos para aviação.
Para evitar isso, governos estaduais e o próprio PNH2 defendem políticas de conteúdo local e transferência de tecnologia, que garantam que parte da riqueza fique no país.
Empregos e transformação regional
Além do impacto global, os projetos de Pecém e Suape podem gerar benefícios locais gigantescos. Estimativas preliminares apontam para a criação de mais de 50 mil empregos diretos e indiretos nos próximos dez anos, apenas nas fases de construção e operação das plantas.
Para o Nordeste, historicamente marcado por desigualdades, o hidrogênio verde surge como uma oportunidade de transformação socioeconômica, criando uma nova vocação industrial baseada em tecnologia e energia limpa.
A chegada de uma nova era dos portos brasileiros
Pecém e Suape já foram símbolos da exportação de minério, petróleo e derivados. Agora, caminham para se tornar os principais hubs de hidrogênio verde do Hemisfério Sul, colocando o Brasil no centro de uma corrida energética que pode definir o futuro da indústria mundial.
Se souber aproveitar essa janela histórica, o país poderá não apenas exportar energia limpa, mas também consolidar uma nova matriz de desenvolvimento baseada em inovação, sustentabilidade e integração global.
O desafio é garantir que os trilhões prometidos pelo hidrogênio verde se transformem em riqueza e progresso para os brasileiros — e não apenas em contratos vantajosos para potências estrangeiras.