Donald Trump tenta conter a expansão do BRICS, mas o bloco avança sobre setores estratégicos da economia global. Com novos membros e recursos energéticos e minerais decisivos, o grupo atrai o interesse até de países tradicionalmente alinhados aos Estados Unidos, ameaçando a hegemonia construída por Washington ao longo do século XX.
A ascensão do grupo BRICS tem sido interpretada por Donald Trump como uma ameaça direta à liderança global dos Estados Unidos.
O bloco, formado inicialmente por Brasil, Rússia, Índia e China em 2006 e ampliado com a entrada da África do Sul em 2010, busca reduzir a dependência do dólar e criar mecanismos financeiros alternativos, como o uso de moedas locais e o desenvolvimento de um banco próprio para financiar projetos.
Para Trump, esse movimento representa um risco concreto à hegemonia econômica norte-americana.
-
A lista ‘secreta’ que decide quem escapa do tarifaço: entenda o Anexo II da Casa Branca, veja quais produtos brasileiros foram incluídos, quem ficou de fora e o impacto bilionário por trás de cada código tarifário
-
FMI confirma: Índia será a economia que mais cresce em 2025, com expansão acima de 6%, atraindo bilhões em investimentos e mudando o centro de gravidade da Ásia
-
Roubos de armas por soldados russos disparam e expõem crise no exército de Putin
-
Texas aprova lei radical: cidadãos e empresas da China, Irã, Coreia do Norte e Rússia ficam proibidos de comprar ou alugar imóveis no estado
O impacto da política “America First” sobre o sistema global
A visão de Trump está alinhada à sua política externa de “America First”, que rejeita estruturas multilaterais e favorece ações unilaterais para defender os interesses dos EUA.
Nessa lógica, qualquer tentativa de aumentar o poder de barganha de rivais estratégicos deve ser contida. China e Rússia, ambos membros do BRICS, figuram entre os principais adversários citados por Trump em seus discursos.
O fortalecimento do bloco poderia, em sua avaliação, reduzir a influência dos EUA sobre políticas monetárias e comerciais em várias regiões do mundo.
O discurso de Trump tem se traduzido em ações práticas, como pressões comerciais e ameaças de sanções. Ele chegou a mencionar a possibilidade de impor uma tarifa adicional de 10% a países que se aproximem do BRICS, embora essa medida ainda não tenha sido implementada.
A estratégia busca minar a coesão interna do grupo e impedir que ele consolide uma ordem multipolar que substitua a estrutura global liderada por Washington.
A evolução e o fortalecimento do BRICS no cenário internacional
O BRICS foi criado com o objetivo de construir uma ordem global baseada em consenso, solidariedade e benefícios mútuos.
Segundo o então primeiro-ministro indiano Manmohan Singh, em 2009, o grupo compartilhava a visão de crescimento inclusivo e prosperidade mundial, defendendo uma ordem estável e previsível baseada em regras.
A força do BRICS decorre não apenas de seu peso econômico, mas também da extensão territorial e populacional de seus membros.
Em 2012, os países assinaram a Declaração de Delhi, que expressava preocupações comuns com segurança alimentar e energética, terrorismo e mudanças climáticas.
No ano seguinte, criaram o Novo Banco de Desenvolvimento, concebido para reformar a arquitetura financeira internacional após a crise de 2008 e financiar projetos de infraestrutura e desenvolvimento sustentável em países emergentes.
Essa instituição passou a rivalizar com organismos ocidentais tradicionais, como o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional (FMI).
Expansão recente e novos patamares de influência
A relevância do BRICS aumentou significativamente com sua recente expansão. Em 2024, Egito, Etiópia, Irã, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos foram incorporados ao grupo, enquanto a Indonésia deverá aderir em 2025.
A Argentina também havia concordado em ingressar em 2024, mas desistiu após a eleição do presidente Javier Milei, alinhado aos EUA.
Com essa ampliação, a participação do BRICS no Produto Interno Bruto global subiu para 39% em 2023.
Os membros agora representam 48,5% da população mundial e ocupam 36% do território total do planeta. Além disso, respondem por 72% das reservas de minerais de terras raras, 43,6% da produção global de petróleo, 36% da produção de gás natural e 78,2% da produção de carvão.
Esses números evidenciam a posição do grupo como uma potência econômica e diplomática que, desde 2019, vem superando o desempenho agregado dos países do G7.
BRICS como alternativa estratégica para novos membros
Para apoiadores do bloco, a adesão ao BRICS oferece aos países uma oportunidade de ampliar sua capacidade comercial e diplomática, bem como de se proteger contra eventuais instabilidades provocadas por políticas externas norte-americanas.
Os membros do bloco têm buscado coordenar políticas nacionais e alinhar posições em fóruns internacionais, reunindo-se paralelamente às cúpulas da Assembleia Geral da ONU, do FMI, do Banco Mundial e do G20.
No entanto, há riscos associados a essa escolha. Uma percepção de ruptura com os sistemas tradicionais de alianças ocidentais pode acarretar redução de investimentos e de ajuda internacional.
Apesar disso, a maioria dos parceiros do BRICS, com exceção de Rússia e Irã, mantém relações amistosas ou neutras com países ocidentais.
É improvável que esses Estados apoiem medidas abertamente hostis aos interesses do Ocidente, o que atenua parte das preocupações.
A posição da Nova Zelândia diante da nova ordem internacional
As mudanças na ordem global, aceleradas pelas políticas isolacionistas de Donald Trump, forçam países de menor porte a reconsiderarem suas estratégias externas.
A Nova Zelândia, por exemplo, tem buscado proteger seus interesses diante da redistribuição de poder econômico e diplomático em direção à Ásia e ao Indo-Pacífico, regiões que já configuram o maior polo econômico e militar do planeta.
Ainda não está definido se a Nova Zelândia pretende se candidatar a uma vaga no BRICS, mas o tema tem ganhado relevância. Informação divulgada pelo The Conversation.
O país já participa do Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura, idealizado pela China, e assinou um acordo de livre-comércio com Pequim em 2008, sem sofrer consequências negativas.
Isso demonstra que parcerias com potências emergentes não implicam necessariamente afastamento de alianças tradicionais.
Procedimentos e implicações de uma eventual adesão
Novos membros podem ser convidados ou apresentar uma solicitação formal para adesão, a ser avaliada na cúpula anual do BRICS.
Também existe a possibilidade de tornar-se país parceiro, equivalente ao status de observador, que permite participar de cúpulas especiais e reuniões ministeriais, além de contribuir com documentos e declarações políticas.
Contudo, parceiros não podem sediar encontros nem selecionar novos membros.
Caso optasse por ingressar, a Nova Zelândia não precisaria deixar outras organizações multilaterais.
A participação no BRICS funcionaria como complemento, ampliando sua rede de alianças e aumentando sua margem de atuação diplomática em um contexto de crescente peso da Ásia e do Indo-Pacífico.
Essa flexibilidade torna o bloco atraente para países que buscam diversificar relações sem romper com estruturas existentes.
A tentativa de Trump de conter o avanço do BRICS
As iniciativas de Donald Trump para frear o avanço do BRICS ilustram a preocupação dos EUA com a emergência de polos alternativos de poder.
Ao atacar o livre comércio, organizações internacionais e tratados multilaterais, Trump contribuiu para acelerar a busca de alternativas por parte de economias emergentes.
A retórica de confrontação e a ameaça de tarifas adicionais reforçam essa percepção de risco, mesmo sem implementação concreta até o momento.
A estratégia de Trump reflete o temor de que a ascensão do BRICS possa diminuir a centralidade do dólar no sistema financeiro global e enfraquecer a capacidade dos EUA de impor sanções, controlar fluxos comerciais e influenciar políticas econômicas de outros países.
O fortalecimento do bloco, por sua vez, evidencia que a ordem internacional está passando por uma redistribuição de poder que desafia a supremacia norte-americana construída ao longo do século XX.
Um cenário de reconfiguração do poder mundial
A atual configuração geopolítica mostra que o BRICS se tornou um ator de peso, com recursos naturais estratégicos, capacidade industrial e crescente influência diplomática.
A tentativa de Donald Trump de desarticular o bloco revela a preocupação com a erosão da hegemonia dos EUA e com a emergência de uma ordem multipolar.
Nesse contexto, países como a Nova Zelândia avaliam com cautela as opções disponíveis, buscando proteger seus interesses e ampliar suas oportunidades comerciais e diplomáticas.
A trajetória do BRICS e a postura de Trump indicam que a disputa por influência global tende a se intensificar nos próximos anos, redefinindo alianças e redesenhando os centros de poder internacionais.