Brasil fecha 2024 com superávit de US$ 13,5 bi na Liga Árabe, enquanto tarifaço dos EUA abre espaço para novos mercados
Os países árabes estão de olho em aumentar a compra de produtos brasileiros. A medida surge como alternativa ao tarifaço imposto pelos Estados Unidos. Desde quarta-feira, 6, entrou em vigor a sobretaxa de 50% sobre produtos brasileiros vendidos ao mercado americano.
Um estudo da Câmara de Comércio Árabe-Brasileira, antecipado ao Estadão/Broadcast, mostra que essa mudança abre espaço para o Brasil fortalecer a parceria com os 22 países da Liga Árabe.
O levantamento mapeou os itens mais afetados pelas novas tarifas, seus volumes de importação e os destinos mais promissores no mundo árabe.
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Produtos com potencial imediato
O diagnóstico apontou 13 produtos exportados pelo Brasil aos Estados Unidos nos últimos cinco anos que podem ser redirecionados ao mercado árabe. Para cada um deles, a Câmara indicou três países com maior potencial de absorção.
Um exemplo é o café verde. Em 2024, o Brasil exportou US$ 513,83 milhões aos árabes, contra US$ 1,896 bilhão enviados aos americanos.
A Arábia Saudita, o Kuwait e a Argélia aparecem como os principais destinos alternativos. Apenas US$ 49,12 milhões dos US$ 400 milhões importados pela Arábia Saudita vieram do Brasil, o que mostra espaço para ampliar a fatia brasileira.
A carne bovina é outro destaque. Em 2024, os árabes compraram US$ 1,211 bilhão em proteína bovina brasileira.
Já os Estados Unidos ficaram com US$ 885 milhões. Países como Egito, Emirados Árabes Unidos e Arábia Saudita podem ampliar as aquisições.
No Egito, por exemplo, apenas US$ 273,07 milhões dos US$ 927,12 milhões gastos com carne bovina foram destinados ao Brasil.
Itens ainda pouco explorados
O estudo também destacou produtos que os árabes compram em grande escala, mas ainda não têm presença relevante do Brasil.
Máquinas de construção, como bulldozers e pás carregadoras, entram nessa lista. Há espaço para crescimento.
Outro caso é o dos semimanufaturados de ferro ou aço e madeira de coníferas. São itens exportados aos Estados Unidos, mas com baixa penetração no mercado árabe. Portanto, representam oportunidades a explorar.
Diferença nas tarifas
O ponto mais importante está nas tarifas. O café verde chega aos países árabes com alíquota zerada. Já os Estados Unidos cobram agora 50% sobre o produto brasileiro.
Na carne bovina congelada, a tarifa nos países árabes varia de zero a 6%. O açúcar enfrenta alíquota entre zero e 20%.
Ferro e aço pagam de zero a 12%, contra 50% nos Estados Unidos. Já o petróleo refinado, um dos carros-chefe das exportações brasileiras para o mercado americano, entra na Liga Árabe pagando 5%.
Portanto, as condições comerciais favorecem a mudança de rota das exportações brasileiras.
Mitigação de impactos e expansão
Segundo a Câmara, o objetivo é duplo: mitigar os efeitos da sobretaxa americana e ampliar os laços comerciais com os árabes.
O cálculo levou em conta os 20 principais produtos exportados pelo Brasil aos Estados Unidos, as tarifas aplicadas e os destinos consumidores na Liga Árabe.
O secretário-geral da Câmara, Mohamad Mourad, destacou que os países árabes têm crescimento populacional e econômico acima da média mundial, além de uma população jovem.
Ele reforçou que o Brasil é um provedor estratégico para a segurança alimentar da região.
Expectativas e perspectivas
Ainda não há uma estimativa exata de quanto pode ser redirecionado, mas Mourad projeta absorção parcial já neste ano.
Ele cita café e carne bovina como exemplos de produtos que podem ter demanda imediata, embora nem tudo seja absorvido.
Para ele, o setor produtivo e as empresas precisam agir de forma proativa para conquistar esse espaço.
Resultados atuais e próximos passos
Em 2024, o Brasil exportou US$ 23,68 bilhões para os países árabes, obtendo superávit de US$ 13,50 bilhões.
Emirados Árabes Unidos, Egito e Arábia Saudita lideram como principais compradores. A expectativa é de estabilidade, com leve crescimento neste ano.
O agronegócio domina a pauta brasileira, com 76% dos embarques. Os principais produtos são açúcar, frango, minério de ferro, milho e carne bovina.
O Brasil também é o principal fornecedor de soja em grãos, milho, amendoim, suco de laranja, celulose, tabaco bruto, ferro gusa e resíduos de estanho.
Relações complementares
O comércio entre Brasil e países árabes apresenta forte complementaridade. O Brasil importa sobretudo petróleo e fertilizantes, enquanto exporta alimentos e commodities agrícolas.
Para Mourad, o desafio é reforçar a imagem do País como fornecedor confiável, competitivo e de qualidade. Ele aponta que o custo do frete, embora elevado, não impede as compras árabes.
Além disso, há o peso histórico. Brasil e países árabes mantêm relações comerciais há mais de um século. A Câmara quer reforçar essa ligação com o apoio do governo brasileiro.
Países prioritários
Alguns países foram destacados como estratégicos para expansão. O Egito é o principal deles, devido ao acordo comercial com o Mercosul. Desde 2010, quando o tratado foi firmado, as exportações brasileiras ao país quase dobraram.
Já Argélia, Líbia e Iraque aparecem como alvos promissores. A Argélia possui mais de 40 milhões de habitantes e é grande exportadora de petróleo, mas tem tarifas altas que exigem negociação. A Líbia e o Iraque, com maior estabilidade recente, apresentam liquidez para importar.
Plano de ação
Para aproveitar o momento, a Câmara sugere um plano em três frentes: sensibilização, diversificação e facilitação.
Entre as medidas estão campanhas para promoção comercial de produtos, apoio às empresas brasileiras no cumprimento das exigências locais, como a certificação halal, e avanço em acordos comerciais e diplomáticos.
Também foram sugeridas ações práticas, como facilitar vistos de negócios, organizar missões comerciais e atrair investimentos árabes e islâmicos.
O Mercosul, por sua vez, é apontado como peça-chave. Há negociações em andamento com Tunísia, Marrocos, Jordânia, Líbano e com o Conselho de Cooperação do Golfo. As tratativas mais avançadas são com os Emirados Árabes Unidos.
Oportunidade política e econômica
Na avaliação de Mourad, o momento atual favorece a aproximação. Ele acredita que o governo brasileiro entende a relevância estratégica do mundo árabe e enxerga o potencial econômico da região.
Para a Câmara, a segurança alimentar é o elo central da parceria. E o Brasil aparece como fornecedor confiável em diversos setores, em especial no agronegócio.
A conclusão do estudo é clara: a escalada tarifária dos Estados Unidos abre espaço imediato para que o Brasil amplie sua presença no mercado árabe.
O desafio está em agir rápido, aproveitar a janela e consolidar novas relações comerciais que podem render bilhões em exportações.
Com informações de Estadão.