A Guiana aposta em uma superestrada de 500 km, com 50 pontes e investimento bilionário, para encurtar drasticamente o tempo de transporte até o Brasil e abrir caminho a um mercado de 20 milhões de consumidores.
A Guiana lançou a pavimentação de um corredor rodoviário de 500 km, com cerca de 50 pontes e investimento estimado em R$ 5 bilhões, para ligar Georgetown à fronteira com Roraima.
A meta oficial é reduzir uma rota logística que hoje pode levar até 21 dias para 48 horas, conectando-se ao mercado de 20 milhões de consumidores do Norte do Brasil.
O projeto é tratado como prioridade nacional em meio ao ciclo de crescimento impulsionado pelo petróleo.
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Ligação com Roraima e porto de Palmyra
A estrada melhora a conexão com a ponte sobre o rio Tacutu, que já integra Lethem (Guiana) a Bonfim (RR).
Ela também se articula a um porto de águas profundas em Palmyra (Berbice), no nordeste guianense, atualmente em implantação.
Essa infraestrutura portuária é peça complementar para encurtar o tempo de escoamento de cargas do Brasil rumo ao Atlântico.
Rota de 21 dias para 48 horas
Segundo o governo guianense, a pavimentação do eixo até a fronteira e a entrada em operação do porto devem reduzir drasticamente o tempo necessário para levar mercadorias do Norte do Brasil ao mar.
Hoje o transporte é feito majoritariamente por rotas fluviais extensas.
Com a rodovia e o porto, a janela cairia para cerca de dois dias, afirma o Ministério de Obras Públicas.
No trecho interno, o trajeto por terra entre Georgetown e Lethem atualmente leva, em média, 15 horas em condições favoráveis.
Quatro trechos e 50 pontes
O governo estruturou a intervenção em quatro trechos, que incluem a substituição de pontes de madeira por estruturas de concreto.
Também está prevista a eliminação de gargalos como a travessia por balsa no rio Essequibo, na localidade de Kurupukari.
No conjunto, são cerca de 50 pontes previstas. O cronograma mais otimista citado por autoridades aponta conclusão até 2030.
Onde as obras já avançaram
Uma etapa-chave, Linden–Mabura Hill (aprox. 121 km), foi contratada em 2022 com a brasileira Construtora Queiroz Galvão.
O financiamento é do Banco de Desenvolvimento do Caribe e conta com aporte do Reino Unido.
Em paralelo, o Ministério de Obras Públicas licitou e executa pacotes para dezenas de pontes entre Kurupukari e Lethem.
Essas obras substituem estruturas antigas e preparam o leito para a pavimentação integral do corredor.
Expansão do comércio com o Brasil
Do lado brasileiro, a rodovia se integra à malha de Roraima e abre uma alternativa de acesso ao mar para o Arco Norte.
Do lado guianense, o governo enxerga a conexão com a ponte do Tacutu como porta de entrada para um mercado regional de 20 milhões de pessoas.
A expectativa é ampliar o fluxo bilateral, hoje liderado por petróleo e insumos de construção, segundo especialistas.
Crescimento acelerado do PIB
Desde 2020, a Guiana registra crescimentos de dois dígitos, ancorados na produção offshore.
O país soma cerca de 800 mil habitantes, concentrados na faixa costeira.
Em 2024, o PIB avançou 43,6%, medido pela autoridade estatística. As projeções mantêm ritmo elevado, ainda que em desaceleração.
O salto econômico, porém, cobra investimentos em qualificação, educação e serviços para que os ganhos atinjam a população.
Peso estratégico da estrada
Além do vetor econômico, autoridades admitem um componente geopolítico.
A melhoria do acesso terrestre pelo interior pode agilizar deslocamentos até a região do Essequibo, território administrado pela Guiana e reivindicado pela Venezuela.
A abertura de uma via segura e perene facilita a presença do Estado em áreas remotas, com potencial de mineração e madeira.
Desafios do cronograma
O pacote completo é avaliado em quase US$ 1 bilhão e depende de aprovações ambientais e de engenharia para pontes sobre rios de grande porte. Trechos sujeitos a alagamentos sazonais também exigem soluções técnicas.
Um ponto sensível é a substituição da balsa de Kurupukari por uma ponte de pista dupla, essencial para garantir trafegabilidade durante o período chuvoso.
A fase Linden–Mabura Hill enfrenta desafios operacionais, mas segue contratada e em execução, segundo comunicados oficiais.
O que dizem os especialistas
Em entrevista, o professor Jean Marcelo Lacerda (UFT) avaliou que a conexão rodoviária tende a “aumentar ainda mais o comércio entre Brasil e Guiana”.
Ele ressaltou a necessidade de contrapartidas sociais e educacionais para que a expansão econômica não se concentre em poucos setores.
O especialista destacou que a obra responde ao novo patamar do país na indústria de petróleo e gás.
Segundo ele, a qualificação de mão de obra local será decisiva para capturar oportunidades.
Reservas de petróleo
As estimativas públicas sobre recursos recuperáveis no offshore guianense variam conforme a fonte e a metodologia.
A ExxonMobil reporta cerca de 11 bilhões de barris equivalentes já descobertos no bloco Stabroek. A S&P Global calcula 18,7 bilhões de barris equivalentes para a bacia como um todo.
O avanço do setor explica a pressa em destravar gargalos logísticos como a estrada e o novo porto.
Com a pavimentação em marcha e o porto de Palmyra avançando, como empresas de Roraima e do restante da Amazônia devem reorganizar suas rotas para aproveitar a janela de 48 horas até o Atlântico?