A trajetória da Itapemirim: de maior viação da América Latina à falência, passando por crises, disputas familiares e a polêmica gestão de Sidney Piva.
A Itapemirim já foi uma das maiores empresas de transporte rodoviário do mundo. Chegou a dominar 70% do território brasileiro com 1.700 ônibus e 20 mil funcionários. Operou até em 10 países.
Mas essa gigante teve um fim trágico. Em 2022, a justiça decretou sua falência após anos de crise e dívidas bilionárias. Como a Itapemirim chegou a essa situação?
Camilo Cola e o nascimento da Itapemirim no Espírito Santo
A história da Itapemirim começa com seu fundador, Camilo Cola. Filho de imigrantes italianos, trabalhou desde cedo. Lutou na Segunda Guerra Mundial pela Força Expedicionária Brasileira (FEB). Com economias e um empréstimo do governo para ex-combatentes, comprou um caminhão em 1946.
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Em 1948, iniciou uma pequena empresa de ônibus no Espírito Santo. Após uma fusão em 1953, nasceu a Viação Itapemirim. A empresa cresceu ao operar rotas que outras companhias evitavam por serem precárias ou perigosas.
Anos dourados: a expansão e liderança da Itapemirim no Brasil
A Itapemirim expandiu rapidamente para linhas interestaduais. Camilo Cola inovou no final dos anos 60. Trouxe para o Brasil o ônibus de três eixos, o “Tribus”, que fez sucesso. Nos anos 70, a empresa focou apenas nas linhas interestaduais. Em 1973, comprou a Viação Penha, uma das maiores do país. Ganhou a importante linha Rio-São Paulo.
Tornou-se a maior empresa de transporte rodoviário da América Latina. Nos anos 80, também se tornou líder no transporte de cargas. Chegou a construir seus próprios ônibus, maiores e com mais bagageiro. Nos anos 90, a frota atingiu 1.700 veículos. A Itapemirim era um orgulho nacional.
Os fatores que levaram ao declínio
Após o auge nos anos 90, a Itapemirim começou a enfrentar dificuldades. A hiperinflação no Brasil afetou suas finanças. O aumento da compra de carros particulares diminuiu a procura por ônibus. O incentivo do governo à aviação tornou as viagens aéreas mais competitivas. Empresas de ônibus perderam milhões de passageiros para as aéreas entre 2005 e 2013.
A Itapemirim tentou diversificar, entrando no transporte aéreo de cargas (Itapemirim Cargo) nos anos 90, mas o investimento não deu certo e piorou as finanças. Tentativas de comprar a Varig ou criar uma “FedEx brasileira” também falharam. A empresa começou a vender ativos.
Disputa familiar agrava a crise e leva à recuperação judicial
Problemas familiares também surgiram. Em 2006, Camilo Cola virou deputado federal. Para evitar conflito de interesses, passou parte da empresa para a esposa, Ignes Cola. Ignes faleceu em 2008. A divisão da herança entre os filhos gerou uma disputa judicial. A filha Ana Maria processou a família e a Itapemirim. Conseguiu bloquear bens da empresa, dificultando a renovação da frota.
A empresa vendeu mais ativos, como as viações Penha e Caiowa. Apesar do faturamento ainda ser alto, as dívidas cresciam. Em 2016, a Itapemirim pediu Recuperação Judicial. Devia mais de R$ 330 milhões a credores comuns e R$ 2 bilhões em impostos.
Sidney Piva assume a Itapemirim
Durante a Recuperação Judicial, o empresário Sidney Piva comprou o Grupo Itapemirim. O valor foi simbólico: R$ 1. Piva assumiu as dívidas bilionárias (R$ 2,2 bilhões). Ele prometeu recuperar a empresa. Anunciou a compra de 400 ônibus novos, mas eles nunca chegaram. Sua gestão foi controversa, sendo afastado e depois retornando ao comando.
Em 2021, Camilo Cola faleceu. No mesmo ano, Piva lançou a ITA Linhas Aéreas (passageiros). A iniciativa gerou desconfiança nos credores. A companhia aérea operou por menos de seis meses. Em dezembro de 2021, cancelou centenas de voos, deixando passageiros desamparados. Isso levou ao afastamento definitivo de Piva. A ITA causou um prejuízo adicional de R$ 42 milhões.
Fim da linha: a falência e a disputa pelo legado da Itapemirim
Após o colapso da ITA Linhas Aéreas, a situação ficou insustentável. Sidney Piva teve bens bloqueados e foi proibido de sair do Brasil. Foi acusado de aplicar golpes em outras empresas. Em setembro de 2022, a Justiça de São Paulo decretou a falência do Grupo Itapemirim. As dívidas finais eram de mais de R$ 2 bilhões em tributos e R$ 150 milhões trabalhistas.
A empresa de transporte rodoviário Suzantur arrendou parte da massa falida. Após uma disputa com a agência reguladora ANTT, a Suzantur foi autorizada a operar algumas linhas que eram da Itapemirim. Hoje, opera com ônibus amarelos sob o nome “Nova Itapemirim”. A Itapemirim original, porém, deixou de existir.