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O ‘ouro verde’ do século 21: como planta nativa do Cerrado virou alvo de garimpo legal e ilegal em fazendas brasileiras

Escrito por Valdemar Medeiros
Publicado em 14/06/2025 às 17:28
O ‘ouro verde’ do século 21: como planta nativa do Cerrado virou alvo de garimpo legal e ilegal em fazendas brasileiras
Foto: CANVA
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Planta nativa do Cerrado, considerada o ouro verde do século 21, está na mira do garimpo verde e da biopirataria no Brasil. Entenda os riscos da exploração ilegal e o papel da agricultura sustentável.

O Cerrado brasileiro, o segundo maior bioma da América do Sul e conhecido como “berço das águas”, está no centro de uma corrida silenciosa e preocupante. Plantas nativas antes restritas ao uso local por comunidades tradicionais e agricultores familiares passaram a ser vistas como um tesouro natural. Esse “ouro verde” do século 21, como foi apelidado por estudiosos e pelo setor produtivo, representa espécies de alto valor econômico, com aplicação em áreas como alimentação, cosméticos e medicamentos.

O interesse crescente fez surgir um novo tipo de exploração no campo: o chamado garimpo verde. Essa atividade envolve tanto iniciativas legais de cultivo e manejo quanto práticas ilegais e predatórias, que avançam sobre terras privadas, unidades de conservação e territórios tradicionais. Dados do ICMBio e do Ministério do Meio Ambiente indicam aumento das ocorrências de coleta clandestina e exportação irregular de material genético do Cerrado, um dos biomas mais ameaçados do país.

O que torna o ouro verde tão valioso e cobiçado?

Entre as espécies mais visadas estão o pequi, o baru e o araticum. O pequi, além de símbolo da culinária regional, é fonte de óleos ricos em antioxidantes, amplamente utilizados na indústria de cosméticos e alimentos funcionais.

O baru, por sua vez, ganhou destaque internacional devido às propriedades nutricionais de suas sementes, enquanto o araticum desperta o interesse de laboratórios pelo potencial medicinal de seus compostos.

Essas plantas, que compõem parte do grupo de espécies consideradas raras do Brasil, ganharam importância estratégica em mercados que valorizam ingredientes naturais e biodiversidade. O avanço do consumo sustentável e a busca por produtos com identidade e rastreabilidade transformaram essas espécies em ativos valiosos, despertando o interesse tanto de empresas nacionais quanto de multinacionais. Isso, porém, criou brechas para o avanço da biopirataria e da exploração descontrolada.

Garimpo verde e biopirataria Brasil: o lado sombrio da exploração

Se por um lado há avanços na regularização da exploração e no incentivo à agricultura sustentável, por outro lado, o garimpo verde ilegal cresce em áreas remotas e de difícil fiscalização.

Em diversas operações, fiscais do ICMBio e do Ministério da Agricultura identificaram extração clandestina de frutos e sementes em unidades de conservação e terras indígenas, em desrespeito às regras de manejo e preservação.

O garimpo verde ilegal costuma ocorrer de forma disfarçada, com a entrada de exploradores em propriedades e reservas durante a noite ou por rotas pouco vigiadas. Além da coleta irregular, há casos de exportação ilegal de sementes e princípios ativos.

Esse material, muitas vezes, abastece empresas estrangeiras que desenvolvem produtos patenteados sem qualquer repartição de benefícios com o Brasil ou com as comunidades que tradicionalmente utilizam essas plantas. É a biopirataria em sua forma mais nociva: silenciosa, difícil de rastrear e com impactos devastadores na economia e na biodiversidade.

Agricultura sustentável: uma resposta que nasce no próprio Cerrado

Em meio ao cenário de exploração predatória, surgem iniciativas que mostram ser possível gerar renda e conservar o Cerrado. Agricultores familiares, cooperativas e comunidades tradicionais, com apoio de órgãos como a Embrapa, têm apostado em sistemas de produção sustentáveis.

Esses modelos incluem a integração das espécies nativas em sistemas agroflorestais e consórcios produtivos, mantendo a vegetação do bioma e favorecendo a biodiversidade local.

Os frutos colhidos de forma legal e rastreada ganham valor agregado e encontram mercados que pagam mais por produtos certificados. Esse tipo de manejo, além de conservar as espécies nativas e os recursos naturais, ajuda a fortalecer as economias locais e evita o ciclo de dependência das práticas ilegais.

Exemplos de sucesso vêm sendo registrados em estados como Goiás, Minas Gerais e Tocantins, onde projetos de coleta certificada de pequi e baru mostram que a conservação e a geração de renda podem caminhar juntas.

O desafio da fiscalização e o papel da lei

O Brasil possui legislação avançada para proteção de seu patrimônio genético, especialmente com a Lei da Biodiversidade (Lei nº 13.123/2015), que estabelece regras para o acesso ao patrimônio genético e ao conhecimento tradicional associado. No entanto, a aplicação prática enfrenta sérias dificuldades. O Cerrado cobre cerca de 2 milhões de km², o que torna o monitoramento um enorme desafio logístico. Os órgãos ambientais contam com equipes reduzidas e orçamento limitado, o que compromete a eficácia da fiscalização.

O uso de tecnologia como satélites e drones tem sido defendido por especialistas como forma de melhorar o controle das áreas e inibir a atuação de criminosos. Outra proposta em discussão é o fortalecimento das parcerias entre órgãos federais, estaduais e municipais, além da ampliação dos incentivos à produção legal e certificada do ouro verde.

Impactos ambientais e sociais da exploração ilegal

A retirada indiscriminada de plantas nativas do Cerrado compromete a regeneração natural do bioma e afeta o equilíbrio dos ecossistemas. Muitas dessas plantas desempenham papel fundamental na alimentação da fauna, na proteção do solo e na manutenção do ciclo da água.

Ao esgotar essas espécies, o garimpo verde também enfraquece as comunidades tradicionais e os pequenos produtores que dependem dos recursos naturais para sua subsistência.

Além dos danos ambientais, a exploração ilegal e a biopirataria desvalorizam os produtos oriundos de práticas legais. Quem investe em manejo correto e certificação enfrenta a concorrência desleal de produtos obtidos de forma clandestina, muitas vezes vendidos a preços mais baixos no mercado informal.

Caminhos para proteger o ouro verde e o Cerrado

Proteger o ouro verde do Brasil exige uma combinação de estratégias. É necessário ampliar a fiscalização, investir em tecnologia para monitoramento remoto e fortalecer os projetos de agricultura sustentável. Ao mesmo tempo, políticas públicas precisam criar mecanismos para valorizar o produto legal e punir com mais rigor as práticas ilegais.

Consumidores também desempenham um papel essencial nesse processo. Ao escolher produtos com certificação de origem e rastreabilidade, contribuem para a preservação do bioma e ajudam a combater o mercado clandestino. Empresas, por sua vez, devem assumir compromissos reais com a conservação, evitando práticas que estimulem o avanço do garimpo verde.

O ouro verde do século 21, representado pelas plantas nativas do Cerrado, simboliza o potencial de um Brasil que pode unir riqueza natural e desenvolvimento sustentável. No entanto, esse potencial está sob ameaça diante do avanço do garimpo verde e da biopirataria.

A escolha entre exploração predatória e preservação está em nossas mãos. O futuro do Cerrado e de suas espécies raras depende de ações coordenadas entre poder público, setor privado e sociedade civil.

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Valdemar Medeiros

Jornalista em formação, especialista na criação de conteúdos com foco em ações de SEO. Escreve sobre Indústria Automotiva, Energias Renováveis e Ciência e Tecnologia

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