Expansão acelerada das óticas brasileiras levanta dúvidas sobre sustentabilidade e fiscalização do setor
O Brasil encerrou 2024 com 71.226 pontos de venda de produtos ópticos, após a abertura de quase seis mil unidades no ano, segundo levantamento de entidades do setor.
O número reflete margens de lucro consideradas altas e um fluxo constante de caixa, mas também acende alertas de irregularidades, como pirataria e sonegação.
Enquanto redes nacionais se expandem e cidades médias recebem lojas com padrão de shopping, órgãos públicos intensificam a fiscalização e o setor pressiona por normas mais claras.
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A corrida por espaço revela um mercado que mistura saúde, consumo e disputas regulatórias, em um cenário de crescimento acelerado e zonas de risco.
Crescimento das óticas e movimentação financeira
Nos últimos anos, o varejo óptico se espalhou por bairros, centros comerciais e regiões do interior.
Segundo reportagem publicada pelo canal Maestria nos Negócios, o crescimento tem base em três fatores principais: demanda reprimida por correção visual, transformação dos óculos em item de moda e padronização de franquias.
A combinação elevou o tíquete médio e estimulou novos empreendimentos, especialmente entre investidores que buscam retorno rápido.
Além da reposição por necessidade médica, o consumo passou a incluir lentes com tratamentos específicos e armações de diferentes estilos.
Modelos antirreflexo, fotossensíveis e multifocais ampliaram o gasto médio por cliente.
Especialistas afirmam que as novas tecnologias e a tendência de personalização contribuem para fidelizar o consumidor, que costuma adquirir mais de um par.
Redes nacionais e expansão pelo interior
O comércio tradicional deu espaço a operações mais estruturadas.
De acordo com apuração do canal Maestria nos Negócios, redes como Óticas Diniz e Óticas Carol adotaram padrões de atendimento, marketing e controle de estoque, o que permitiu expansão em escala nacional.
Esse formato favoreceu a interiorização: cidades médias em estados como Goiás, Bahia e Paraná passaram a receber lojas com layout replicável e serviços de pós-venda.
Segundo analistas do varejo, a profissionalização impulsionou a competitividade, mas reduziu o espaço de comerciantes independentes.
Concentração global e controle de preços
O setor também se conecta a conglomerados internacionais.
A fusão entre Essilor e Luxottica, formalizada entre 2017 e 2018, criou uma gigante que atua desde a fabricação até a distribuição de lentes e armações.
De acordo com especialistas em mercado óptico, essa verticalização influencia políticas de preços e disponibilidade de produtos.
No varejo, as marcas globais acabam ditando tendências e valores de referência, enquanto lojistas locais negociam em um mercado cada vez mais concentrado.
Varejo digital ainda é minoria no setor óptico
Apesar da expansão do comércio eletrônico em outros segmentos, o online ainda responde por uma fatia reduzida das vendas ópticas.
O consumidor costuma preferir provar a armação e ajustar o encaixe presencialmente.
O receio de fraudes e o custo do frete mantêm vantagem para a loja física.
Modelos híbridos, que permitem compra virtual e retirada na unidade, ganharam espaço, mas, conforme associações do setor, o atendimento presencial continua predominante — especialmente em municípios menores, onde a relação de confiança com o vendedor é determinante.
Pirataria e contrabando causam prejuízos bilionários
O crescimento rápido também expôs vulnerabilidades.
O canal Maestria nos Negócios apontou que pirataria, contrabando e sonegação representaram cerca de 40% do faturamento do setor em 2024, o equivalente a aproximadamente R$ 10 bilhões.
São produtos falsificados e lentes sem controle sanitário, além de manipulações fiscais que impactam a concorrência e trazem risco ao consumidor.
Segundo a Abióptica, as perdas afetam tanto o varejo quanto a arrecadação tributária.
Operações policiais expõem irregularidades
O histórico de investigações ajuda a dimensionar o problema.
Em 2011, a Operação Ilusão de Ótica, da Polícia Federal, desarticulou um esquema de importação irregular de lentes e armações, com uso de empresas de fachada e notas fiscais falsas.
Em 2024, uma força-tarefa em Aracaju apreendeu produtos sem comprovação de origem e equipamentos usados para falsificação.
As ações mostraram, segundo autoridades, falhas na cadeia de fornecimento e a presença de mercadorias irregulares em pontos de grande circulação.
Exames “gratuitos” e venda casada preocupam órgãos de controle
Outro foco de atenção está nos serviços de optometria.
Há registros de exames gratuitos condicionados à compra de óculos, prática classificada por órgãos de defesa do consumidor como venda casada.
Em fiscalizações, foram identificados atendimentos feitos por pessoas sem habilitação legal e em locais improvisados.
Entidades médicas alertam que somente oftalmologistas podem diagnosticar doenças oculares.
De acordo com o canal Maestria nos Negócios, o número de autuações relacionadas a essas práticas tem aumentado em vários estados.
Lavagem de dinheiro e brechas fiscais
Especialistas em crimes financeiros apontam que a grande variação de preços do setor abre brechas para fraudes fiscais.
Produtos de baixo custo podem ser superfaturados em notas fiscais, simulando faturamento e mascarando a origem de recursos.
O uso de empresas de fachada e contas em nome de terceiros dificulta o rastreamento.
Segundo analistas, essa informalidade prejudica lojistas regulares, que enfrentam concorrência desleal e perda de credibilidade junto ao público.
Fiscalização sanitária mais rigorosa em 2025
Após sucessivas operações, autoridades estaduais reforçaram a regulamentação.
Em 2025, o Centro de Vigilância Sanitária de São Paulo publicou uma portaria que exige licenciamento sanitário para estabelecimentos com atendimento optométrico, determina informação visível de que o profissional não é médico e garante a entrega da prescrição sem obrigação de compra.
O objetivo, segundo o órgão, é separar o atendimento técnico legítimo de práticas comerciais irregulares e proteger o consumidor.
Setor busca padronização e redução de impostos
Do lado privado, a Abióptica ampliou a defesa da redução de impostos sobre lentes e armações, argumentando que o acesso a óculos deve ser tratado como questão de saúde pública.
A entidade também coordena normas técnicas alinhadas à ISO, que servem de base para padronização e fiscalização.
Além disso, o mapeamento anual da associação reúne dados sobre produção, importação e número de pontos de venda, subsidiando políticas públicas e o combate a irregularidades.
Mercado saturado e questionamentos sobre demanda
Mesmo com a expansão, permanece o questionamento sobre a sustentabilidade do número de unidades em operação.
O país tem pouco mais de cinco mil municípios e ultrapassa 70 mil óticas, o que representa média superior a uma dezena por cidade.
De acordo com dados citados pelo canal Maestria nos Negócios, há milhões de brasileiros que ainda necessitam de correção visual, o que justificaria parte da expansão.
No entanto, economistas e consultores de varejo ponderam que o excesso de pontos de venda em algumas regiões pode indicar concentração de mercado e disputas comerciais, não necessariamente aumento real de demanda.
Vitrines ativas e lojas com pouco movimento
Em grandes centros comerciais, é possível observar lojas com vitrines ativas, mas movimento reduzido.
Segundo especialistas em varejo, a discrepância entre presença física e volume de vendas pode estar relacionada a estratégias de marca, custos de exposição e contratos de franquia.
Paralelamente, campanhas educativas têm orientado consumidores a exigir a receita, desconfiar de exames condicionados e priorizar a procedência e a qualidade das lentes.
Diante de um setor que une saúde e consumo, a dúvida persiste: a multiplicação das óticas reflete uma necessidade real ou um modelo comercial que precisa de ajustes?


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