Em 1961, a maior explosão nuclear da história sacudiu o planeta. Conheça o dispositivo termonuclear soviético que mudou os rumos da Guerra Fria, e seus efeitos ainda sentidos até hoje
Eram 11h32 da manhã do dia 30 de outubro de 1961 quando o mundo presenciou um evento sem precedentes: o teste do maior artefato nuclear já construído, realizado sobre o arquipélago de Nova Zembla, ao norte da então União Soviética. Com uma potência destrutiva equivalente a 50 megatons de TNT, a detonação superou em 1.570 vezes a soma dos dispositivos utilizados em Hiroshima e Nagasaki. O protótipo, conhecido como “Tsar”, foi tão devastador que foi apelidado de “o segundo Sol” por quem testemunhou seu clarão.
Lançado de um bombardeiro a 10.500 metros de altitude, o dispositivo gerou uma nuvem em forma de cogumelo que atingiu impressionantes 64 km de altura, ultrapassando a estratosfera. O impacto foi sentido de formas inimagináveis: pessoas a 270 km de distância relataram sentir o calor da explosão na pele, e janelas foram estilhaçadas a mais de 900 km do epicentro — distância equivalente de São Paulo a Brasília.
Como chegamos até aqui?
Para compreender como a humanidade chegou a conceber um engenho tão destrutivo, é preciso voltar ao fim do século XIX, quando cientistas descobriram o processo de fissão nuclear — a divisão de átomos pesados como o urânio, que libera enormes quantidades de energia. A energia liberada por um único grama de urânio pode abastecer 45 casas por um mês inteiro.
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O primeiro experimento de fissão bem-sucedido foi realizado em 1938 por Otto Hahn, em Berlim. Em seguida, veio a Segunda Guerra Mundial e, com ela, o temor de que a Alemanha nazista desenvolvesse uma arma de destruição em massa. Essa ameaça levou Albert Einstein a assinar uma carta ao presidente Franklin D. Roosevelt, alertando sobre o risco. O alerta resultou na criação do Projeto Manhattan, que culminou nas explosões de Hiroshima e Nagasaki em 1945 — marcando o início da era nuclear.
Da fissão à fusão: uma nova era de destruição
Os engenhos nucleares utilizados em Hiroshima e Nagasaki baseavam-se na fissão. Já o dispositivo testado em 1961 usava a fusão nuclear — ou seja, era um dispositivo termonuclear. Nesse tipo de armamento, dois átomos leves (geralmente de hidrogênio) são fundidos sob temperaturas absurdamente altas, semelhantes às do núcleo do Sol (cerca de 15 milhões de °C), gerando uma liberação de energia ainda mais intensa.
Para atingir essas temperaturas na Terra, utiliza-se um estágio inicial de fissão (como nos primeiros artefatos), cuja explosão aquece o segundo estágio, iniciando a fusão. No caso do dispositivo soviético, a temperatura da explosão chegou a 100 milhões de °C, seis vezes mais quente que o núcleo solar.
Um teste com consequências globais
A nuvem em forma de cogumelo ultrapassa 60 km de altura, visível a centenas de quilômetros do ponto zero
O bombardeiro que transportou o artefato teve que ser pintado com tinta refletiva para resistir ao calor extremo. Mesmo assim, a tripulação recebeu apenas 50% de chance de sobrevivência. A detonação foi tão intensa que gerou um abalo sísmico que deu três voltas ao redor do planeta e lançou detritos atmosféricos que permanecem em nossos corpos até hoje, na forma de isótopos radioativos.
Apesar de sua potência, o artefato nunca foi criado para uso militar direto. Era uma mensagem simbólica: um lembrete ao mundo do que a tecnologia poderia fazer se usada sem limites.
Entre o horror e a esperança: o legado nuclear
A era nuclear deixou cicatrizes profundas, mas também ensinamentos. Hoje, a mesma ciência usada para destruir é aplicada para criar. A energia nuclear, apesar de polêmica, é uma das fontes mais promissoras de eletricidade limpa e eficiente, especialmente com os avanços na fusão nuclear controlada — que pode um dia nos livrar da dependência dos combustíveis fósseis.
Dominar essa tecnologia de forma segura pode ser o passo definitivo para a humanidade se tornar uma civilização energética de nível avançado, segundo a Escala de Kardashev. Mas para isso, precisamos aprender com os erros do passado.