A neurocientista Jimo Borjigin, da Universidade de Michigan, descobriu que o cérebro humano apresenta uma atividade intensa durante a morte.
Em entrevista ao portal BBB News, ela explicou que a descoberta ocorreu por acaso, há pouco mais de uma década, enquanto estudava secreções neuroquímicas em ratos em um laboratório.
Durante um dos experimentos, a equipe observou uma massiva secreção de serotonina em ratos durante o processo de morte, o que motivou uma investigação mais profunda das atividades cerebrais nesse momento crítico.
“Um dos ratos mostrou uma massiva secreção de serotonina”, explicou a neurocientista, completando que a descoberta inesperada revelou o quanto ainda se desconhece sobre o cérebro em processo de morte.
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A equipe observou que, durante a morte, a serotonina dos ratos aumentou 60 vezes, enquanto a dopamina, substância química associada à sensação de bem-estar, aumentou de 40 a 60 vezes.
Além disso, a noradrenalina, que deixa o organismo em estado de alerta, também teve um aumento significativo. Esses níveis elevados indicam uma função cerebral hiperativa, contrária ao que se pensava anteriormente.
Ondas Gama em Pacientes Humanos
Em 2023, um estudo focado em quatro pacientes em coma revelou que dois deles apresentaram alta atividade cerebral, com ondas gama associadas a funções cognitivas, momentos antes de morrerem.
“Em ambos os estudos, 100% dos animais mostraram uma intensa ativação da função cerebral”, apontou a especialista. Essa descoberta desafia a ideia de que o cérebro se torna hipoativo durante a morte.
Segundo a neurocientista, nos humanos, somente algumas partes do cérebro são ativadas durante a morte, como a junção temporo-parieto-occipital e a área de Wernicke, áreas associadas às funções conscientes do cérebro.
Uma delas é conhecida como “zona quente cortical posterior”, que é a junção temporo-parieto-occipital (TPO), onde os lóbulos temporal, parietal e occipital se interconectam. “É a parte de trás do seu cérebro responsável pela percepção sensorial”, explica.
Essa área está associada à consciência, bem como aos sonhos e às alucinações visuais. Outra zona observada foi a área de Wernicke, relacionada à linguagem, fala e audição. “Demonstramos que o lobo temporal em ambos os lados é a parte mais ativada.”
Localizada próxima aos nossos ouvidos, essa seção é muito importante não apenas para o armazenamento da memória, mas também para outras funções cognitivas. A professora ainda destaca que a junção temporoparietal do lado direito do cérebro tem sido associada ao desenvolvimento da empatia.
Nesse sentido, ela explica que “muitos pacientes que sobreviveram a paradas cardíacas e tiveram experiências próximas à morte relatam que essas experiências os mudaram para melhor, que sentem mais empatia”.
Desafios à visão tradicional da morte cerebral
Esse novo entendimento desafia a visão tradicional da morte cerebral e aponta para a necessidade de mais pesquisas. “O foco histórico na morte estar centrado no coração levou à ideia de que o cérebro cessa de funcionar quando alguém sofre uma parada cardíaca”, explicou a neurocientista. “Estamos tentando entender isso, há pouca literatura, não se sabe ao certo”, completou ela.
As pesquisas de Jimo Borjigin mostram que o cérebro não desiste facilmente e pode ter uma atividade intensa durante a morte. Este novo entendimento pode ter implicações significativas para a medicina e a forma como determinamos a morte clínica.
“Precisamos investigar, descobrir, entender isso porque poderíamos estar fazendo diagnósticos prematuros de morte em milhões de pessoas, já que não compreendemos o mecanismo da morte”, concluiu Jimo Borjigin.
Por fim, ela ainda reconhece que seu estudo em humanos é muito limitado e que são necessárias muitas mais pesquisas sobre o que ocorre no cérebro quando estamos morrendo. No entanto, ela destaca que, depois de mais de uma década estudando sobre o assunto, uma coisa é clara: “Em vez de estar hipoativo, o cérebro se torna hiperativo durante uma parada cardíaca”.
“É crucial melhorarmos nossa compreensão da função cerebral durante uma crise como essa”, relata, completando que, de fato, sua visão é de que esse aumento da atividade cerebral observado em seus estudos faz parte de um mecanismo de sobrevivência do cérebro quando privado de oxigênio.
“Superficialmente, sabemos que há pessoas que sofrem parada cardíaca e têm essa experiência subjetiva incrível, e nossos dados mostram que essa experiência é devida ao aumento da atividade cerebral”, diz. “Mas a pergunta é: por que o cérebro moribundo tem uma atividade tão intensa?”, completa.
“Precisamos investigar, descobrir, entender isso porque poderíamos estar fazendo diagnósticos prematuros de morte em milhões de pessoas, já que não compreendemos o mecanismo da morte,” finaliza a neurocientista.