Governo insiste na exploração da Margem Equatorial enquanto especialistas alertam para impactos ambientais e promessas repetidas não cumpridas
O novo leilão de petróleo promovido pelo governo federal em 2024 sinaliza, mais uma vez, a escolha pela continuidade da exploração de combustíveis fósseis. Apesar das promessas públicas de financiar a transição energética, o modelo adotado repete padrões antigos, reforçando a dependência de uma matriz energética que contribui para o agravamento da crise climática.
Promessas antigas e resultados questionáveis
Desde o primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o discurso em torno do pré-sal foi apresentado como uma solução para os principais problemas do país. Em 2007, Lula prometeu que os recursos do pré-sal resolveriam questões como saúde, educação e carga tributária, além de alimentar um robusto Fundo Soberano.
No entanto, mais de 15 anos depois, o Brasil ainda enfrenta desafios estruturais nos mesmos setores. A promessa feita durante os governos Lula I e II não se concretizou como previsto, segundo especialistas da área econômica como Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE).
Portanto, embora a exploração do pré-sal tenha avançado significativamente, os ganhos sociais e estruturais ficaram aquém do anunciado.
A volta do discurso com nova embalagem
Recentemente, em 2023 e 2024, o presidente voltou a defender novos projetos de exploração na região da Margem Equatorial, especialmente na Foz do Amazonas. Segundo ele, a exploração do chamado “Novo Sal” poderá financiar a transição energética, gerando empregos, renda e energia barata para a população.
Em diversas ocasiões públicas, como no discurso de abertura da COP 28 em Dubai, Lula reiterou esse argumento. Contudo, a narrativa se assemelha à anterior, com promessas grandiosas e pouca clareza sobre como o modelo será aplicado na prática.
Ademais, instituições ambientais e cientistas alertam para os riscos socioambientais da exploração de petróleo em áreas sensíveis como a costa amazônica. Segundo dados do Observatório do Clima, a Margem Equatorial abriga ecossistemas marinhos únicos que podem ser permanentemente afetados por derramamentos de óleo e impactos indiretos.
Arayara alerta: Brasil repete o “canto da sereia”
De acordo com Juliano Bueno, PhD em Energia e diretor do Instituto Internacional ARAYARA, o novo leilão de petróleo evidencia o aprofundamento da escolha brasileira por se tornar uma grande exportadora da crise climática.
Segundo ele, ainda nos governos Lula I e II, o país já havia escutado o “canto da Sereia do Petróleo”, quando se prometeu que o pré-sal resolveria os principais problemas nacionais. “Vamos criar o Fundo Soberano, resolver a questão da saúde e educação e baixar os impostos com o pré-sal, dizia o então presidente na época”, relembra o especialista.
Entretanto, nada disso se concretizou de forma plena. Agora, com um novo ciclo de promessas, o governo afirma que a exploração do chamado “Novo Sal”, na Costa Amazônica e na Foz do Amazonas, vai financiar a transição energética brasileira, gerar empregos, renda e oferecer energia barata.
Juliano Bueno rebate o discurso e afirma categoricamente: “Não acredito em sereias, tampouco em bravatas de políticos que escolhem alianças com os vilões climáticos e se tornam sócios da crise global”.
A escolha por combustíveis fósseis em um cenário de emergência climática
Mesmo diante de alertas da comunidade científica global, o Brasil opta por fortalecer sua atuação como exportador de petróleo bruto. A Agência Nacional do Petróleo (ANP), em novembro de 2024, autorizou a realização de mais um leilão de blocos na costa norte brasileira, atraindo grandes petroleiras internacionais.
Esse movimento vai na contramão das recomendações do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), que orienta a redução imediata da exploração de combustíveis fósseis para conter o aumento da temperatura global.
Especialistas como Suely Araújo, do Observatório do Clima, defendem que investir em renováveis e eficiência energética seria mais eficaz e sustentável no longo prazo. No entanto, a narrativa oficial continua apostando nos ganhos imediatos do petróleo, ainda que à custa de riscos climáticos e ambientais evidentes.
Desconfiança crescente e críticas ao modelo adotado
Diante de um histórico de promessas não cumpridas, parte da sociedade civil e especialistas demonstram ceticismo quanto às novas declarações do governo federal. Para muitos, a insistência na exploração da Margem Equatorial revela uma escolha clara por manter laços com agentes responsáveis pela crise climática mundial.
Declarações públicas recentes de ativistas climáticos e líderes indígenas reforçam a crítica à postura do governo, que, embora defenda a transição energética em fóruns internacionais, internamente adota medidas contraditórias.
De fato, a expansão da produção fóssil brasileira compromete a imagem do país nos compromissos climáticos firmados no Acordo de Paris e em cúpulas ambientais. Portanto, o cenário atual levanta dúvidas sobre a real prioridade dada à agenda ambiental.
O Brasil diante de uma encruzilhada energética
Por fim, o leilão de petróleo promovido em 2024 torna evidente uma escolha estratégica do Brasil em favor da economia fóssil, mesmo diante da crescente urgência climática. A promessa de usar os lucros da exploração para impulsionar a transição energética soa, para muitos, como uma repetição do “canto da sereia” do passado, que já não convence como antes.
Enquanto isso, as oportunidades de liderança mundial no campo das energias limpas continuam sendo negligenciadas, e o país segue reforçando sua imagem como sócio dos principais vilões climáticos da atualidade.
Afinal, até quando o Brasil continuará acreditando em promessas que se repetem, mas não se cumprem?