Câmara aprova projeto que retoma descontos bancários diretos em benefícios do INSS, reacendendo debate sobre endividamento de aposentados e mudanças na política previdenciária. Texto segue para o Senado após votação acirrada.
A Câmara dos Deputados aprovou neste mês de setembro um dispositivo que autoriza o desconto direto em benefícios do INSS para amortizar “operações de antecipação do benefício previdenciário”.
A tentativa de suprimir esse ponto foi derrotada por 259 votos a 126, e o texto segue para o Senado.
Essa proposta foi anexada a um projeto mais amplo contra fraudes na Previdência e teve apoio de partidos do centrão e da oposição, apesar da resistência da base governista.
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Medida resgata modelo criticado por especialistas e associações bancárias
Pelo texto, ficam proibidos os descontos de mensalidades de sindicatos e associações na folha do INSS mesmo com autorização do beneficiário.
Mas volta a possibilidade de bancos deduzirem valores antecipados diretamente da aposentadoria ou pensão.
O substitutivo também transfere do CNPS para o CMN a competência de definir o teto de juros do consignado.
A versão aprovada não traz no corpo da lei um limite explícito de juros ou tarifas para a antecipação, ponto que motivou a principal controvérsia.
O que muda na prática
A autorização retoma, sob outro formato, uma modalidade próxima do “vale” operado no passado recente pelo próprio INSS.
A Câmara afirma que o desconto bancário se daria em operações de antecipação com deságio, isto é, recebimento hoje por um valor menor do que o devido, com acerto no pagamento.
Críticos alertam que, sem travas claras para encargos, a modalidade pode se tornar mais cara do que o consignado e ampliar o endividamento de aposentados.
Como foi a votação
A autorização para o desconto bancário foi preservada ao rejeitar-se um destaque do PSB que pretendia excluir o inciso sobre a antecipação do benefício.
O placar de 259 a 126 consolidou a vitória do relator, Danilo Forte (União-CE), e dos partidos que defenderam a medida. Com isso, o projeto passa a tramitar no Senado.
Argumentos no plenário
O deputado Rogério Correia (PT-MG) sustentou que, do jeito que está, “vai virar outro crédito, muito pior do que o crédito consignado”.
Ele argumentou que não há no texto um limite atrelado à renda, como existe no consignado, nem menção de que a quitação ocorra no mês seguinte.
Segundo ele, isso abriria espaço a prazos e custos maiores. Correia também apontou que o Meu INSS Vale+ já havia sido descontinuado.
A posição do relator e o papel do governo
Danilo Forte defendeu o substitutivo e disse ter dialogado com a Casa Civil durante a redação.
Em discurso registrado na taquigrafia, afirmou que recebeu da pasta uma versão com a expressão “sem encargo financeiro para o beneficiário”, mas reconheceu que o arranjo final aprovado pela maioria não explicita essa trava.
Ele também argumentou que a definição do teto do consignado deve ficar com o Conselho Monetário Nacional, por se tratar de decisão técnica de política de crédito.
Fraudes e histórico do “vale” do INSS
A ofensiva legislativa ocorre após a Operação Sem Desconto, da PF e da CGU, apontar R$ 6,3 bilhões em descontos associativos irregulares entre 2019 e 2024.
O caso desencadeou uma revisão da política de débitos automáticos na folha de benefícios.
O Meu INSS Vale+ foi lançado oficialmente em novembro de 2024 com antecipação de R$ 150, sem juros, descontada no mês seguinte.
Em fevereiro de 2025, o limite foi ampliado para R$ 450.
Diante de denúncias de cobrança de tarifas por instituições habilitadas, o INSS suspendeu o programa em maio de 2025.
As decisões e mudanças estão registradas em comunicados oficiais e reportagens de época.
O que dizem bancos e entidades do setor
Durante a crise do Vale+, a Febraban levou ao governo queixas de tarifas de até 5% cobradas por bancos na antecipação, o que ajudou a precipitar a suspensão.
Agora, a federação afirma que não atuou pela inclusão do novo produto no projeto que passou na Câmara.
A ABBC, por sua vez, divulgou nota defendendo a supressão integral do dispositivo, alegando risco de superendividamento e ausência de controles próprios de operações de crédito.
Por que o tema preocupa especialistas
Sem um teto de custo específico para a antecipação e sem vínculo obrigatório ao mês subsequente do benefício, especialistas ouvidos no Congresso avaliam que os bancos poderiam oferecer um produto com custo efetivo total superior ao consignado.
Além disso, não haveria os mesmos limites sobre a margem consignável. No plenário, foi esse o tom das críticas de deputados que tentaram derrubar o inciso — sem sucesso.
Próximos passos no Senado
O Senado analisará o projeto que, ao mesmo tempo em que veda os descontos associativos, abre espaço à antecipação descontada na folha e endurece as exigências para novas contratações de consignado, como autenticação biométrica e bloqueio automático do benefício após cada operação.
Senadores poderão manter, ajustar ou retirar o dispositivo sobre antecipações.