Com promessa de atrair China e Rússia, o governo nicaraguense tenta viabilizar uma nova rota marítima de 65 bilhões de dólares para disputar o protagonismo logístico global.
A Nicarágua revive megaprojeto de um canal interoceânico capaz de conectar os oceanos Atlântico e Pacífico e rivalizar com o canal do Panamá. A proposta, avaliada em cerca de 65 bilhões de dólares, foi retomada pelo presidente Daniel Ortega em 2024, com o objetivo de impulsionar a economia local e atrair investimentos de China e Rússia.
O projeto prevê uma rota de 445 quilômetros, mais de cinco vezes o comprimento do canal panamenho, e promete transformar o país em um novo eixo estratégico do comércio marítimo mundial. No entanto, o plano enfrenta críticas ambientais, incertezas financeiras e desconfiança internacional quanto à sua viabilidade.
Um sonho antigo com ambições globais
A ideia de construir um canal na Nicarágua remonta ao século XIX, quando exploradores espanhóis e potências europeias viam na geografia local uma alternativa natural ao Panamá.
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Ainda antes de 1914, os Estados Unidos chegaram a cogitar a rota nicaraguense, mas acabaram optando pelo território panamenho, onde concluíram o canal que se tornaria símbolo da engenharia moderna.
Décadas depois, a proposta ressurgiu diversas vezes. A mais recente tentativa ocorreu em 2013, quando o governo nicaraguense firmou um acordo com o Hong Kong Nicaragua Canal Development Group, liderado pelo empresário Wang Jing.
O plano, avaliado em 50 bilhões de dólares, previa 278 km de extensão, cruzando o lago Nicarágua, o maior da América Central.
Apesar da promessa de competir com o canal do Panamá, o projeto foi paralisado por problemas financeiros, protestos de comunidades locais e forte oposição ambiental. Em 2024, o governo cancelou oficialmente a concessão à empresa chinesa, mas Ortega decidiu retomar a iniciativa com um novo traçado e novos parceiros.
O novo plano: 445 km de extensão e rota redesenhada
Na nova versão, o canal da Nicarágua evitaria o lago Nicarágua foco das críticas ambientais e seguiria uma rota iniciando em Bluefields, no Caribe, passando pelo lago Cholotlan até chegar a Puerto Corinto, no Pacífico.
Com largura entre 290 e 540 metros e profundidade de até 27 metros, seria capaz de receber superpetroleiros e megacargueiros que hoje não cabem no canal do Panamá.
O governo promete isenções fiscais para investidores estrangeiros e garantias de propriedade a empresas que participarem da construção.
Além do impacto econômico, Ortega defende que o projeto colocará a Nicarágua em uma posição estratégica na logística internacional, oferecendo uma alternativa às limitações de capacidade e escassez de água do canal do Panamá.
Ainda assim, analistas apontam que a viabilidade financeira permanece incerta, e que o país dificilmente arcará com o custo sem um consórcio internacional robusto.
Impactos econômicos e riscos ambientais
A principal promessa do projeto é gerar centenas de milhares de empregos e aumentar o PIB nicaraguense em até 10% ao ano durante a fase de construção. Porém, críticos lembram que esse otimismo contrasta com a fragilidade das finanças do país e a dependência de capital estrangeiro.
Ambientalistas alertam que o canal poderia causar graves danos à biodiversidade, com risco de desmatamento em larga escala, poluição hídrica e remoção de comunidades indígenas. O lago Cholotlan, por exemplo, já sofre com contaminação e seria diretamente afetado pela escavação e pelo tráfego de embarcações pesadas.
A Corte Interamericana de Direitos Humanos chegou a condenar a Nicarágua por não consultar comunidades locais nas tentativas anteriores, e o novo plano ainda precisa cumprir exigências de consulta e compensação social.
Engenharia colossal e desafios geográficos
Construir um canal de 445 km em território nicaraguense exigirá soluções de engenharia sem precedentes na América Central.
O país enfrenta riscos sísmicos, vulcânicos e climáticos intensos, além de ter escassez de reservatórios de água, o que complica o uso de eclusas como no modelo panamenho.
Para viabilizar a operação, seriam necessários lagos artificiais e sistemas de drenagem complexos, elevando os custos e o impacto ambiental.
Engenheiros alertam que os desafios técnicos e logísticos podem tornar o canal mais caro e demorado que o previsto, reduzindo seu potencial de retorno econômico.
Ainda assim, o governo insiste em apresentar o projeto como símbolo de soberania e desenvolvimento nacional, comparando-o aos grandes marcos de infraestrutura global.
Rivalidade com o Canal do Panamá e cenário geopolítico
O canal do Panamá continua sendo a principal rota marítima das Américas, responsável por cerca de 6% do comércio global.
Mas enfrenta gargalos causados pela seca histórica e pelas limitações de capacidade das eclusas. Nesse contexto, o canal nicaraguense surge como uma possível rota de alívio, especialmente para navios de grande porte.
Contudo, a concorrência direta com o Panamá esbarra na credibilidade e na experiência de operação. Com mais de 110 anos de funcionamento e infraestrutura constantemente modernizada, o Panamá segue sendo a opção mais segura e confiável.
Além disso, a retomada do projeto sob influência de China e Rússia desperta preocupação em Washington, que vê o movimento como uma tentativa de ampliar a presença de potências rivais na América Central.
Caso financiado por Pequim, o canal da Nicarágua poderia reforçar a estratégia chinesa de controle logístico global, alinhada à Nova Rota da Seda.
Apesar do entusiasmo do governo Ortega, nenhum consórcio internacional confirmou aporte financeiro até o momento.
Especialistas acreditam que, sem apoio chinês direto ou garantia de retorno rápido, o projeto continuará preso ao papel, como ocorreu em todas as tentativas anteriores.
Mesmo assim, o canal segue sendo um símbolo de ambição nacional e de disputa geopolítica na América Latina.
Para a Nicarágua, a obra representa um sonho de autonomia e relevância global; para críticos, um risco ambiental e econômico monumental.
E você, acredita que o canal da Nicarágua sairá do papel desta vez ou seguirá como um mito da engenharia e da geopolítica latino-americana? Deixe sua opinião nos comentários.


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