Profissionais do transporte por aplicativo estão deixando as corridas de passageiros e encontrando novas oportunidades em entregas, transformando a dinâmica do setor e buscando mais previsibilidade financeira com menor quilometragem percorrida.
O cenário do transporte por aplicativo está passando por uma transformação notável no Brasil.
Nos últimos meses, diversos motoristas decidiram migrar do transporte de passageiros para o setor de entregas, impulsionados por relatos de ganhos mais elevados e uma rotina menos exaustiva.
O movimento é visível em grupos de discussão, redes sociais e, principalmente, nas ruas das grandes cidades, onde a busca por maior previsibilidade financeira e melhor qualidade de vida tornou-se uma prioridade, segundo reportagem publicada pelo jornal Zero Hora.
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Motoristas de aplicativo mudam de rumo
Por volta das 14h30 de uma quinta-feira recente, Deives Lael, de 35 anos, chegava a um centro de distribuição com o carro vazio.
Quinze minutos depois, já se preparava para iniciar uma nova rota com o veículo carregado por 54 pacotes.
Lael, que atuou por sete anos como motorista de aplicativo, é um exemplo de profissional que enxergou no setor de entregas a oportunidade de obter ganhos mais consistentes e rodar menos quilômetros diariamente.
Segundo ele, ao trocar as corridas de passageiros pelas entregas, passou a percorrer cerca de cem quilômetros por dia e ainda assim atingiu rendimentos superiores ao que recebia antes, quando precisava rodar pelo menos 300 quilômetros diariamente e utilizar mais de uma plataforma de transporte para garantir o retorno.
Esse movimento de migração, que ganhou força principalmente nos últimos seis meses, tem sido acompanhado de perto pelo Sindicato dos Motoristas em Transportes Privados por Aplicativos do Estado do Rio Grande do Sul (Simtrapli-RS).
De acordo com a presidente da entidade, Carina Trindade, muitos motoristas relatam satisfação por não precisarem mais lidar diretamente com passageiros, o que reduz situações de estresse e avaliações negativas injustas.
A possibilidade de receber um valor previamente definido e percorrer rotas fixas são fatores citados como diferenciais importantes para quem opta pela entrega de mercadorias, conforme detalhou a reportagem do jornal Zero Hora.
Entregas ganham força com comércio eletrônico
A atuação como parceiro de empresas como Shopee, Amazon e Mercado Livre se tornou uma escolha frequente entre esses profissionais.
Nesses casos, os motoristas coletam mercadorias em centros de distribuição e seguem por rotas determinadas, realizando entregas em diversos pontos da cidade.
Deives Lael, por exemplo, hoje trabalha como microempreendedor individual (MEI) e presta serviços principalmente para a Shopee.
Apesar da carga horária de até 12 horas diárias, ele destaca que o rendimento é mais previsível e o desgaste do veículo é menor.
Em uma semana, Lael chegou a receber R$ 3,4 mil rodando cem quilômetros por dia durante seis dias, resultado que, no transporte de passageiros, exigiria percorrer de 300 a 500 quilômetros diariamente e dividir o tempo entre duas plataformas.
A rotina mais estável e o aumento dos ganhos são resultado de um novo perfil de trabalho, que exige conhecimento detalhado das rotas, agilidade e disciplina.
Segundo Lael, conseguir administrar duas cargas diárias e cumprir as entregas exige planejamento, mas proporciona mais equilíbrio entre esforço e remuneração.
Para ampliar ainda mais os rendimentos, ele planeja investir na compra de um veículo de carga leve, como um Fiat Fiorino, visando transportar volumes maiores e aumentar sua produtividade.
Leia também: SEO da Uber diz que ‘de vez em quando’ trabalha como motorista de aplicativo
Setor de entregas cresce com a demanda online
O crescimento expressivo do setor de entregas no Brasil está diretamente ligado ao avanço do comércio eletrônico.
Desde o início da pandemia, plataformas como Mercado Livre, Shopee e Amazon ampliaram seus investimentos em logística, multiplicando centros de distribuição e aumentando o número de motoristas parceiros para agilizar as entregas.
No Rio Grande do Sul, por exemplo, a Shopee opera com três imóveis logísticos que somam 37,3 mil metros quadrados, enquanto o Mercado Livre mantém uma unidade de 7,1 mil metros quadrados no estado.
Recentemente, a Amazon também anunciou a chegada do Amazon Flex ao Brasil, possibilitando que motoristas independentes se cadastrem para realizar entregas diretas pela plataforma.
De acordo com apuração do jornal Zero Hora, a presença dessas gigantes no setor vem ampliando o número de oportunidades para motoristas que buscam mais estabilidade e melhor remuneração.
Mais qualidade de vida para motoristas de aplicativo
A transição para o setor de entregas também trouxe benefícios para o bem-estar dos profissionais.
Ytalo Schaidhauer, de 29 anos, relata que, além de obter ganhos superiores, consegue escapar dos congestionamentos comuns nos horários de pico, uma vez que as entregas podem ser concentradas em bairros específicos, sem a necessidade de percorrer longos trajetos em grandes avenidas.
Ele destaca que, com o mesmo valor gasto em combustível, consegue multiplicar o retorno financeiro realizando entregas, ao contrário do transporte de passageiros, que exige maiores deslocamentos para garantir o mesmo resultado.
Outro aspecto frequentemente mencionado é a possibilidade de organizar melhor a rotina e dedicar mais tempo à família.
Karoline Marques Acosta, de 40 anos, adotou as entregas como atividade principal em novembro de 2024, após seis anos como motorista de aplicativo.
Para ela, a previsibilidade de rendimentos e a chance de passar mais tempo com a filha de nove anos foram determinantes para a mudança de área.
Segundo Karoline, as datas fixas de pagamento e o controle sobre a própria agenda permitiram uma nova dinâmica em sua vida pessoal e profissional.
O jornal também apontou que, mesmo diante dos benefícios, muitos profissionais não abandonaram totalmente as corridas de passageiros.
O motivo principal está na necessidade de liquidez imediata, já que os pagamentos das entregas são realizados em datas programadas pelas plataformas.
Nesses casos, os motoristas recorrem ao transporte de passageiros para cobrir despesas pontuais, como abastecimento, mas priorizam as entregas para garantir uma renda mais estável.
Efeitos econômicos e desafios do setor de entregas
Do ponto de vista econômico, especialistas como Moisés Waismann, coordenador do Observatório Unilasalle: Trabalho, Gestão e Políticas Públicas, observam que a expansão do setor de entregas gera impactos positivos imediatos, com o aumento da circulação de dinheiro e crescimento da atividade econômica local.
Entretanto, ele alerta para a importância de discutir a sustentabilidade dessas ocupações a longo prazo.
O histórico do transporte por aplicativo mostra que, com o aumento da oferta de motoristas, há risco de saturação do mercado e de precarização das condições de trabalho.
Por esse motivo, é fundamental pensar em políticas de proteção e alternativas para evitar a desvalorização dessas funções, como reforçado em análises feitas pelo jornal Zero Hora.
Em relação à formalização, a maioria das plataformas de entrega exige que os motoristas sejam registrados como pessoa jurídica, geralmente por meio da categoria de microempreendedor individual (MEI).
No entanto, a discussão sobre direitos e garantias dos trabalhadores permanece aberta, especialmente diante da tendência de crescimento do setor de entregas.
Será que o setor de entregas manterá essa atratividade nos próximos anos, ou novos desafios surgirão à medida que mais profissionais aderirem a essa alternativa?