Por que uma mina na África pode ameaçar o mercado de minério de ferro da Vale? Entrada em operação do projeto Simandu, na Guiné, pode reduzir liderança da Vale no segmento de minério premium
Segundo levantamento do Invest News, metade do minério de ferro da Vale sai do complexo de Carajás, no Pará — e é a melhor parte. Trata-se de minério premium, com 65% de teor de ferro, contra 62% do padrão global. Apenas em 2024, foram 177 milhões de toneladas, o equivalente a 44% da produção mundial de alto teor. Nenhuma outra mina do planeta produz minério dessa qualidade em volume comparável.
Esse domínio, porém, pode ser ameaçado. A região de Simandu, na Guiné, abriga reservas com o mesmo teor de Carajás e está prestes a entrar em operação. O projeto, controlado pela australiana Rio Tinto em parceria com consórcios chineses, deve começar a produzir em 2025, com capacidade estimada de 120 milhões de toneladas por ano. Se estivesse ativa hoje, Simandu responderia por 23% da produção global de minério premium, reduzindo a fatia da Vale de 44% para 34%.
Por que o minério premium é tão disputado
O minério de ferro da Vale com 65% de ferro permite que siderúrgicas produzam mais aço com menos insumo, economizando coque e emitindo menos CO₂ — uma vantagem estratégica num mercado cada vez mais pressionado por metas de descarbonização. Por isso, o minério premium costuma custar de 10% a 15% a mais que o minério padrão (62%).
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Apesar disso, a demanda por alto teor é instável. Parte do minério 65% vira pelotas com 67% de ferro, vendidas a preços ainda mais altos. Mas o mercado global prefere o equilíbrio custo-benefício do minério 62%, que representa 75% das exportações mundiais. Já as variantes premium ficam com 15% e as mais pobres, com apenas 10%.
O peso da China na demanda global
O principal cliente do minério de ferro da Vale é a China, que compra três de cada quatro toneladas exportadas pelo Brasil. A crise no setor imobiliário chinês reduziu a produção de aço e apertou o caixa das siderúrgicas locais. Isso fez crescer a demanda pelo minério 62%, mais barato, e derrubou o apetite pelo minério premium.
No primeiro trimestre de 2024, a Vale vendeu 40% a mais de minério 62%, enquanto as vendas de minério 65% caíram 51% e as de pelotas, 19%. O prêmio pago pelo minério premium despencou de US$ 14 para US$ 7 por tonelada em julho. Essa queda coincide com a baixa de 30% no preço do coque, que reduziu a vantagem econômica do alto teor.
O que muda com Simandu no jogo
Se entrar em operação em um cenário de demanda enfraquecida, Simandu pode pressionar ainda mais os preços do minério premium. Para a Vale, isso significa enfrentar pela primeira vez um concorrente de peso nesse segmento. E, segundo especialistas, a presença de um novo player desse porte dificilmente elevará os preços.
A Vale chegou a ter direitos de exploração em Simandu em 2010, mas abandonou o projeto em 2014, citando desafios logísticos e políticos — entre eles, a necessidade de construir um porto e 640 km de ferrovia em um país com histórico de instabilidade e corrupção. Em vez disso, concentrou investimentos na expansão de Carajás, especialmente no bloco S11D, que sozinho já produz 77 milhões de toneladas anuais e tem capacidade de chegar a 120 milhões.
Decisão estratégica e futuro do mercado
Ao priorizar Carajás, a Vale reduziu riscos e custos logísticos, mantendo-se competitiva mesmo com a ameaça africana. No entanto, a entrada de Simandu pode redefinir o equilíbrio global no mercado de minério de ferro da Vale, especialmente se a demanda chinesa continuar favorecendo produtos mais baratos.
Você acredita que a Vale conseguirá manter sua liderança no mercado de minério premium diante da entrada de Simandu? Ou a nova concorrência pode mudar o jogo? Deixe sua opinião nos comentários — queremos ouvir quem acompanha de perto o setor mineral.