A nova lei mantém o benefício em 2024, mas inicia uma retomada de impostos até 2028, gerando incerteza e exigindo adaptação imediata dos setores mais afetados.
A era da desoneração da folha de pagamento, uma política que por mais de uma década alterou a forma como 17 setores da economia contribuíam com a previdência, está chegando ao fim. Após um longo impasse político e jurídico, a sanção da Lei nº 14.973/24 estabeleceu um cronograma claro: o benefício, que substitui a contribuição de 20% sobre os salários por uma alíquota sobre a receita bruta, será mantido integralmente em 2024, mas começará a ser reduzido progressivamente a partir de 2025, até sua extinção completa em 2028. A decisão, fruto de um acordo entre Governo, Congresso e Supremo Tribunal Federal (STF), encerra a instabilidade, mas abre um novo capítulo de desafios.
Para as empresas, a mudança representa um aumento programado e inevitável nos custos trabalhistas. Setores estratégicos como Tecnologia da Informação (TI), Comunicação e Transporte agora correm contra o tempo para recalibrar suas finanças e operações. O fim do benefício não apenas pressiona as margens de lucro, mas também levanta debates sobre a sua real eficácia na geração de empregos e acende um alerta para um possível impacto inflacionário que pode chegar ao bolso de todos os brasileiros.
O acordo político e as novas regras do jogo
A nova legislação não surgiu de forma isolada. Ela é o resultado de uma complexa negociação mediada pelo STF para resolver uma disputa entre o Congresso, que havia aprovado a prorrogação da desoneração até 2027, e o governo, que vetou a medida e a questionou judicialmente, alegando falta de previsão orçamentária. Conforme detalhado pela Câmara dos Deputados, a Lei 14.973/24 representa a solução encontrada para dar previsibilidade ao mercado, estabelecendo uma transição suave em vez de uma mudança abrupta.
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A mecânica da reoneração funcionará em um modelo híbrido. Entre 2025 e 2027, as empresas passarão a pagar uma parte da contribuição sobre a folha de salários e outra, decrescente, sobre a receita bruta. A alíquota sobre a folha começará em 5% em 2025 e aumentará gradualmente para 10% (2026) e 15% (2027), até retornar ao padrão de 20% em 2028. Uma concessão importante no texto é que a contribuição sobre o 13º salário permanecerá totalmente desonerada durante todo o período de transição, o que alivia parte do encargo anual para os empregadores.
O enigma do emprego: a eficácia da política em xeque
Um dos principais argumentos do governo para defender o fim do benefício foi a sua suposta baixa eficácia na criação de vagas. A narrativa ganhou força com base em análises técnicas, como um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). A pesquisa concluiu que, de maneira geral, houve uma “ausência de efeitos da política sobre o volume de empregos” nos setores beneficiados quando comparados aos não beneficiados. Esse dado serviu como uma justificativa robusta para enquadrar a desoneração como um subsídio caro e pouco eficiente.
Apesar da conclusão geral, a nova lei impõe uma contrapartida rígida para as empresas que quiserem aderir ao regime de transição: elas precisam se comprometer a manter, no mínimo, 75% da sua força de trabalho em relação ao ano anterior. O descumprimento dessa cláusula implica na perda imediata do benefício. Na prática, o foco da política muda de um incentivo à contratação para uma obrigação de manutenção dos postos de trabalho existentes, o que pode desestimular novas contratações formais e acelerar a busca por automação e modelos de trabalho mais flexíveis, como freelancers e terceirizados.
O impacto setorial e a ameaça da inflação
O fim da desoneração da folha não será sentido da mesma forma por todos. Setores de mão de obra intensiva, como TI e Comunicação, que chegaram a apresentar resultados positivos com a política, agora enfrentam o risco de perder competitividade global e ver a viabilidade de startups ameaçada. No setor de Comunicação, a medida já é usada como argumento para limitar reajustes salariais, mesmo antes de o custo adicional entrar em vigor.
Contudo, é no setor de Transporte que o impacto se mostra mais direto e preocupante para a população. Cálculos da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU) estimam que a reoneração pode encarecer a tarifa do transporte público em valores que variam entre R$ 0,70 e R$ 1,00 por passageiro. Esse aumento de custo reverbera por toda a cadeia produtiva, já que o frete de mercadorias também ficará mais caro, pressionando os preços de alimentos, combustíveis e outros produtos essenciais.
Essa transmissão de custos tem um potencial macroeconômico significativo. A mesma análise da NTU projeta que a medida pode gerar um aumento de até 0,38 ponto percentual no Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o principal indicador de inflação do país. Isso demonstra como uma decisão tributária focada em setores específicos pode, no fim das contas, se transformar em uma pressão inflacionária generalizada, afetando o poder de compra de milhões de brasileiros e exigindo atenção da política monetária do Banco Central.
A transição para o fim da desoneração da folha de pagamento marca um ponto de virada para a economia brasileira. Embora a nova lei traga a previsibilidade que o mercado necessitava, ela impõe um desafio de adaptação para 17 setores que agora precisam reestruturar suas finanças e estratégias operacionais. A forma como cada empresa navegará neste novo cenário determinará não apenas sua sobrevivência, mas também o futuro do emprego e dos preços no país.
Você concorda com essa mudança? Acha que isso impacta o mercado? Deixe sua opinião nos comentários, queremos ouvir quem vive isso na prática.