Em um país com mais de 100 mil pessoas acima dos cem anos, histórias reais revelam como o hábito de trabalhar depois dos 100 se tornou um dos segredos da longevidade japonesa, ajudando a preservar saúde física, lucidez mental e propósito em uma sociedade que envelhece rapidamente.
O Japão, que abriga a maior proporção de centenários do mundo, enfrenta o desafio de equilibrar uma população idosa crescente e uma base ativa em queda. Ainda assim, muitos japoneses preferem continuar trabalhando mesmo após os cem anos. Para eles, trabalhar depois dos 100 é uma forma de manter a mente ativa, o corpo em movimento e o espírito útil à comunidade.
A longevidade japonesa se apoia em fatores conhecidos como alimentação saudável, sistema de saúde acessível e laços familiares fortes. Mas o trabalho, segundo os próprios centenários, é o que dá sentido à rotina. O ofício diário é visto como um exercício mental e emocional, e não apenas uma fonte de renda.
O mecânico que nunca parou
Em Tóquio, o mecânico Seiichi Ishii, de 103 anos, continua consertando bicicletas na oficina onde começou ainda adolescente.
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Seu macacão azul já não tem o mesmo caimento, mas a rotina segue imutável.
Ele acorda animado, pronto para atender clientes e resolver problemas de corrente, freio e aro com a precisão de sempre.
Ishii afirma que “se morrer na oficina, morrerá feliz”, porque o trabalho o mantém vivo e conectado ao mundo.
Além de complementar a aposentadoria, ele acredita que desmontar e montar bicicletas é o melhor treino para o cérebro e as mãos.
Em um país onde a disciplina é virtude, seu compromisso diário é também uma forma de meditação.
A chef que encontra vitalidade na cozinha
Na cidade de Onishi, Fuku Amakawa, de 102 anos, continua no comando de seu restaurante de lámen, aberto há seis décadas.
Trabalha cinco dias por semana, preparando caldos, mexendo o macarrão e servindo clientes habituais.
O ambiente quente e o vapor constante da cozinha, segundo ela, fazem bem para o corpo e para a alma.
Amakawa diz que o trabalho é sua terapia. Mesmo após sentir dores musculares por levantar panelas pesadas, não pensa em parar.
“O que me mantém forte é o movimento”, conta, enquanto organiza as tigelas fumegantes. Para ela, cada prato servido é uma vitória contra o tempo.
O agricultor que transforma rotina em longevidade
Em Bungotakada, na província de Oita, Masafumi Matsuo, de 101 anos, ainda planta arroz, berinjelas e feijões.
Viúvo e sobrevivente de câncer e Covid-19, ele afirma que a lida no campo é o que o mantém em pé.
Todos os dias leva um banquinho para o terreno e faz pequenas pausas entre o plantio e a rega.
Trabalhar é seu remédio e também um tributo à esposa falecida, para quem dedica oferendas de arroz fresco em um altar doméstico.
“Trabalho para me manter saudável”, diz, com simplicidade. A atividade física diária e o contato com a terra simbolizam um ciclo de vida que ele não pretende interromper.
A vendedora que espalha autoestima
Em Fukushima, Tomoko Horino, de 102 anos, continua vendendo cosméticos e oferecendo conselhos de beleza por telefone.
Para ela, a maquiagem é mais do que estética: é uma forma de devolver confiança às pessoas.
O trabalho, iniciado na juventude, tornou-se sua identidade e seu elo com o mundo.
Hoje, viúva e vivendo sozinha, mantém uma rotina disciplinada e um pequeno círculo de clientes fiéis. “Ver alguém se sentir bonita me faz sentir viva”, afirma.
Entre telefonemas e conversas, ela acredita que trabalhar é a melhor forma de afastar a solidão e manter a lucidez.
A contadora de histórias que dá voz à memória
Em Soma, também em Fukushima, Tomeyo Ono, de 100 anos, é contadora de histórias tradicionais japonesas.
Sobe em pequenos palcos e narra contos folclóricos com energia e precisão. Aprendeu a arte depois dos 70 e desde então faz do trabalho um ato de resistência cultural.
Após perder a casa no tsunami de 2011, Ono decidiu incluir as histórias dos sobreviventes em suas narrativas.
Escrever e contar minwa se tornou seu modo de preservar memórias e dar voz a quem viveu tragédias.
“Vivo para contar histórias”, afirma. Cada apresentação é um lembrete de que o passado continua vivo pela palavra.
O valor biológico e cultural do trabalho
As histórias desses japoneses mostram que trabalhar depois dos 100 é mais do que uma escolha individual.
É um reflexo de uma cultura que valoriza a disciplina, a utilidade social e a continuidade do propósito. O trabalho não é um fardo, mas uma forma de manter-se ativo física e cognitivamente.
Estudos sobre envelhecimento confirmam que manter rotinas produtivas reduz o risco de doenças degenerativas e depressão.
Para os centenários japoneses, a ocupação diária é o equilíbrio entre corpo e mente, onde a vida e o ofício se tornam inseparáveis.
O exemplo do Japão mostra que envelhecer não é sinônimo de estagnação. Ao contrário, trabalhar depois dos 100 é uma demonstração de vitalidade e propósito.
Seja na oficina, na cozinha ou nos campos, o trabalho mantém o tempo em movimento e o espírito desperto.
Você acredita que o trabalho pode ser uma fonte de energia e sentido mesmo depois dos 100 anos?



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