A implosão financeira do Projeto Araguaia mudou o apetite dos investidores no ano passado e, em agosto de 2025, ainda reorganiza o mapa do níquel no Brasil. Os dados mais recentes de preço e de mercado ajudam a explicar por que minas já operacionais ganharam valor.
A Horizonte Minerals entrou em administração no Reino Unido em 16 de maio de 2024 depois de não conseguir fechar o financiamento de mais de R$ 1 bilhão para concluir o Projeto Araguaia, no Pará. A própria companhia comunicou que os administradores da FRP Advisory passaram a conduzir o processo de encerramento das operações da holding listada em Londres e Toronto.
Em janeiro de 2025, a subsidiária brasileira Araguaia Níquel Metais Ltda. apresentou um plano de recuperação extrajudicial à 2ª Vara Empresarial de Belo Horizonte, com vistas a reestruturar dívidas e manter os ativos em condição de cuidado e manutenção. O documento foi divulgado publicamente pela própria empresa.
O colapso veio em um ciclo de preços de níquel deprimidos e de domínio da oferta pela Indonésia, contexto que derrubou a viabilidade de projetos greenfield fora da Ásia e aumentou o prêmio por operações prontas, com fluxo de caixa imediato.
-
China investe US$ 2,2 bilhões no Brasil em 2025 e faz do país o segundo maior destino global de aportes — ‘tarifaço’ dos EUA abre espaço estratégico para novos bilhões
-
Nova medida do governo dá vantagem para BYD, Honda, Toyota e outras na corrida dos veículos elétricos montados no Brasil; entenda como
-
Venezuela reage à pressão dos EUA com alistamento em massa convocado por Nicolás Maduro após envio de três destróieres e navios anfíbios ao Caribe
-
Pequenos negócios do Brasil veem expansão global ‘garantida’ ruir após tarifas de Trump inviabilizarem exportações para os Estados Unidos
Em paralelo, a Anglo American assinou em 18 de fevereiro de 2025 acordo para vender seu negócio de níquel no Brasil à MMG por até US$ 500 milhões, movimento que reforçou a virada de capital para ativos já operacionais como Barro Alto e Niquelândia.
Projeto Araguaia e Horizonte Minerals cronologia do estouro de custos e da administração
A Araguaia passou 2023 em desaceleração e desmobilização, com relatos locais de dispensas e obras paradas ainda em novembro daquele ano. Em abril de 2024, a Horizonte anunciou que não havia solução de financiamento para concluir o projeto e que avaliaria alternativas como venda do ativo em care and maintenance.
Em 16 de maio de 2024, a companhia foi formalmente colocada em administração no Reino Unido e as negociações com credores passaram a focar na preservação de valor para os credores garantidos, não mais para os acionistas. Comunicados oficiais registram a suspensão das ações e a nomeação de administradores.
No Brasil, a controlada protocolou em 24 de janeiro de 2025 um plano de recuperação extrajudicial com adesão de credores, buscando reorganizar passivos e preservar o projeto. A própria Horizonte publicou a íntegra do plano em seu site.
Impacto no Pará empregos, fornecedores e a desmobilização em Conceição do Araguaia
Relatos regionais indicaram demobilização de estruturas e demissões em Conceição do Araguaia no fim de 2023, enquanto a empresa tentava renegociar custos e obter capital adicional. Esses registros ajudam a dimensionar os efeitos sobre cadeias locais de fornecedores.
Em 2024, com a confirmação de que não havia financiamento suficiente, a Horizonte comunicou a paralisação definitiva do Araguaia e passou a avaliar alternativas como venda do projeto ou levantamento de recursos na subsidiária, cenários típicos de projetos em fase de construção que enfrentam choque de CAPEX.
No início de 2025, a via escolhida no Brasil foi a recuperação extrajudicial, que suspende execuções e cria uma base para reorganizar dívidas enquanto se avaliam caminhos de monetização dos ativos. Essa etapa é crucial para fornecedores locais e para a mão de obra que depende do ciclo da mineração no sul do Pará.
Por que ativos operacionais ganharam prêmio Barro Alto e Niquelândia na mira da MMG
Com o Araguaia travado, investidores buscaram renda operacional imediata. Em fevereiro de 2025, a Anglo American firmou acordo para vender Barro Alto e Niquelândia à MMG por até US$ 500 milhões. O pacote inclui US$ 350 milhões à conclusão e até US$ 150 milhões condicionais a preço e desenvolvimento futuro. A conclusão foi projetada para ocorrer até o terceiro trimestre de 2025, sujeita a aprovações regulatórias.
Materiais para investidores indicam que as plantas goianas produziram cerca de 39 mil a 40 mil toneladas de níquel em 2024, reforçando a tese de que ativos em operação capturam melhor valor quando o mercado está fraco e o capital está seletivo.
No front regulatório, casos públicos no exterior registram aprovações concorrenciais não problemáticas, enquanto na União Europeia um processo associado foi retirado em maio de 2025, sinalizando baixa preocupação de concentração naquele recorte.
Preço do níquel em agosto de 2025 Indonésia dita o ritmo e a bolsa segue pressionada
Em agosto de 2025, o níquel na LME oscilou na casa de US$ 14,7 mil a US$ 15 mil por tonelada, bem abaixo dos picos de 2022. Dados oficiais da LME e séries públicas mostram cotações próximas a US$ 14.745 em 22 de agosto. Preços nessa faixa pressionam produtores fora da Indonésia.
A Reuters reportou em junho que a oferta seguirá excedente por alguns anos devido à expansão na Indonésia, que já responde por cerca de 63% do mercado. Em abril, a cotação tocou mínima de cinco anos perto de US$ 13.865, e analistas alertaram que valores abaixo de US$ 15 mil colocam cerca de metade dos produtores no vermelho.
Nesta semana de 25 de agosto de 2025, o governo indonésio revogou a obrigatoriedade de usar preços de referência oficiais como piso nas vendas de minerais e carvão. A mudança pode afetar formação de preço e contratos em níquel, ainda que tributos sigam calculados pelo benchmark estatal.
O que vem agora para o Araguaia e para a política mineral brasileira
Para o Araguaia, os cenários realistas permanecem os mesmos admitidos pela própria companhia em 2024 e reiterados com o plano de 2025: venda do projeto em care and maintenance, captação ao nível da subsidiária ou liquidação de ativos, conforme a lei brasileira. Qualquer solução dependerá do apetite de compradores em um mercado ainda fraco.
Para o Brasil, o episódio reforça a necessidade de financiamento de longo prazo, previsibilidade de licenciamento e foco em refino e produtos battery grade. A janela para capturar valor além do ferroníquel exige política industrial e parcerias tecnológicas, já que a cadeia de baterias migra rapidamente e pressiona margens. Base de dados setoriais e comunicados corporativos sustentam essa mudança de prioridade.
No curto prazo, enquanto o níquel permanecer perto de US$ 15 mil, ativos operacionais e com custo competitivo tendem a seguir atrativos. Esse é o pano de fundo que explica a pressa por minas que já produzem e a reavaliação de projetos greenfield no país.