Imóvel herdado sem inventário pode ser usucapido: abandono dos herdeiros permite transferência judicial da propriedade a terceiros.
Milhões de imóveis no Brasil ficam parados após a morte de seus proprietários. Sem inventário formalizado, a matrícula no cartório continua no nome do falecido, enquanto os herdeiros utilizam ou simplesmente abandonam o bem. Esse vazio jurídico abre brechas perigosas: o imóvel, mesmo sendo parte da herança, pode ser tomado por terceiros que comprovem posse contínua, mansa e de boa-fé.
O mecanismo que permite isso é o usucapião, previsto no artigos 1.238 a 1.244 do Código Civil, e já reconhecido em julgados do Superior Tribunal de Justiça (STJ) quando há abandono prolongado dos herdeiros.
O que diz a lei sobre imóveis herdados e usucapião
A regra é clara: para que o bem herdado seja transmitido legalmente, é obrigatório abrir inventário no prazo de até 60 dias após o falecimento, conforme o artigo 611 do Código de Processo Civil.
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Se o inventário não é feito, o imóvel continua em nome do falecido, impossibilitando registros de venda e dificultando sua regularização.
Mas o Código Civil, no artigo 1.238, prevê que quem possui o imóvel de forma contínua, sem oposição e com intenção de dono, pode adquirir a propriedade por usucapião ordinário (10 anos) ou extraordinário (15 anos, reduzido para 10 em caso de posse com moradia ou produção). Isso vale inclusive contra herdeiros que não regularizam o bem.
Especialistas alertam sobre riscos para herdeiros
O advogado e professor de Direito Civil Flávio Tartuce explica: “A herança é uma universalidade de direito. Mas se os herdeiros deixam de exercer posse ou abandonam o imóvel por anos, um terceiro pode ingressar com ação de usucapião e se tornar proprietário, ainda que exista matrícula em cartório.”
Já a jurista Maria Helena Diniz observa que o usucapião é uma forma de “sanear situações de abandono, dar função social à propriedade e impedir que imóveis fiquem à margem da circulação econômica”.
Como terceiros conseguem a transferência judicial do imóvel herdado
Quando alguém ocupa imóvel herdado e abandonado por anos, pode ajuizar ação de usucapião judicial. Para obter êxito, deve apresentar:
- Comprovação de posse contínua e pacífica;
- Documentos como contas de água, luz e IPTU pagos em seu nome;
- Testemunhas que confirmem a ocupação do imóvel;
- Provas de que os herdeiros não exerceram posse nem administração.
Se preenchidos os requisitos, o juiz declara a aquisição originária da propriedade, determinando o registro em cartório em nome do novo dono.
Exemplos da jurisprudência
O STJ já confirmou que o usucapião pode prevalecer sobre a inércia dos herdeiros. Em diversos julgados (como o REsp 1.453.801/RS), reconheceu o direito de posseiros que cuidavam do imóvel há décadas, diante do abandono da herança.
Em um caso recente, vizinhos que ocuparam imóvel herdado por mais de 20 anos conseguiram a propriedade definitiva, mesmo com matrícula em nome do falecido, porque os herdeiros nunca regularizaram a situação.
Um imóvel herdado não é garantia de patrimônio eterno se os herdeiros não cumprem suas obrigações legais.
A ausência de inventário e a negligência no cuidado com o bem podem abrir caminho para o usucapião judicial, transferindo a propriedade a terceiros.
O recado da Justiça é claro: a propriedade precisa ter função social. Herdeiros que ignoram essa regra arriscam perder um patrimônio que, com organização mínima, poderia ser preservado para a família.