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O alerta de colapso global do MIT de 1972 foi revisitado: a humanidade entra em uma década decisiva

Escrito por Fabio Lucas Carvalho
Publicado em 23/08/2025 às 09:53
humanidade
Foto: Reprodução
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Meio século após o estudo “Limites do Crescimento”, novas análises mostram que a humanidade está em uma década decisiva para evitar declínio global.

Em 1972, o Clube de Roma lançou “Limites do Crescimento”. A publicação utilizava o modelo computacional World3 para simular como cinco forças interativas moldariam o futuro: população, produção industrial, produção de alimentos, uso de recursos e poluição.

A principal mensagem era clara: se o mundo seguisse o caminho do crescimento sem limites, a humanidade ultrapassaria a capacidade do planeta, com declínios inevitáveis no século XXI.

Além do alerta, o livro também mostrou alternativas. Uma transição gerida, baseada em estabilização da população, controle do consumo e investimentos em eficiência, poderia garantir padrões de vida sustentáveis.

A obra foi polêmica, mas acabou moldando a conversa moderna sobre limites planetários e a necessidade de mudança.

A verificação de 2020

Quase cinco décadas depois, a analista Gaya Herrington revisitou o modelo.

Publicado no Journal of Industrial Ecology em 2020, seu estudo comparou cenários do World3 com dados reais de população, produção, mortalidade, fertilidade, recursos e bem-estar humano.

A conclusão foi inquietante. O mundo seguia um caminho próximo ao “business as usual”, isto é, a continuidade do crescimento como meta principal.

Nesse cenário, o modelo apontava para declínios em produção agrícola, capital industrial e bem-estar ao longo do século. Herrington destacou que isso não era uma previsão catastrófica, mas um alerta estrutural.

Segundo ela, a crise poderia se intensificar já na década seguinte, com impactos mais profundos até 2040.

Mesmo avanços tecnológicos sem precedentes não seriam suficientes, porque o crescimento ilimitado amplifica os estresses quando os limites ecológicos são violados.

Implicações do estudo

Herrington conduziu a pesquisa de forma independente, como parte de seu mestrado em Harvard. A KPMG, onde trabalhava, publicou o estudo, mas não se tratava de um relatório corporativo. O método foi simples: comparar dados reais com as curvas de feedback do World3.

O resultado mostrou que o padrão identificado em 1972 ainda descrevia o mundo atual. O crescimento sem ajuste estrutural leva inevitavelmente a uma fase de excesso seguida de declínio.

A atualização de 2022

Dois anos depois, em maio de 2022, Herrington publicou nova reflexão. No texto “O que um modelo mundial de 50 anos nos diz sobre o caminho a seguir hoje”, ela reforçou que os dados ainda estavam alinhados com múltiplos cenários. O detalhe crucial é que divergências mais significativas surgiriam após 2020.

Isso significa que estamos exatamente na janela de escolhas que definirão o futuro. O cenário chamado “Mundo Estabilizado” aparece como alternativa viável. Nele, a sociedade desloca seu objetivo da maximização da produção industrial para a eficiência de recursos, controle da poluição e fortalecimento dos serviços de saúde e educação.

Herrington destacou que o mundo real ainda não seguia claramente esse rumo, mas também não estava distante demais. Era uma chance de “agora ou nunca”. A questão central é se a humanidade conseguirá abandonar o crescimento como princípio organizador.

As bases de um futuro equilibrado

A diferença entre declínio e estabilidade não é abstrata. Depende da capacidade de redefinir prioridades em torno do bem-estar humano e ecológico. Herrington também indicou o livro “Terra para Todos”, publicado em 2022 pelo Clube de Roma, como guia prático de transformação.

O recado era direto. As decisões desta década moldarão a vida até o fim do século. Se mudarmos metas e investimentos, ainda é possível alcançar melhores resultados.

A recalibração do modelo

Após o trabalho de Herrington, uma nova equipe voltou ao World3. A pergunta agora era diferente: se os parâmetros fossem atualizados com dados modernos e maior poder computacional, os resultados mudariam?

A pesquisa, conduzida por Nebel e colegas e publicada no Journal of Industrial Ecology, recalibrou o modelo sem alterar sua estrutura básica. O objetivo era alinhar os parâmetros às evidências mais recentes.

O resultado, porém, foi semelhante. Mesmo com ajustes, o sistema ainda apontava para “ultrapassagem e colapso”. A produção industrial começaria a cair em meados da década de 2020. A população teria declínio a partir de 2030. A produção de alimentos atingiria o pico nesse período, sugerindo que ganhos tecnológicos podem aumentar o limite, mas também acentuar a queda quando este é ultrapassado.

Impactos ambientais e bem-estar

Os impactos ambientais também foram reavaliados. A poluição persistente estava abaixo da trajetória padrão original, mas a recalibração indicou que seus efeitos podem durar mais tempo, gerando níveis cumulativos mais altos.

Outro dado relevante foi a curva de “desenvolvimento humano”. Interpretada por Joachim Klement, essa curva sugere que o presente está próximo de um pico global. Se nada mudar, a média de bem-estar pode cair a níveis comparáveis aos de 1900 até o fim do século.

Os autores alertaram que os feedbacks de um sistema em expansão não são iguais aos de um sistema em declínio. Isso significa que a forma do colapso pode ser diferente do que o modelo prevê. Mas a mensagem principal é clara: a interrupção do crescimento exponencial decorre principalmente do esgotamento de recursos, com recessão interconectada prevista entre 2024 e 2030.

O ponto de convergência

Quando reunidos, os estudos de Herrington e de Nebel et al. chegam a conclusões semelhantes. O primeiro mostrou que os cenários originais ainda descrevem o mundo atual. O segundo comprovou que, mesmo com dados mais ricos, a dinâmica estrutural permanece a mesma.

Ambos reforçam que, sem mudança de objetivos, continuaremos em direção a limites inseguros, com declínios simultâneos na produção, alimentação e bem-estar.

O que aprendemos até aqui

O modelo de 1972 ainda explica a situação. Herrington mostrou que a trajetória recente acompanhou de perto o cenário de crescimento desenfreado. Sua reflexão de 2022 deixou claro que as escolhas após 2020 são decisivas.

Já a recalibração de Nebel et al. reforçou que não adianta intensificar o mesmo padrão. A estratégia de “mais do mesmo, só que mais rápido” não resolve. Pelo contrário, transforma soluções temporárias em novas fragilidades.

Uma janela estreita de ação

A mensagem que emerge é simples e ao mesmo tempo urgente. O caminho de estabilidade não é fantasia, mas sim resultado da mesma estrutura de feedback que gera colapso em outro contexto. Ao mudar os objetivos, é possível redirecionar os ciclos para fortalecer resiliência.

Esse caminho exige menos recursos por unidade de bem-estar, investimentos em redução da poluição e expansão de serviços sociais. Saúde e educação aparecem como fatores que melhoram a qualidade de vida sem depender do aumento constante de produção material.

Precisão sobre incertezas

Os estudos não afirmam quando exatamente cada país sentirá os efeitos. O modelo World3 trabalha com dinâmica global. Também não negam a importância da tecnologia. Pelo contrário, ela pode adiar picos e ampliar limites.

Mas há um risco: sem mudança estrutural, esses ganhos tecnológicos podem gerar superações mais severas. Dennis Meadows, coautor de “Limites do Crescimento”, já havia alertado que picos mais altos levam a quedas mais duras.

Herrington enfatizou que tecnologia com o mesmo objetivo de crescimento nos mantém na curva errada. Quando aplicada para eficiência, redução de danos e desenvolvimento humano, pode levar ao cenário de estabilidade.

A recalibração também destacou que sistemas em declínio se reorganizam de formas que o modelo original não prevê. Isso não é motivo para descartar o alerta. Pelo contrário, reforça a necessidade de agir antes, quando ainda há margem de manobra.

A década decisiva

O conjunto de estudos não aponta o colapso como inevitável. Mostra que ele é um risco real se mantivermos os mesmos objetivos. Evitá-lo depende de escolher novas prioridades.

Se o mundo insistir em crescimento ilimitado, os dados sugerem que entrará em fase de declínio ainda nesta década. Mas se adotar o “Mundo Estabilizado”, ainda há chance de alcançar equilíbrio entre bem-estar humano e limites planetários.

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Fabio Lucas Carvalho

Jornalista especializado em uma ampla variedade de temas, como carros, tecnologia, política, indústria naval, geopolítica, energia renovável e economia. Atuo desde 2015 com publicações de destaque em grandes portais de notícias. Minha formação em Gestão em Tecnologia da Informação pela Faculdade de Petrolina (Facape) agrega uma perspectiva técnica única às minhas análises e reportagens. Com mais de 10 mil artigos publicados em veículos de renome, busco sempre trazer informações detalhadas e percepções relevantes para o leitor. Para sugestões de pauta ou qualquer dúvida, entre em contato pelo e-mail flclucas@hotmail.com.

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