Crescimento da gasolina de nafta impulsiona concorrência no setor, altera a dinâmica entre grandes distribuidoras e amplia debate sobre impactos fiscais e regulatórios no Brasil.
A expansão acelerada da gasolina formulada a partir de nafta importada, produzida principalmente pela Refit (Refinaria de Manguinhos), tem provocado mudanças significativas no mercado de combustíveis brasileiro, especialmente no Sudeste e no Rio de Janeiro.
Desde meados de 2024, a presença deste combustível alternativo cresceu de maneira expressiva, impulsionada por benefícios fiscais relacionados à importação da nafta não petroquímica.
Esse novo cenário trouxe desafios à liderança da Petrobras e gerou reações de grandes distribuidoras nacionais.
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Mercado de combustíveis em transformação
A operação da Refit destaca-se pelo uso estratégico da nafta importada, beneficiada por incentivos fiscais ao desembarcar em estados como Amapá e Alagoas.
Após a entrada pelo porto do Rio de Janeiro, a matéria-prima é transformada em gasolina nas instalações da refinaria, respeitando as regras da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
Essa alternativa de produção permitiu à Refit ampliar sua participação nos mercados do Rio e de São Paulo, consolidando um novo polo competitivo.
Segundo dados oficiais da ANP, a gasolina da Refit abasteceu 28,3% do mercado do Rio de Janeiro no primeiro semestre de 2025, por meio das distribuidoras Flagler e 76 Oil, ambas ligadas ao grupo.
Em junho, a participação conjunta dessas distribuidoras chegou a 30,4%, superando individualmente Vibra (24%), Raízen (21,2%) e Ipiranga (14,8%), que tradicionalmente comercializam gasolina da Petrobras.
Desde abril, a Flagler lidera o mercado fluminense, ampliando sua fatia diante das concorrentes.
No estado de São Paulo, fontes de mercado apontam que a gasolina da Refit já alcançou 15% de participação, resultado de operações entre distribuidoras locais.
Esse crescimento é reflexo de uma estratégia que une preços competitivos, benefícios fiscais e oferta regular, o que tem favorecido a preferência dos revendedores por esse tipo de combustível.
Nafta importada: a base do combustível formulado
A ANP confirmou que a Refit produz gasolina a partir de nafta importada, destacando que a atividade está em conformidade com a regulamentação vigente.
A agência, entretanto, não detalha volumes específicos, pois considera a informação restrita, mas ressalta que a mesma matéria-prima pode ser utilizada tanto no refino quanto na formulação do produto final.
De acordo com o painel dinâmico da ANP, a produção total de gasolina A (antes da adição obrigatória de etanol anidro) pela Refit aumentou 57,7% nos 12 meses encerrados em junho de 2025, comparado ao período anterior.
Em contrapartida, a produção da Reduc, refinaria da Petrobras responsável pelo abastecimento do Rio de Janeiro e outros estados, registrou queda de 5,1% no mesmo intervalo.
O cenário atual foi intensificado pela saída da Copape, até então a única formuladora especializada do país, cujo funcionamento foi suspenso pela ANP em julho de 2024 devido a irregularidades operacionais e fiscais.
Desde então, a Refit atua praticamente sozinha na formulação de combustíveis, embora outras refinarias, como SSOil (São Paulo) e Ream (Grupo Atem), também venham ganhando mercado, mas em ritmo mais lento.
Competitividade e benefícios fiscais impulsionam gasolina de nafta
O processo de formulação, que consiste na combinação de diferentes hidrocarbonetos para atingir as especificações da gasolina convencional, tornou-se vantajoso devido ao menor custo da nafta importada.
De acordo com executivos do setor, o litro da nafta custa, sem o frete, cerca de R$ 2,13 no mercado internacional, valor inferior à média da gasolina A produzida no Brasil, que ficou em R$ 3,68 na semana encerrada em 20 de julho de 2025, conforme a ANP.
Os benefícios fiscais e o diferimento de ICMS nos chamados “estados porta de entrada” tornam o produto ainda mais atrativo para os postos, criando condições para preços mais baixos em relação à gasolina da Petrobras ou de outros importadores.
A consolidação dessa operação deve seguir ao menos até o final de 2026.
A ANP suspendeu recentemente a formulação como atividade exclusiva, mas manteve a possibilidade de refinarias atuarem na formulação de combustíveis como atividade acessória, em paralelo ao refino convencional, conforme a Resolução 852/2021.
A saída da Copape e essa decisão da agência praticamente reservaram o mercado para poucos participantes, entre eles a própria Refit.
Reações do setor e impactos na concorrência
O impacto desse novo cenário é reconhecido por representantes do setor.
“A Refit herdou o mercado da Copape e está colocando esse produto principalmente no Rio e São Paulo a preços competitivos”, afirmou um diretor de grande distribuidora.
Consultores de preços que acompanham o segmento confirmam que a Petrobras, diante da perda de mercado, intensificou a realização de leilões para venda de combustíveis às distribuidoras, prática antes mais comum para o diesel e que passou a incluir gasolina.
Essa estratégia, segundo fontes, permite à estatal ofertar cargas a preços diferenciados, abaixo da tabela, além de aumentar as cotas futuras das distribuidoras.
A Petrobras, em resposta, declarou que a venda por leilão é “uma prática comercial prevista nos contratos firmados com as distribuidoras, com o objetivo de complementar a oferta regular dos produtos de forma competitiva, transparente e isonômica”.
A Associação Brasileira de Importadores de Combustíveis (Abicom), por meio de seu presidente Sérgio Araújo, informou que nenhuma das empresas associadas importa nafta, mas avalia a movimentação de mercado como natural diante da legislação vigente.
Segundo ele, “a formulação de gasolina por refinarias tem previsão legal e já era esperado que empresas ocupassem esse mercado na ausência de um concorrente e se há oportunidade de boas margens”.
Volumes de produção e importação de nafta
Os volumes exatos da produção de gasolina da Refit oriunda do refino de petróleo ou da formulação via nafta não são divulgados publicamente.
A refinaria também não respondeu aos pedidos de esclarecimento.
Dados da ANP mostram que a produção total da Refinaria de Manguinhos atingiu recorde histórico em junho de 2025, com 328 mil metros cúbicos de derivados, dos quais 160 mil metros cúbicos de gasolina A, representando um crescimento de 80% sobre junho de 2024.
Informações do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) indicam que mais da metade da nafta não petroquímica importada pelo Brasil vem da Rússia, enquanto quase um terço tem origem no Golfo do México, entrando principalmente pelos portos do Rio de Janeiro, Paranaguá, Santos e Manaus.
Além da Refit, outras empresas, como SSOil, Ream (Grupo Atem), Dax Oil e Latim Oil, também utilizam nafta importada, mas em menor escala.
Regulamentação e histórico do setor de combustíveis
O Instituto Combustível Legal (ICL), que reúne grandes distribuidoras e a Petrobras, ressalta que, embora a formulação não seja ilegal, há histórico de irregularidades no setor, como importação de gasolina disfarçada de nafta e fraudes tributárias.
Diante da transformação em curso, especialistas e agentes do setor acompanham de perto os desdobramentos, atentos ao impacto da gasolina de nafta no preço ao consumidor, na concorrência entre empresas e nos desafios regulatórios.
Com a ascensão desse novo combustível no mercado brasileiro, a pergunta que fica é: de que forma a gasolina de nafta pode transformar, de maneira duradoura, o cenário dos combustíveis no país e o bolso do consumidor final?