Governo avalia editar medida provisória para ampliar a faixa de isenção do Imposto de Renda, enquanto disputa política sobre anistia a Jair Bolsonaro trava votações e pressiona prazo legal para mudanças valerem já no próximo ano.
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva avalia editar uma medida provisória (MP) para ampliar a isenção do Imposto de Renda para salários de até R$ 5 mil, diante da lentidão na Câmara dos Deputados para votar o projeto que trata do tema.
A alternativa voltou ao centro das conversas porque, para valer já no próximo ano, a mudança precisa ser aprovada até dezembro, como determina o princípio da anualidade.
A discussão ocorre enquanto a pauta da anistia ao ex-presidente Jair Bolsonaro e a aliados ganha fôlego e reorganiza prioridades no Congresso, segundo o Valor Econômico, em reportagem publicada nesta segunda-feira (8).
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Aliados defendem MP para destravar a pauta tributária
Interlocutores do Planalto afirmam que a resistência em levar o texto ao plenário levou um grupo de aliados a defender a edição de uma MP que estabeleça a nova faixa de isenção imediatamente.
A avaliação desses articuladores é que o relator da matéria, Arthur Lira (PP-AL), estaria retardando a análise do projeto enquanto se concentra na costura pela anistia.
Pessoas próximas a Lira rejeitam a interpretação e atribuem o atraso ao ambiente político mais amplo, de acordo com o Valor Econômico.
Um senador com trânsito no governo diz ter levado a proposta de MP ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e sustenta que o Executivo não deveria arriscar perder a janela de aprovação neste ano.
Ainda assim, o próprio Haddad afirmou desconhecer a ideia quando procurado pela reportagem, conforme o jornal.
Prazo legal pressiona, e MP trancaria a Câmara após 45 dias
Para mudar a tabela do IR em 2026, a aprovação precisa ocorrer até dezembro de 2025.
Uma MP também teria de ser confirmada pelo Congresso nesse período, mas produziria efeito imediato e passaria a trancar a pauta da Câmara em 45 dias se não for votada, mecanismo que, na visão de governistas, poderia forçar um desfecho.
O custo dessa estratégia seria intensificar o embate com a direção da Casa, segundo o Valor Econômico.
Relatório está parado desde 16 de julho
O relatório de Arthur Lira foi aprovado por unanimidade em comissão especial em 16 de julho, mas não avançou ao plenário.
A avaliação no governo é que a Câmara está tomada por temas paralelos, com reflexos do julgamento de Bolsonaro no STF e da pressão externa dos Estados Unidos sobre o caso, o que reordena prioridades, de acordo com o Valor Econômico.
Diante desse quadro, lideranças veem incerta a votação do IR em setembro e até mesmo em outubro.
Divergências na base: forçar votação ou editar MP?
Dentro do próprio governo há divisão. O líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ), rejeita a ideia de driblar a Câmara com uma MP.
Em suas palavras, a solução é “forçar o Congresso a votar”. Na outra ponta, parte dos articuladores do Planalto entende que a MP daria previsibilidade e impediria que o tema ficasse em segundo plano em meio a disputas políticas, conforme o Valor Econômico.
Governo evita atrito público e mantém Lira como aliado
A ministra de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, buscou reduzir o atrito.
Em entrevista, disse que Arthur Lira continua sendo aliado do governo, apesar do desembarque formal do PP da base, e afirmou não crer que ele apoiará a anistia.
“Acho que é um relatório muito bom”, disse sobre o texto do IR relatado por Lira. A fala foi lida como gesto para preservar pontes e sinalizar confiança no avanço, segundo o Valor Econômico.
Nos bastidores, Lira é associado à indicação de Carlos Vieira para a presidência da Caixa Econômica Federal, movimento visto como parte do esforço de acomodação política.
Outro aceno teria sido a nomeação da procuradora Marluce Caldas para o Superior Tribunal de Justiça (STJ), parente do prefeito de Maceió, João Henrique Caldas (JHC), provável aliado de Lira em 2026.
Todos os envolvidos negam a existência de acordo político relacionado à escolha, de acordo com o Valor Econômico.
O que prevê o texto do Imposto de Renda
Relator desde maio, Lira propôs isentar totalmente a faixa de renda até R$ 5 mil e criou descontos progressivos para rendimentos de até R$ 7,35 mil.
A disputa central gira em torno das compensações para cobrir a perda de arrecadação, estimada como bilionária.
O debate inclui taxar dividendos, LCI, LCA e debêntures incentivadas, mirando contribuintes com renda anual superior a R$ 600 mil, medida que enfrenta resistência entre lideranças do Congresso e do mercado, segundo o Valor Econômico.
Após a aprovação na comissão, Lira disse que a matéria poderia ser votada “em agosto”, mas ponderou que haveria “muita discussão pela frente”.
O cálculo político piorou com a escalada da pauta da anistia e o aumento das tensões partidárias, conforme o Valor Econômico.
Tensões recentes embaralham a agenda da Câmara
A crise ganhou corpo no início de agosto, com a prisão domiciliar de Bolsonaro.
Deputados alinhados ao ex-presidente reagiram ao comando do presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), e a Câmara mergulhou em conflito. No dia 1º, Lira visitou Bolsonaro. Interlocutores relatam que trataram também da anistia.
Já em 2 de setembro, a chegada do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), a Brasília deu novo impulso ao tema.
Na mesma data, a federação União Progressista (União e PP) anunciou o desembarque da base governista, e líderes se somaram ao PL para pedir a votação da anistia, de acordo com o Valor Econômico.
Lira aponta pauta de Hugo Motta e reclama de “animosidade”
Aliados de Lira afirmam que a pauta do plenário é definida pelo presidente Hugo Motta e que o clima de “animosidade” no Congresso explica o travamento de diversas propostas, não apenas do IR.
Como exemplo, citam que a reforma administrativa também não andou. Reforçam ainda que o relatório do IR foi aprovado por unanimidade na comissão e que Lira tem cobrado mais diálogo entre líderes.
Segundo um interlocutor, “as pessoas não estão mais conversando, estão só brigando”, conforme o Valor Econômico.
Impacto fiscal e a disputa sobre quem paga a conta
No cenário traçado por governistas e oposição, a ampliação da isenção traria impacto bilionário para a arrecadação federal. A controvérsia, portanto, recai sobre quem bancará a renúncia.
Enquanto parte dos parlamentares admite rever benefícios tributários para altas rendas e instrumentos de investimento, outra parte rejeita tocar em rendimentos hoje isentos.
Sem uma equação sobre compensações, o projeto tende a permanecer paralisado ou a depender de uma decisão política mais drástica, segundo o Valor Econômico.
Qual estratégia deve prevalecer: manter a pressão por votação ainda em 2025 ou editar uma MP que tranca a pauta e redistribui a conta de quem paga o IR?