Enquanto a crise dos chips ainda ecoa na memória da indústria, escassez de ímãs de terras raras, dominados pela China, ameaça paralisar fábricas na Europa, EUA e Japão e impactar o Brasil com alta de preços e desabastecimento
A indústria automobilística global está à beira de uma nova crise de proporções históricas, e desta vez, o vilão não são os semicondutores. Ímãs de terras raras, componentes indispensáveis em veículos modernos, estão prestes a desaparecer das cadeias de suprimento globais devido a restrições severas impostas pela China. O colapso logístico ameaça interromper a produção de carros elétricos e a combustão em fábricas da Europa, Estados Unidos e Ásia já no mês de julho.
Gigantes como General Motors, BMW e Mercedes-Benz entraram em modo de emergência, iniciando paralisações, acionando estoques estratégicos e buscando alternativas tecnológicas que ainda estão anos longe de serem viáveis. Como se não bastasse, países como o Brasil, dependente de peças importadas, também podem sentir o impacto com aumento nos preços e atrasos de entrega. A fonte do problema: os poderosos, porém discretos, ímãs de terras raras.
Uma crise anunciada: o pânico nas montadoras
Em 2025, montadoras como Ford, Suzuki e Mercedes-Benz já iniciaram paralisações pontuais de suas linhas de montagem por falta de ímãs permanentes, segundo reportagens da Reuters e do Motor Show. Na Alemanha, o CEO da fabricante de ímãs Magnosphere relatou que “toda a indústria está em pânico total” e que “executivos estão dispostos a pagar qualquer preço” para garantir o abastecimento.
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O motivo do colapso iminente é a dependência extrema da China. O país asiático detém 70% da mineração mundial de terras raras, 85% da capacidade de refino e 90% da produção dos ímãs que equipam motores elétricos, sensores, freios e mais de 30 sistemas em carros modernos, de veículos premium até compactos urbanos.
A situação se agravou em abril, quando Pequim impôs novas restrições à exportação de sete elementos críticos, exigindo licenças especiais para envio de ímãs ao exterior. Apenas 25% das solicitações vêm sendo aprovadas, travando embarques e gerando um efeito cascata nas cadeias de suprimento globais.
Montadoras norte-americanas já pediram intervenção direta da Casa Branca, e a União Europeia acelerou o debate sobre sua Lei de Matérias-Primas Críticas (Critical Raw Materials Act), buscando minerar e refinar terras raras no próprio continente.
O que são ímãs de terras raras e por que são tão importantes?
Os ímãs de terras raras, especialmente os de neodímio (NdFeB), são os mais potentes do mundo. Desenvolvidos na década de 1980 por General Motors e Sumitomo, eles substituíram ímãs de ferrite e alnico em aplicações modernas que exigem altíssimo desempenho magnético, com uma densidade de energia até 18 vezes maior.
Compactos, leves e com enorme força magnética, eles são essenciais em motores elétricos, turbinas eólicas, discos rígidos, equipamentos médicos e, claro, em automóveis. Um carro elétrico pode conter entre 1 kg e 2 kg desses elementos. Mesmo os modelos a combustão, como o Jeep Compass, utilizam até 1 kg em sensores de freio, direção elétrica, alto-falantes, câmeras, ajuste de bancos, entre outros.
O grande problema: a produção desses ímãs é altamente concentrada e difícil de replicar fora da China. O refino é complexo, ambientalmente sensível e caro. A Heraeus, empresa de reciclagem na Alemanha, opera com apenas 1% da capacidade por falta de demanda competitiva frente à hegemonia chinesa.
Empresas como Tesla, Renault e BMW trabalham para reduzir ou eliminar o uso de metais de terras raras em seus motores, mas alternativas como ímãs de ferrita ou motores sem ímãs permanentes ainda não escalam em desempenho ou custo.
Brasil sob risco: dependência e alta nos preços
Embora o Brasil ainda não tenha registrado paralisações por falta de ímãs, o risco é iminente. O crescimento de 100% nas vendas de veículos eletrificados em 2024 aumentou a exposição nacional à crise global. Modelos como o Toyota Corolla Cross Hybrid, BYD Dolphin e Volvo XC40 Recharge dependem fortemente desses componentes importados.
O país importa peças de fornecedores norte-americanos e europeus, justamente os que já enfrentam gargalos. Em um cenário de escassez prolongada, há expectativa de alta nos preços e redução na disponibilidade de modelos híbridos e elétricos.
Apesar de possuir reservas de terras raras em Minas Gerais e na região Norte, o Brasil ainda não desenvolveu uma cadeia produtiva robusta para explorá-las ou refiná-las. Iniciativas como a fábrica de ímãs em Lagoa Santa (MG) ainda são embrionárias.
Soluções alternativas: inovação ou ilusão?
Algumas startups tentam quebrar a hegemonia da China. A norte-americana Niron, por exemplo, levantou mais de US$ 250 milhões para desenvolver ímãs livres de terras raras. Seu primeiro modelo pode chegar ao mercado em 2029. Enquanto isso, a inglesa Warwick Acoustics desenvolve alto-falantes magnéticos sem terras raras, com previsão de uso em carros de luxo ainda em 2025.
Outras montadoras buscam alternativas como motores síncronos de relutância ou ímãs de ferrita, mas essas tecnologias ainda não entregam o mesmo desempenho magnético necessário em modelos premium ou SUV. A General Motors, mesmo tendo criado os ímãs de neodímio, agora corre para substituí-los.
A realidade é que substituir um componente tão estratégico requer tempo, capital, escala industrial e inovação disruptiva, elementos que não se encontram prontos em 2025. Analistas como Andy Leyland afirmam que o domínio da China vai além dos ímãs: o país controla também boa parte do fornecimento global de manganês, grafite e alumínio.
Se não houver uma diversificação real das cadeias de suprimento, a indústria pode viver uma repetição, talvez pior, da crise dos semicondutores. E desta vez, sem chips nem ímãs, não há carro que ande.