Com energia limpa e impostos baixos, o Paraguai transforma eletricidade em motor de inovação e atrai gigantes do setor, tornando-se o novo polo tecnológico da América do Sul.
O Paraguai, antes lembrado apenas como fornecedor de energia de Itaipu e destino de fábricas de montagem, está começando a se transformar em algo que poucos esperavam: um novo polo tecnológico na América do Sul. Silenciosamente, o país vizinho vem atraindo investidores, startups e até multinacionais, graças a uma combinação poderosa que o Brasil ainda não consegue igualar — energia limpa, barata e abundante, aliada a incentivos fiscais agressivos e uma política industrial focada em inovação.
Em 2025, esse movimento ganhou força. Com uma das matrizes energéticas mais sustentáveis do planeta e custos até 70% menores que os praticados no Brasil, o Paraguai passou a ser visto como o “refúgio energético” para empresas de tecnologia e data centers que buscam operar com custos reduzidos e pegada de carbono mínima.
Energia limpa: o ouro paraguaio
O trunfo do Paraguai está na sua energia. O país é um dos poucos do mundo cuja matriz elétrica é praticamente 100% renovável, abastecida quase integralmente por hidrelétricas, sendo Itaipu Binacional o maior símbolo dessa força.
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Enquanto o Brasil luta contra tarifas altas e dependência de fontes complementares caras, o Paraguai gera excedente suficiente para exportar mais de 60% da eletricidade que produz.
Essa abundância faz com que o custo da energia industrial no país vizinho seja um dos mais baixos do planeta, atraindo empresas intensivas em consumo elétrico, como mineradoras de dados, fábricas de semicondutores, centros de computação e startups de tecnologia verde.
O economista paraguaio Javier Rivas, do Instituto de Desenvolvimento Econômico, resume o fenômeno: “O Paraguai está convertendo energia limpa em um ativo estratégico. É o novo petróleo da era digital.”
Um ecossistema planejado para inovação
Mas a energia é apenas parte da equação. O Paraguai está construindo uma base sólida para se tornar um polo digital competitivo, investindo em políticas que conectam tecnologia, educação e incentivos fiscais.
Entre as principais iniciativas está o Parque Digital de Assunção, um projeto com investimento inicial de US$ 20 milhões, que vai abrigar empresas globais de tecnologia, laboratórios de pesquisa e uma universidade tecnológica em parceria com Taiwan.
Além disso, o governo expandiu o uso da Lei de Maquila, que permite que empresas estrangeiras importem equipamentos e insumos com isenção de impostos, produzam localmente e exportem pagando apenas 1% sobre o faturamento. Essa política, originalmente voltada para a indústria têxtil e de manufatura, agora começa a ser adaptada para startups de software, centros de dados e fábricas de hardware.
Outra iniciativa importante é a criação de programas de capacitação tecnológica. Escolas técnicas e universidades paraguaias passaram a incluir cursos de robótica, automação, ciência de dados e programação, com incentivo à inclusão feminina no setor de tecnologia.
Lideranças locais impulsionando o movimento
O crescimento do ecossistema de inovação também é fruto de novas lideranças locais. Um exemplo é a engenheira Gabriela Cibils, formada na Universidade da Califórnia, em Berkeley, que retornou ao Paraguai para liderar a startup Cibersons, voltada à criação de softwares e infraestrutura digital.
Empreendedores como ela simbolizam uma geração que está repatriando conhecimento e investimento. De acordo com o Ministério da Indústria e Comércio paraguaio, mais de 30 empresas internacionais já manifestaram interesse em instalar escritórios ou laboratórios no país, com destaque para companhias de energia solar, mobilidade elétrica e inteligência artificial.
O que o Brasil perde nessa corrida
Enquanto o Paraguai avança com energia limpa e impostos baixos, o Brasil ainda enfrenta desafios estruturais que limitam a competitividade tecnológica.
- Altos custos de energia e infraestrutura — mesmo com matriz relativamente limpa, o Brasil tem tarifas muito superiores devido a encargos e perdas de transmissão.
- Complexidade tributária — o sistema fiscal brasileiro continua sendo um dos mais onerosos e burocráticos do mundo, desestimulando investimentos estrangeiros em inovação.
- Burocracia e insegurança jurídica — a abertura e manutenção de empresas, especialmente as de base tecnológica, ainda enfrentam longos trâmites e incertezas regulatórias.
- Infraestrutura desigual — enquanto hubs como São Paulo e Florianópolis prosperam, o interior do país ainda carece de conectividade e logística para suportar polos tecnológicos.
Esses fatores têm levado empresas e investidores a olhar para alternativas próximas e o Paraguai aparece como o “atalho geográfico” para produzir com menos custo, energia estável e acesso direto ao mercado brasileiro.
Um novo mapa tecnológico na América do Sul
Essa transformação tem implicações geopolíticas claras. O Paraguai está se posicionando como um ponto estratégico de interconexão entre o Cone Sul e o restante da América Latina. A aposta é criar um corredor digital com conectividade internacional via fibra óptica, energia garantida por Itaipu e benefícios fiscais permanentes.
Ao mesmo tempo, o país busca firmar parcerias com gigantes do setor, como Google, Huawei e Foxconn, para desenvolver centros de dados e laboratórios de inovação. O objetivo é transformar Assunção e Ciudad del Este em polos tecnológicos integrados, com impacto direto sobre o comércio eletrônico, o agronegócio digital e a manufatura 4.0.
Economistas apontam que o movimento pode mudar o fluxo de investimentos na região, desviando parte do capital que normalmente iria para o Brasil, Chile e Colômbia.
Energia como fator de poder
A nova política industrial paraguaia demonstra como a energia pode ser uma ferramenta de soberania econômica. Enquanto o mundo busca reduzir dependência de combustíveis fósseis, países capazes de oferecer eletricidade limpa e estável se tornam protagonistas.
O governo paraguaio pretende usar a abundância elétrica de Itaipu como “âncora de desenvolvimento”. Parte do excedente exportado ao Brasil pode, a médio prazo, ser redirecionado para novos parques industriais de tecnologia, consolidando o país como plataforma energética e digital da América do Sul.
O futuro próximo e chegada de novos investimentos no Paraguai
Se o ritmo de investimento for mantido, o Paraguai poderá receber mais de US$ 2 bilhões em capital estrangeiro até 2030, segundo estimativas de consultorias regionais. Esse montante inclui a instalação de data centers, fábricas de componentes eletrônicos, empresas de software e fintechs que buscam ambiente regulatório previsível e custo de operação reduzido.
Em paralelo, há planos para expandir a capacidade de exportação de energia e instalar cabos de fibra óptica de alta velocidade conectando Assunção ao Brasil e à Argentina — uma infraestrutura essencial para consolidar o país como hub de tecnologia e comunicações.
Enquanto o Brasil tenta equilibrar contas públicas e custos energéticos, o Paraguai avança em silêncio, convertendo eletricidade limpa em motor de desenvolvimento e atraindo os primeiros unicórnios da região.
A história mostra que o país vizinho, outrora coadjuvante industrial, pode agora ocupar o papel de protagonista digital da América do Sul — um feito construído com pragmatismo, incentivos estratégicos e um ativo que vale ouro: energia limpa e barata.