Elon Musk apresentou planos ousados para o Starlink: transformar a rede de satélites em data centers orbitais e usar inteligência artificial para resfriar a Terra, gerando debates sobre riscos, sustentabilidade e regulação espacial.
Chris Young analisa as novas ambições de Elon Musk para o Starlink, que agora vão além de conectar o mundo. O bilionário planeja transformar sua rede orbital em uma ferramenta para impulsionar a inteligência artificial e até para resfriar o planeta.
As propostas atacam crises reais, como a demanda insustentável por energia e o aquecimento global, mas levantam questionamentos técnicos, ambientais e éticos profundos.
A promessa de conectar o mundo ganha novo rumo
Criado com o objetivo de levar internet a regiões remotas, o Starlink hoje representa cerca de 70% dos 12.500 satélites ativos em órbita.
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Agora, Musk propõe expandir ainda mais essa presença. Ele anunciou nas redes sociais que pretende usar os satélites da SpaceX, equipados com links a laser de alta velocidade, para atender à crescente necessidade de infraestrutura de dados e, em paralelo, criar uma constelação orbital voltada ao combate das mudanças climáticas.
Esses planos, segundo ele, poderiam solucionar duas crises simultâneas: a explosão de demanda por data centers que consomem energia em ritmo insustentável e a escalada das temperaturas globais.
No entanto, ambos exigem o lançamento de milhares de novos satélites, o que agrava o congestionamento orbital e amplia riscos para a ciência e a segurança espacial.
A corrida por energia para alimentar a inteligência artificial
Desde o lançamento público do ChatGPT em 2022, a inteligência artificial tem impulsionado uma demanda energética crescente. Segundo um relatório do Goldman Sachs, a energia consumida por data centers pode subir 165% até 2030. Musk propõe transferir parte dessa carga para o espaço, utilizando a infraestrutura do Starlink.
Ele argumenta que a missão da Tesla é reduzir a dependência de combustíveis fósseis, enquanto a da SpaceX é tornar a humanidade multiplanetária. Assim, enviar data centers para o espaço seria uma continuação natural dessa lógica.
Mas a ideia não é inédita. O ex-CEO do Google, Eric Schmidt, também sugeriu a instalação de data centers orbitais, afirmando que o consumo de energia de IA poderia crescer de 3% para 99% da geração global. Schmidt chegou a assumir o comando da startup espacial Relativity Space com esse objetivo.
Especialistas criticam a viabilidade
Astrônomos e engenheiros, no entanto, duvidam da praticidade da proposta. A pesquisadora Samantha Lawler, da Universidade de Regina, classificou a ideia como “estúpida por muitos motivos”. Ela questiona como data centers poderiam funcionar em órbita, dado que exigem manutenção constante, trocas de componentes e atualizações regulares.
Segundo Lawler, tudo isso seria mais difícil no espaço. Ela também alerta para o risco de danos causados por detritos orbitais, que podem comprometer as operações. Além disso, lançar toneladas de equipamentos em órbita representaria custos elevados e novos impactos ambientais.
Pesquisadores da NTU Singapore defenderam que data centers espaciais são possíveis, aproveitando tecnologias já disponíveis de lançamento e comunicação. Contudo, eles reconhecem que a viabilidade técnica não garante sustentabilidade ambiental.
A proposta pode aliviar o consumo energético terrestre, mas aumenta o problema da superlotação orbital.
Uma constelação de IA para resfriar o planeta
Outra proposta de Musk envolve usar satélites para “resfriar” a Terra por meio da chamada geoengenharia solar. Ele sugeriu em 3 de novembro que uma constelação de satélites movidos a energia solar poderia ajustar a quantidade de luz que chega ao planeta, reduzindo o aquecimento global.
O tema divide a comunidade científica. A ONU alertou recentemente que o mundo não está no caminho para cumprir as metas do Acordo de Paris. Diante disso, alguns cientistas defendem explorar métodos radicais como a redução artificial da radiação solar.
Contudo, especialistas alertam para riscos imprevisíveis. A professora V. Faye McNeill, da Universidade Columbia, explicou que as consequências de bloquear parte da luz solar podem ser muito mais amplas do que se imagina.
Lawler também criticou a proposta. Segundo ela, a solução verdadeira é parar de queimar combustíveis fósseis. Reduzir a luz solar sem cortar as emissões seria apenas um paliativo perigoso. Além disso, se uma quantidade significativa de satélites fosse usada para bloquear o Sol, o risco de colisões orbitais aumentaria drasticamente.
O espectro do congestionamento orbital
As duas ideias de Musk, no fundo, levam ao mesmo problema: mais congestionamento em um espaço já saturado. Em 2022, Lawler alertou para o risco de um efeito em cadeia conhecido como Síndrome de Kessler, no qual colisões entre satélites geram detritos que causam novos impactos, tornando a órbita inutilizável por décadas.
Três anos depois, a situação piorou. Segundo Lawler, há milhares de novos satélites e os rastros luminosos são visíveis até a olho nu. O índice de reentradas também subiu. Os satélites Starlink têm vida útil de apenas cinco anos e precisam ser constantemente substituídos.
Entre novembro de 2024 e maio de 2025, cerca de 500 satélites Starlink queimaram na reentrada, segundo relatório da própria SpaceX. A empresa afirma direcionar essas reentradas para o Pacífico, mas Lawler diz não haver evidências disso. Ela observa que destroços já caíram em áreas habitadas.
Em 2024, fragmentos de um Starlink caíram em uma fazenda em Saskatchewan, no Canadá. Dois anos antes, pedaços da cápsula Crew-1 atingiram uma propriedade na Austrália. A pesquisadora destaca ainda que não existem testes de segurança robustos para reentradas.
Mesmo quando satélites se desintegram completamente, liberam metais e plásticos na atmosfera, o que pode alterar sua química.
O apelo por regulamentação mais rígida
Desde 2022, a União Astronômica Internacional, por meio do Centro para Proteção do Céu Escuro e Silencioso, tem pressionado por normas mais rigorosas sobre operações orbitais. No entanto, segundo Lawler, o avanço é lento, e a SpaceX continua lançando cerca de 60 novos satélites a cada poucos dias.
Ela afirma que até mesmo operadores de satélites desejam regras mais fortes. Há discussões na ONU, mas a falta de consenso e o ritmo das negociações deixam o espaço vulnerável. Relatos recentes indicam que a Estação Espacial Chinesa já sofreu danos por impacto de detritos.
O risco é que uma colisão significativa na órbita do Starlink gere tantos fragmentos que inviabilize missões tripuladas e a operação de novas constelações. Sem regulação, o limite seguro de uso da órbita terrestre pode ser ultrapassado rapidamente.
Manobras de colisão a cada dois minutos
Um relatório da SpaceX à FCC revelou que, entre 2019 e 2023, os satélites Starlink realizaram 50 mil manobras para evitar colisões. Hugh Lewis, professor da Universidade de Southampton, prevê que esse número pode chegar a um milhão de manobras a cada seis meses até 2028.
Entre novembro de 2024 e maio de 2025, a empresa realizou uma manobra a cada dois minutos, em média. Lawler classificou o número como “aterrorizante”, pois cada manobra representa uma chance de erro que pode desencadear a Síndrome de Kessler.
Um evento desse tipo poderia destruir grande parte dos satélites em operação e inutilizar a órbita baixa por séculos.
Um futuro em risco
Enquanto a SpaceX amplia sua constelação e busca novos propósitos para o Starlink, cresce a pressão para que governos e agências espaciais estabeleçam limites claros.
O histórico de Musk, de lançar primeiro e explicar depois, já mudou as regras do setor. Agora, ao expandir o Starlink para atender à IA e interferir no clima, as consequências deixam de ser teóricas.
Os projetos propostos por Musk refletem sua ambição em resolver problemas globais. Porém, eles também mostram como a ausência de regulamentação pode transformar a órbita da Terra em um campo de risco permanente. Se o Starlink evoluir de provedor de internet para infraestrutura climática e de IA, o planeta pode enfrentar um novo tipo de dependência – e de vulnerabilidade.


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