Após perder fortuna na bolsa, empresário australiano vive há mais de 25 anos isolado em uma ilha deserta, onde construiu casa, horta e sistema solar com as próprias mãos.
Por mais de duas décadas, David Glasheen vive completamente isolado do continente australiano em uma pequena ilha chamada Restoration Island, ao norte do estado de Queensland. Antes disso, foi um bem-sucedido empresário do setor de mineração e investimentos em Sydney, dono de uma fortuna avaliada em mais de US$ 28 milhões no auge da década de 1980. Tudo mudou após o crash da Bolsa de 1987, que o levou à falência e o fez abandonar a vida urbana para sempre. Desde então, ele vive como um eremita moderno e seu caso é documentado por veículos como The Guardian, ABC Australia e Business Insider.
A ilha onde Glasheen mora fica a cerca de 1.500 km de Brisbane e é acessível apenas por barco ou helicóptero. O local é cercado por recifes de coral, areia branca e um mar cristalino que contrasta com a dureza da vida em isolamento. Lá, ele construiu uma casa de madeira simples, um gerador solar, um sistema de captação de água da chuva e uma horta que garante parte da alimentação. A ilha pertence ao governo australiano, e Glasheen vive ali sob uma permissão temporária, renovada periodicamente.
De magnata urbano a eremita solitário
Nos anos 1980, David Glasheen era um nome respeitado no mercado financeiro de Sydney. Investidor arrojado e figura carismática, chegou a liderar empresas de mineração e a figurar entre os empresários promissores da Austrália.
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Tudo ruiu com o colapso das bolsas de valores em 1987, quando perdeu praticamente todo o patrimônio em poucos dias. O choque o levou à depressão, e foi nesse momento que decidiu “voltar ao essencial”.
Em entrevista à ABC News Australia, ele afirmou:
“Eu tinha tudo o que o dinheiro podia comprar, mas me sentia vazio. Quando perdi tudo, percebi que era a oportunidade de recomeçar. Vim para cá buscar paz — e encontrei.”
Ele chegou à ilha em 1997, inicialmente com a então namorada, que o acompanhou por pouco tempo. Desde então, vive sozinho, com apenas seu cachorro e uma infinidade de livros e rádios como companhia. Usa energia solar, armazena alimentos em recipientes vedados contra umidade e mantém uma rotina rigorosa: acorda com o nascer do sol, cuida da horta, pesca e dedica o restante do dia à manutenção das estruturas.
Sem internet durante muitos anos, Glasheen passou a receber equipamentos básicos de comunicação por meio de voluntários e turistas que o visitam ocasionalmente. Hoje, ele mantém contato limitado com o mundo exterior, apenas o suficiente para comprar suprimentos por barco uma ou duas vezes ao ano.
Vida simples, mas não primitiva
Mesmo vivendo isolado, David mantém hábitos modernos. Ele usa painéis solares para alimentar luzes e pequenos equipamentos, e guarda uma pequena geladeira movida a energia solar onde armazena alimentos perecíveis.
Sua casa é feita de materiais reaproveitados que ele mesmo recolhe na praia ou recebe de visitantes. Também mantém uma horta com batatas-doces, tomates e abóboras, além de criar galinhas para consumo próprio.
Com o tempo, o antigo investidor desenvolveu um profundo senso de sustentabilidade. Ele reaproveita tudo o que encontra — de garrafas de vidro a pedaços de metal trazidos pelas marés.
“Aqui nada é lixo”, costuma dizer. Sua dieta é baseada em peixe fresco e vegetais cultivados na ilha, e ele evita qualquer desperdício de água ou energia.
Glasheen se tornou um exemplo involuntário de vida minimalista e autossuficiente, inspirando documentários e livros sobre isolamento voluntário. O australiano já recebeu jornalistas, aventureiros e estudantes curiosos sobre o estilo de vida radical que escolheu. Ainda assim, mantém o mesmo discurso: não pretende voltar à civilização.
Isolamento que virou estilo de vida
Apesar de viver em paz, o “náufrago voluntário” já enfrentou momentos de tensão. Em 2017, autoridades australianas tentaram retirá-lo da ilha, alegando que o contrato de uso havia expirado e que ele ocupava terras públicas sem autorização permanente.
Após mobilização da mídia e da população local, o governo concedeu nova permissão de residência temporária, desde que ele mantivesse o local limpo e preservado.
A história de Glasheen ganhou repercussão global por simbolizar o contraste entre o mundo moderno hiperconectado e a busca crescente por simplicidade e isolamento. Em entrevistas à BBC e à ABC, ele afirma que não sente falta de luxo nem de tecnologia:
“O mundo lá fora está barulhento demais. Aqui eu escuto o vento, o mar e os pássaros. Não há preço para isso.”
Mesmo assim, mantém alguns laços com a vida social: recebe turistas e curiosos algumas vezes por ano e oferece abrigo a viajantes em troca de mantimentos. Com o tempo, virou uma espécie de lenda local, apelidado de “o náufrago de Restoration Island”.
Entre o isolamento e a sabedoria
Hoje, com 79 anos, Glasheen continua morando sozinho na ilha, embora com saúde frágil. Ele considera escrever um livro sobre a experiência, reunindo diários e anotações de mais de duas décadas de vida em isolamento. Também recebeu propostas de documentaristas interessados em transformar sua trajetória em série ou filme.
O ex-empresário admite que, no início, viver isolado era uma fuga, mas que agora se tornou sua filosofia de vida.
“As pessoas passam a vida correndo atrás de mais coisas. Eu só precisei perder tudo para perceber o que realmente importa.”
O caso de David Glasheen é um dos raros exemplos de isolamento voluntário prolongado em território australiano. A ilha, coberta por vegetação densa e rodeada por recifes, hoje abriga apenas ele — e sua rotina tranquila, que segue longe das pressões e dos ruídos do mundo moderno.
A história de David Glasheen vai além da curiosidade sobre um homem que vive sozinho em uma ilha. É uma narrativa sobre renúncia, reconstrução e liberdade, um contraponto à vida urbana e às perdas financeiras que o empurraram para o exílio voluntário. Depois de perder milhões, ele encontrou riqueza naquilo que o dinheiro jamais poderia comprar: tempo, silêncio e paz.



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