Cientistas destacam o hidrogênio branco como fonte de energia limpa, barata e abundante. Entenda como ele é formado, onde foi encontrado e por que pode revolucionar o futuro energético.
O mundo busca soluções urgentes para reduzir a dependência de combustíveis fósseis, conter a crise climática e garantir segurança energética para as próximas décadas. Em meio a esse cenário, uma descoberta está movimentando cientistas e empresas de energia: o hidrogênio branco. Diferente das formas mais conhecidas do elemento – o hidrogênio cinza, azul e verde –, essa variante ocorre naturalmente no subsolo e, segundo especialistas, pode ser uma fonte limpa, barata e abundante de energia, potencialmente capaz de abastecer o planeta por séculos.
Hoje, o hidrogênio já é considerado o “combustível do futuro”, pois, quando queimado, libera apenas calor e vapor d’água, sem emissões de carbono. No entanto, quase toda a produção global ainda depende de processos poluentes, como o uso de gás natural ou carvão, responsáveis por grandes quantidades de CO₂. É nesse ponto que o hidrogênio branco se destaca: ele é gerado pela própria natureza e não emite carbono no processo de formação.
Hidrogênio branco: a energia limpa que está sob nossos pés
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Chamado também de “hidrogênio natural”, o hidrogênio branco é formado no subsolo por um processo geológico conhecido como serpentinização. Nele, a água subterrânea interage com rochas ricas em ferro, liberando moléculas de hidrogênio.
Esse gás, por ser extremamente leve, geralmente escapa para a atmosfera ou é consumido por microrganismos. Mas, em algumas condições geológicas, ele fica preso sob camadas impermeáveis de sal ou xisto, formando reservatórios subterrâneos semelhantes aos de petróleo e gás natural.
Essas bolsas subterrâneas são o alvo da corrida exploratória que começa a se formar. O potencial é tão grande que o Serviço Geológico dos Estados Unidos (USGS) estimou, em um estudo de 2024, que pode haver entre 1 bilhão e 10 milhões de bilhões de toneladas de hidrogênio branco no subsolo globalmente – e cerca de 5,6 milhões de bilhões de toneladas presas em formações geológicas.
Segundo os cálculos mais conservadores, se apenas 2% desse volume fosse recuperável, seria suficiente para abastecer a demanda mundial de energia por mais de 200 anos.
Energia limpa e barata: a promessa do hidrogênio branco
Além de ser uma fonte de energia zero carbono, o hidrogênio branco tem outro atrativo: não exige processos industriais caros para ser produzido.
Diferente do hidrogênio verde, que depende de eletrólise (um processo que consome muita energia elétrica), ou do hidrogênio azul, que utiliza combustíveis fósseis e captura de carbono, o hidrogênio branco está “pronto” no subsolo.
Esse diferencial significa que, em teoria, o custo de produção pode ser muito mais baixo do que as alternativas.
Estima-se que, se a extração for viável, o hidrogênio branco poderia ser uma das fontes energéticas mais baratas do mundo, ajudando a acelerar a transição energética e a descarbonização de setores como transporte, indústria e geração elétrica.
Onde está o hidrogênio branco? As descobertas que despertaram a corrida
Nos últimos anos, depósitos de hidrogênio natural foram identificados em países como Austrália, França, Omã, Espanha, EUA e Mali. Em 2025, uma equipe de geólogos anunciou um avanço importante: simulações tectônicas revelaram que cadeias de montanhas formadas por elevação de rochas podem ser pontos críticos de acúmulo de hidrogênio branco.
Regiões que se estendem dos Alpes aos Himalaias foram citadas como áreas promissoras para futuras explorações. O interesse cresceu depois de uma descoberta impressionante na França, onde um grande reservatório foi encontrado no início deste ano, aumentando a expectativa de que a extração em larga escala possa ser viável.
Bourakébougou: o único lugar onde o hidrogênio branco já gera energia
Por enquanto, apenas um local no mundo explora comercialmente o hidrogênio branco: a pequena vila de Bourakébougou, em Mali. Em 1987, um acidente mudou o destino da comunidade. Ao cavar um poço, um trabalhador acendeu um cigarro, provocando uma explosão. Mais tarde, os geólogos descobriram que o gás liberado era hidrogênio quase puro.
Desde então, a reserva local passou a ser usada para gerar eletricidade para a vila, tornando Bourakébougou um exemplo pioneiro do potencial do hidrogênio natural.
Apesar do entusiasmo, o hidrogênio branco ainda enfrenta barreiras significativas. A Agência Internacional de Energia (AIE) avaliou a tecnologia de produção desse gás com pontuação 5 de 9 na sua escala de prontidão, o que indica que ainda há muito a ser desenvolvido antes que a exploração se torne comercialmente viável em grande escala.
Os principais desafios são:
- Encontrar reservatórios viáveis: a maioria das bolsas de hidrogênio está em locais de difícil acesso.
- Garantir fluxo contínuo: ainda não está claro se o hidrogênio é gerado em quantidade suficiente para repor o que for extraído.
- Investimento inicial alto: empresas precisam de tecnologias de perfuração e captação especializadas, semelhantes às usadas na indústria do petróleo.
Ainda assim, o interesse cresce rapidamente. Pelo menos 60 empresas em todo o mundo já anunciaram investimentos na exploração do hidrogênio branco, com aportes que somam mais de US$ 1 bilhão.
Futuro do hidrogênio: o branco pode mudar o jogo energético?
Para muitos cientistas e investidores, o hidrogênio branco pode ser a peça que faltava na transição energética. Ele combina o potencial do hidrogênio como combustível limpo com a possibilidade de extração barata, algo que o hidrogênio verde ainda não conseguiu entregar devido aos altos custos.
Se estudos confirmarem a abundância e acessibilidade desses reservatórios, o hidrogênio branco pode inaugurar uma nova era energética — assim como o petróleo fez no início do século XX.
Por outro lado, a prudência é necessária. Como lembram geólogos e especialistas em energia, ainda não há evidências de que o hidrogênio branco seja renovável em ritmo suficiente para substituir o que for extraído. A promessa é imensa, mas a exploração em larga escala ainda está em fase embrionária.
O hidrogênio branco emerge como uma das descobertas mais intrigantes do setor energético nas últimas décadas. Inodoro, incolor, insípido — e até recentemente praticamente “invisível” aos olhos do mercado —, ele agora desperta uma corrida por conhecimento e exploração.
Se os avanços tecnológicos confirmarem seu potencial, essa fonte limpa, barata e abundante poderá desempenhar um papel decisivo no futuro da energia global, ajudando o mundo a abandonar de vez os combustíveis fósseis. Mas, até lá, a promessa do hidrogênio branco seguirá como um equilíbrio delicado entre entusiasmo e incerteza científica.