Especialista alerta que o mercado de carbono sozinho não acelera a mudança; economista critica a transição energética sem planejamento estatal robusto.
Atualmente, a transição energética domina a agenda global, especialmente diante da crescente preocupação com as mudanças climáticas e os impactos ambientais do uso de combustíveis fósseis.
Entretanto, nem todos os especialistas concordam com os métodos adotados para acelerar essa transformação. Recentemente, um economista critica a transição energética conduzida via mercado de carbono, pois ele aponta limitações estruturais que podem comprometer tanto a velocidade quanto a eficácia do processo.
De fato, o professor Pedro Paulo Zahluth Bastos, do Instituto de Economia da Unicamp, enfatiza que, embora os mercados de carbono existam para incentivar empresas a substituir fontes de energia poluentes por alternativas renováveis, eles não conseguem, sozinhos, promover a transição energética necessária para enfrentar a crise climática.
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Portanto, para ele, o planejamento estatal robusto é essencial, visto que somente assim a oferta de tecnologias verdes e a adoção de alternativas sustentáveis por empresas e consumidores se tornam viáveis.
Ademais, a ideia do mercado de carbono surgiu nos últimos 30 anos como uma ferramenta dentro das políticas de mitigação de gases de efeito estufa, coordenadas principalmente pela Organização das Nações Unidas (ONU).
Por exemplo, eventos internacionais, como as conferências climáticas da COP, culminando na COP29 em Baku, Azerbaijão, consolidaram a proposta de fixar cotas de emissões e criar um sistema de créditos negociáveis entre empresas.
Contudo, Zahluth Bastos afirma que o mecanismo desviou a atenção do problema mais do que gerou soluções concretas. Ele ressalta que, sem infraestrutura tecnológica e acesso a energias renováveis, o aumento de preços do carbono não induz uma transição eficiente.
Além disso, ele observa que a dependência de políticas de mercado cria uma falsa sensação de progresso. Por isso, muitos governos e corporações apoiam-se nos créditos de carbono como solução principal, enquanto investimentos concretos em tecnologias limpas e redes de transmissão permanecem insuficientes.
Economista critica a transição energética: Limitações do mercado de carbono
Nesse sentido, o mercado de carbono funciona com base em cotas de emissão de gases do efeito estufa. Consequentemente, empresas que emitem menos que o permitido ganham créditos, que podem vender para aquelas que ultrapassam suas metas.
Embora a teoria econômica sugira que isso cria incentivos para reduzir emissões, na prática Zahluth Bastos alerta que o sistema falha ao não conseguir fixar um preço global do carbono.
De maneira histórica, esforços globais como o Protocolo de Kyoto, assinado em 1997, buscaram reduzir a dependência de combustíveis fósseis e estimular tecnologias limpas.
No entanto, entre 1997 e 2024, o consumo de combustíveis fósseis aumentou cerca de 58%, e a participação desses combustíveis na matriz energética mundial caiu apenas marginalmente, de 85,8% para 81%.
Portanto, esses números mostram que políticas baseadas exclusivamente no mercado falharam em gerar uma transformação significativa.
Nesse contexto, o economista reforça a necessidade de intervenção governamental direta, criando infraestrutura e oferta tecnológica antes de depender de mecanismos de preços.
Além do mais, outro ponto destacado pelo especialista é a baixa lucratividade das empresas de energia renovável em comparação com setores tradicionais de petróleo e gás.
Enquanto os retornos anuais das energias verdes variam entre 6% e 8%, os bancos privados buscam financiar projetos com retorno superior a 10%, facilmente obtido em setores de combustíveis fósseis, apoiados por oligopólios e cartéis como a OPEP.
Assim, essa discrepância cria uma barreira econômica para a expansão de energias limpas, independentemente dos preços do carbono.
Ademais, Zahluth Bastos destaca que a desinformação e a pressão política influenciam significativamente a transição energética. Consequentemente, corporações poderosas investem em lobby e financiamento de políticos que priorizam interesses fósseis, atrasando políticas de incentivo à energia limpa.
Desafios estruturais da transição energética
De fato, o professor Zahluth enfatiza que mesmo com aumentos nos preços de emissões, empresas continuarão a consumir combustíveis fósseis.
Isso ocorre porque tecnologias alternativas ainda não estão suficientemente acessíveis ou competitivas.
Além disso, a infraestrutura necessária para a transição energética, incluindo redes de transmissão, armazenamento de energia e geração distribuída, ainda limita muitos países.
Portanto, qualquer aumento do preço do carbono funciona apenas como uma punição financeira, sem induzir mudanças substanciais na matriz energética.
Por outro lado, outro aspecto relevante destacado pelo economista é a distribuição desigual das emissões globais.
Até 2010, 90 instituições responderam por 63% das emissões, concentradas em regiões temperadas menos afetadas pelo aquecimento global. Entre 2016 e 2022, apenas 57 corporações emitiram 80% das emissões globais.
Dessa forma, essa concentração evidencia que políticas de mercado baseadas em incentivos generalizados podem ser insuficientes, reforçando a necessidade de políticas públicas direcionadas.
Além disso, o mercado de carbono enfrenta desafios relacionados à produção e ao armazenamento de energias renováveis.
A geração de energia solar e eólica, por exemplo, demanda grandes extensões de terra, muitas vezes afastadas de centros urbanos e redes de transmissão.
Ademais, o armazenamento de energia ainda custa caro e envolve complexidade técnica, tornando difícil equilibrar oferta e demanda sem impactar os preços.
Consequentemente, a volatilidade dos retornos financeiros nesses setores gera ciclos de superprodução e queda de lucros, desestimulando investimentos consistentes.
Limitações naturais e soluções complementares
Historicamente, esforços de reflorestamento e conservação ambiental ajudaram a reduzir o aquecimento global.
De fato, florestas absorvem carbono e podem compensar parte das emissões, mas Zahluth Bastos alerta para limitações de terra e capacidade.
Estudos indicam que seria possível reflorestar, no máximo, 900 milhões de hectares globalmente, o que absorveria apenas cinco anos de emissões na taxa anual atual.
Portanto, soluções naturais sozinhas não substituem políticas estruturadas e planejamento energético.
O economista reforça que o mercado de carbono e a compensação florestal só funcionam quando integrados a um sistema energético alternativo e planejado pelo Estado.
Além disso, a cobrança de custos sociais e incentivos financeiros, sem infraestrutura tecnológica e políticas públicas claras, não garante uma transição justa e rápida para energias limpas.
Por isso, ele defende que o Estado deve agir antes de usar o mercado como ferramenta principal de mudança.
Ademais, Zahluth Bastos alerta para a necessidade de educação ambiental e conscientização pública, essenciais para viabilizar mudanças de comportamento no consumo de energia e adoção de tecnologias limpas.
A transição energética não depende apenas de preços ou incentivos econômicos; exige uma transformação cultural e social, investimento em informação, treinamento técnico e apoio comunitário.
Planejamento estatal é essencial
Em resumo, o artigo do economista evidencia que confiar apenas no mercado para conduzir a transição energética é limitado.
A história recente mostra que sem ação estatal robusta, a dependência de incentivos econômicos não consegue enfrentar a crise climática global.
Portanto, a mensagem é clara: políticas públicas bem estruturadas, infraestrutura tecnológica adequada e incentivo a investimentos em energias renováveis são centrais para uma transição energética eficaz, sustentável e socialmente justa.
Por fim, o debate sobre o futuro energético do planeta continua, mas a análise do professor Zahluth destaca que depender apenas do mercado de carbono pode atrasar mais do que acelerar a transição.
Consequentemente, a integração de políticas públicas, planejamento estratégico, conscientização social e tecnologias limpas será essencial para que a humanidade consiga reduzir emissões e mitigar os efeitos das mudanças climáticas de forma significativa e duradoura.