Extinção do seguro obrigatório pressiona o orçamento do SUS, retira indenizações de milhares de vítimas e reacende debate no Congresso sobre a volta de um modelo que garanta recursos para saúde e proteção financeira em acidentes.
Um ano após a revogação que impediu a retomada do seguro obrigatório, representantes do Ministério da Saúde foram ao Congresso relatar impactos na assistência a vítimas de acidentes de trânsito.
Segundo a pasta, a extinção do modelo anterior, somada ao veto à recriação em 2025, retira do SUS cerca de R$ 580 milhões por ano e deixa, especialmente motociclistas, sem o acesso a indenizações de até R$ 13,5 mil.
O que mudou com o fim do seguro obrigatório
Criado em 1974, o seguro indenizava vítimas de acidentes, independentemente de culpa, e tinha parte da arrecadação destinada ao custeio hospitalar público.
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A cobrança anual foi zerada a partir de 2021.
Em maio de 2024, o Congresso aprovou e o governo sancionou uma lei para recriar a cobrança sob o nome SPVAT, com previsão de retorno em 2025.
No entanto, em dezembro do mesmo ano, uma nova lei complementar revogou a retomada, mantendo suspenso o pagamento obrigatório em 2025.
Com isso, quem não possui seguro privado segue sem cobertura indenizatória específica.
Perda de recursos e pressão sobre a rede pública
A diretora do Ministério da Saúde Letícia de Oliveira Cardoso afirmou em audiência na Câmara que o fim do repasse anual ao SUS gerou um rombo contínuo no financiamento dos atendimentos a acidentados.
Segundo ela, 45% de tudo o que se arrecadava com o antigo seguro ia direto para o Fundo Nacional de Saúde.
Desde que a cobrança foi zerada, a rede deixou de receber em média R$ 580 milhões por ano, valor que passou a ser coberto integralmente pelo Orçamento Geral da União.
A gestora citou ainda que, em alguns municípios, até 60% dos leitos de urgência e de UTI estão ocupados por vítimas de sinistros viários.
Ainda de acordo com os debatedores, o país registra anualmente cerca de 33 mil mortes no trânsito e 310 mil pessoas com sequelas.
Os números reforçam a sobrecarga da atenção hospitalar e de reabilitação, com impacto direto no gasto público.
Quem fica mais vulnerável
Motociclistas concentram grande parte das vítimas e, por consequência, dos custos.
Na prática, pessoas de menor renda que dependem da moto para trabalhar ou se locomover são as mais expostas à falta de uma cobertura indenizatória padronizada.
Sem o seguro obrigatório, famílias relatam dificuldades para arcar com despesas emergenciais após colisões, enquanto hospitais públicos absorvem procedimentos de alta complexidade.
Como funcionava o DPVAT
No desenho original, o seguro cobria indenização por morte e por invalidez permanente, cada uma de até R$ 13.500, além de reembolso de despesas médicas em rede privada de até R$ 2.700.
O pagamento era feito sem necessidade de advogado e independente de quem causou o acidente.
Do total arrecadado:
- 50% custeava as indenizações.
- 45% reforçava o SUS.
- 5% destinava-se a ações de educação no trânsito.
Em 2019, a arrecadação bruta foi próxima de R$ 2,1 bilhões, dos quais aproximadamente R$ 929,7 milhões foram repassados ao Sistema Único de Saúde.
No último ano com cobrança reduzida, 2020, o valor anual pago pelos proprietários foi R$ 5,23 para automóveis e R$ 12,30 para motocicletas, quitado junto ao licenciamento.
O debate sobre prevenção e indenização
Na audiência, o presidente do Centro de Defesa das Vítimas de Trânsito, Lúcio Almeida, qualificou a extinção do seguro como “um descaso”, argumentando que o instrumento era uma rede de proteção para famílias que não conseguem contratar seguros privados.
Em linha distinta, o presidente do conselho deliberativo do Observatório Nacional de Segurança Viária, José Aurélio Ramalho, defendeu que prevenção precisa ser prioridade no desenho de qualquer política:
“Nós devemos provisionar verbas do DPVAT para atendimento à vítima ou prevenir os acidentes? A prevenção pode vir do fator veicular, da via e do comportamento humano”, declarou.
O contraste das posições não é sobre a importância de amparar as vítimas, mas sobre o melhor uso dos recursos: ressarcir danos após o sinistro ou investir mais intensamente para evitar que ele aconteça.
Pressão política por um novo modelo
Parlamentares avaliam formas de reintroduzir um seguro obrigatório com governança e regras aprimoradas.
Hugo Leal (PSD-RJ), que pediu a audiência, declarou que extinguir o seguro foi “um erro” e defendeu a necessidade de esclarecer a população sobre a função social da cobrança.
A perspectiva em discussão inclui calibrar a tarifa por categoria de veículo, reforçar controles contra fraudes e assegurar que os repasses ao SUS e às indenizações tenham previsibilidade.
Enquanto um novo consenso não se forma, o SUS continua absorvendo o atendimento de alta e média complexidade dos acidentados, e motociclistas permanecem sem a cobertura padronizada que vigorou por décadas.
Nesse cenário, reaparece a pergunta central do debate: um seguro obrigatório deve ser redesenhado para voltar a existir ou a política pública deve focar exclusivamente na redução de sinistros?