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Do deboche à mudança em massa: por que mais de 263 mil brasileiros trocam o Brasil pelo Paraguai em busca de impostos baixos e futuro melhor

Escrito por Felipe Alves da Silva
Publicado em 01/10/2025 às 00:03
Brasileiros migrando para o Paraguai em busca de impostos baixos e vida mais barata.
Brasileiros atravessam a fronteira em busca de menos impostos e custo de vida mais baixo no Paraguai. Imagem: IA
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Paraguai se consolida como principal destino de imigrantes brasileiros na América do Sul, oferecendo impostos reduzidos, energia barata e oportunidades que o Brasil não consegue garantir

Por muito tempo, chamar algo de “paraguaio” no Brasil era quase sinônimo de insulto. Piadas, estereótipos e comentários depreciativos marcaram a forma como os brasileiros enxergavam o país vizinho. No entanto, enquanto o Brasil ria, o Paraguai mudava silenciosamente seu rumo. Cortou impostos, simplificou leis e abriu espaço para atrair empresas e investidores.

Enquanto a imagem popular associava o Paraguai ao contrabando, o país estruturava um dos sistemas tributários mais vantajosos da América do Sul. O resultado não demorou a aparecer: hoje, mais de 263 mil brasileiros vivem em território paraguaio, transformando-o no principal destino de imigrantes do Brasil em toda a região.

De brasiguaios a empresários e estudantes

Esse movimento migratório não começou ontem. Suas raízes remontam ao período do ditador Alfredo Stroessner (1954–1989), quando o país, sob forte controle estatal e apoio militar, buscava ampliar sua presença econômica e geopolítica.

Foi justamente nessa época que a construção da Ponte da Amizade e o Tratado de Itaipu – ambos financiados pelo Brasil – facilitaram a integração dos dois países. A partir do fim da década de 1960, milhares de brasileiros atravessaram a fronteira, primeiro em busca de terras baratas e depois em função das oportunidades comerciais.

Nos anos 70 e 80, famílias inteiras venderam seus bens no Brasil para comprar propriedades agrícolas muito maiores no Paraguai. Esses imigrantes ficaram conhecidos como “brasiguaios” e transformaram cidades como Santa Rita e Naranjal, introduzindo o cultivo intensivo de soja e milho que, décadas depois, faria do Paraguai um dos maiores exportadores de grãos do mundo.

O salto da economia e a Lei Maquila

Com o fim da ditadura nos anos 1990, o Paraguai começou a redesenhar sua economia. Mas foi nos anos 2000 que veio a guinada decisiva: um sistema tributário simplificado, incentivos industriais e políticas de integração transformaram o país em polo de investimentos.

A Lei Maquila (Lei 1064/97), consolidada no início dos anos 2000, foi um divisor de águas. Ela reduziu drasticamente a carga tributária de empresas exportadoras. Indústrias brasileiras, sufocadas pelos altos impostos e custos trabalhistas em seu país de origem, migraram para o Paraguai em busca de alívio fiscal.

Segundo Francisco Ruiz Díaz, vice-ministro de Indústria, “70% das exportações do Paraguai para o Brasil são resultado da maquila”. O setor têxtil é um exemplo marcante: empresas brasileiras enviam insumos para o Paraguai, produzem localmente e reexportam para o Brasil, pagando impostos muito menores.

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O Paraguai como novo Eldorado brasileiro

Além dos incentivos fiscais, outros fatores tornaram o Paraguai ainda mais atraente. O país oferece energia elétrica a preços muito abaixo da média sul-americana, graças à hidrelétrica de Itaipu. Para se ter uma ideia, enquanto no Brasil o custo médio da eletricidade industrial gira em torno de 123 USD/MWh, no Paraguai esse valor cai para apenas 39 USD/MWh. É como abastecer três fábricas paraguaias pelo preço de apenas uma no Brasil.

Cidades como Ciudad del Este exemplificam essa transformação. Antes conhecidas pelo comércio de eletrônicos e contrabando, hoje concentram mais de 98 mil brasileiros, tornando-se polos empresariais, industriais e estudantis.

O fenômeno dos estudantes brasileiros

Se no passado a migração era dominada por agricultores, hoje o Paraguai atrai um novo perfil de imigrantes. Quase 30 mil brasileiros estudam medicina em universidades paraguaias. Na turma de Felipe Monteiro, estudante do Amapá em Ciudad del Este, apenas 2 dos 80 alunos são paraguaios – o restante veio do Brasil.

A diferença de custos explica parte desse movimento. Enquanto em Belém uma mensalidade de Medicina chega a R$ 8 mil, no Paraguai Felipe começou pagando R$ 1,2 mil e hoje paga R$ 1,9 mil. Essa economia massiva tem levado famílias inteiras a repensar o futuro acadêmico de seus filhos.

O custo de vida imbatível

Outro grande atrativo é o custo de vida, até 2119% mais baixo em comparação ao Brasil, segundo índices internacionais. Embora um almoço em áreas nobres possa ser 35% mais caro, o Índice Big Mac mostra que no Brasil o sanduíche custa 286% a mais do que no Paraguai.

O mercado imobiliário também chama atenção: um apartamento de um quarto em região nobre custa em média R$ 1.931,75 no Paraguai, contra R$ 3.019,48 no Brasil, uma economia próxima de 356%. Já os custos com utilidades, como eletricidade e gás em um apartamento de 85 m², podem ser até 743% mais baratos em solo paraguaio.

Sistema tributário: o trunfo fiscal

O sistema tributário paraguaio é a cereja do bolo. Conhecido como “10-10-10”, aplica 10% de imposto de renda para pessoas físicas, 10% para empresas e 10% de IVA (equivalente ao ICMS). Além disso, não existem impostos sobre heranças ou doações, e rendimentos obtidos no exterior têm tributação zero.

Inspirada no modelo mexicano, a Lei Maquila ainda permite que empresas exportadoras paguem apenas 1% sobre a receita bruta. Isso significa que, enquanto empresários brasileiros enfrentam até 27,5% de IRPF e 34% para empresas, seus pares no Paraguai reduzem drasticamente seus custos apenas mudando a sede da produção.

Comparação global e facilidades de residência

Muitos brasileiros sonham em migrar para Estados Unidos, Canadá ou Europa. Porém, nesses destinos, a burocracia de vistos, os custos imobiliários elevados e as barreiras de entrada tornam o sonho distante. O Paraguai, por outro lado, oferece processo de residência simplificado.

Em apenas 1,5 a 4 meses o imigrante pode obter a Residência Temporária. Após 1 ano e 9 meses, já pode solicitar a Residência Permanente. A cidadania paraguaia leva mais tempo – só pode ser pedida após 3 anos como residente permanente, mas ainda assim o processo é mais ágil do que em países desenvolvidos.

O lado oculto do crescimento

Nem tudo, porém, é positivo. O Paraguai enfrenta desafios sérios: 27% da população vive em situação de pobreza e o país ocupa a 136ª posição no índice mundial de percepção de corrupção, atrás até do Brasil, que está em 104º lugar. Esses obstáculos revelam que, embora atraente, o Paraguai ainda carrega fragilidades estruturais.

Mesmo assim, segundo a Elementar, que publicou reportagem detalhada sobre esse fenômeno, a ascensão paraguaia e a migração em massa de brasileiros são reflexos de mudanças históricas e estruturais na América do Sul.

De “piada” a oportunidade real

Por décadas, o Paraguai foi alvo de chacota. Hoje, no entanto, o movimento se inverteu: são os brasileiros que atravessam a fronteira em busca de liberdade econômica, menos impostos e mais qualidade de vida. Enquanto o Brasil endurece regras e aumenta a carga tributária, o Paraguai cresce, atrai investimentos e redesenha a geopolítica migratória da região.

A questão que fica é: vamos continuar rindo do Paraguai ou já é hora de admitir que a piada somos nós?

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Felipe Alves da Silva

Sou Felipe Alves, com experiência na produção de conteúdo sobre segurança nacional, geopolítica, tecnologia e temas estratégicos que impactam diretamente o cenário contemporâneo. Ao longo da minha trajetória, busco oferecer análises claras, confiáveis e atualizadas, voltadas a especialistas, entusiastas e profissionais da área de segurança e geopolítica. Meu compromisso é contribuir para uma compreensão acessível e qualificada dos desafios e transformações no campo estratégico global. Sugestões de pauta, dúvidas ou contato institucional: fa06279@gmail.com

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