O que começou como um projeto para gerar energia se transformou em um dos maiores lagos artificiais do mundo, um destino náutico repleto de belezas e contradições no coração de Minas Gerais.
Lanchas cortam as águas de cor esmeralda entre paredões rochosos de mais de 20 metros. Cachoeiras despencam diretamente no lago, encantando turistas. Essa é a cena nos Cânions de Furnas, um dos cartões-postais do Brasil. Contudo, este cenário esconde um paradoxo. O imenso “Mar de Minas” é, na verdade, o Lago de Furnas, um dos maiores lagos artificiais do mundo, nascido de um projeto de usina hidrelétrica que mudou para sempre a geografia e a vida na região.
O projeto desenvolvimentista e a construção da usina hidrelétrica
Nos anos 1950, o Brasil vivia o otimismo do lema “50 anos em 5” do presidente Juscelino Kubitschek. O crescimento do parque industrial do Sudeste, formado por São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, exigia uma quantidade imensa de energia elétrica. O país corria o risco de um colapso energético que poderia frear seu desenvolvimento.
A solução foi um projeto monumental. A construção da usina hidrelétrica de Furnas começou em julho de 1958. Era uma das maiores obras do gênero na América Latina na época. Sua localização estratégica no curso do Rio Grande era vital para abastecer os três maiores centros industriais do país.
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A energia que Furnas prometia gerar representava, sozinha, um terço de toda a capacidade instalada no Brasil. Quando as comportas se fecharam em 1963, nasceu o Lago de Furnas, com uma área de 1.440 km² e um perímetro de aproximadamente 3.700 km, banhando 34 municípios mineiros.
As cidades e memórias submersas pelo lago
O progresso teve um custo humano profundo. O enchimento do reservatório da usina hidrelétrica engoliu terras férteis, vilarejos e cidades inteiras. Duas comunidades se tornaram símbolos dessa perda. A antiga cidade de Guapé, com cerca de 14.000 habitantes, foi inundada.
Os moradores foram realocados para uma “Nova Guapé” em terras mais altas. Em períodos de seca, as ruínas da igreja matriz e de outras construções reaparecem, como fantasmas do passado. Outra comunidade submersa foi a Barra Velha, no município de São José da Barra. Relatos da época descrevem a incredulidade dos moradores, que não acreditavam que a água chegaria.
A evacuação foi dramática, com resgates de helicóptero. Casas, móveis e memórias foram deixados para trás. A inundação destruiu não apenas casas, mas um modo de vida baseado nas terras férteis de várzea, além de ferrovias e rotas de barcos que conectavam a região.
Capitólio e as belezas naturais do lago
Com o tempo, após a construção da usina hidrelétrica a região se reinventou. O que era um símbolo de deslocamento virou um dos destinos turísticos mais procurados do Brasil. A cidade de Capitólio se tornou o epicentro desse turismo. O Mirante dos Cânions oferece vistas espetaculares e é um dos pontos mais fotografados. O principal atrativo, contudo, é o passeio de lancha pelos cânions, com paradas para banho em cachoeiras que deságuam no lago.
A região é um paraíso das cachoeiras, com opções para todos os gostos. Algumas, como as do Cânion de Furnas, são acessíveis apenas por barco. Outras, como a famosa Lagoa Azul, podem ser visitadas por terra ou água. Complexos como a Trilha do Sol e o Paraíso Perdido oferecem circuitos de trilhas com diversas quedas. A cultura náutica se estabeleceu com força, dando origem a bares e restaurantes flutuantes que servem os barcos diretamente na água.
A batalha pela água e a segurança com a operação da usina hidrelétrica
A prosperidade trazida pelo turismo criou novos desafios. O principal conflito atual é a disputa pelo nível da água do reservatório. A operação da usina hidrelétrica é controlada pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), que visa garantir o abastecimento de energia do país. Para isso, muitas vezes o nível do lago precisa ser reduzido.
Essa redução, no entanto, causa prejuízos devastadores para a economia local, que depende de um lago cheio para a navegação e para manter a paisagem atrativa. A questão se tornou uma batalha política, com lideranças locais pressionando pela manutenção de uma cota mínima.
Além disso, a segurança se tornou uma preocupação central após a trágica queda de um bloco de rocha em janeiro de 2022. O evento expôs os riscos naturais da região, como desprendimento de rochas e as “cabeças d’água” (enchentes relâmpago), exigindo maior regulamentação e monitoramento.
Como planejar sua viagem ao Mar de Minas
Para aproveitar o melhor da região, o planejamento é fundamental. A estação seca (abril a outubro) tem dias ensolarados, menos chuvas e a cidade mais vazia, ideal para quem busca tranquilidade. A estação chuvosa (novembro a março) tem as cachoeiras com volume máximo, mas o tempo instável pode cancelar passeios e os preços são mais altos.
A melhor forma de chegar e se locomover é de carro, partindo de Belo Horizonte (4h30) ou São Paulo (6h). Ter um veículo próprio é essencial para explorar as atrações terrestres. Capitólio é a principal base para se hospedar, com opções para todos os bolsos.
Para quem quer explorar também a Serra da Canastra, cidades como São João Batista do Glória e Vargem Bonita são excelentes alternativas. Ao planejar sua visita, lembre-se de contratar apenas operadores de turismo legalizados e seguir sempre as orientações de segurança dos guias locais.