A França descobriu um navio mercante do século XVI a 2.567 metros de profundidade no Mediterrâneo. A cápsula do tempo submersa pode mudar a história do comércio europeu.
No fundo do Mar Mediterrâneo, a uma profundidade de 2.567 metros, a França acaba de alcançar um feito sem precedentes. Utilizando tecnologia de ponta em drones subaquáticos, o Exército — mais precisamente a Marinha Francesa — localizou o que pode ser um dos achados arqueológicos mais importantes da Europa renascentista: um navio mercante do século XVI, batizado temporariamente de Camarat 4, em referência ao cabo Saint-Camarat, próximo a Saint-Tropez.
O que torna essa descoberta ainda mais impressionante não é apenas sua profundidade, mas o estado de preservação quase congelado da embarcação, algo raríssimo no mundo da arqueologia marítima. Com cerca de 30 metros de comprimento, o navio repousava em silêncio absoluto há mais de 400 anos — como uma cápsula do tempo submersa, guardando segredos do comércio marítimo europeu da era renascentista.
Um feito arqueológico liderado pela Marinha Francesa
A missão foi liderada pela Marinha Nacional da França, que atua de forma estratégica também em projetos científicos, e envolveu colaboração entre arqueólogos, oceanógrafos e engenheiros navais. A operação utilizou veículos submersíveis operados remotamente (ROVs) com capacidade para navegar em condições extremas — ausência total de luz, pressões elevadas e temperatura próxima ao congelamento.
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Foi essa combinação de fatores naturais que criou um ambiente ideal para a preservação do navio. Diferente dos naufrágios em águas rasas, onde a madeira é rapidamente corroída por microrganismos e correntes marítimas, o Camarat 4 foi protegido por séculos em um mundo silencioso, escuro e imóvel.
Os arqueólogos classificaram o achado como um dos maiores feitos da arqueologia francesa, não apenas pelo recorde nacional de profundidade, mas pelo potencial que ele tem de reescrever parte do conhecimento sobre o comércio marítimo europeu no Mediterrâneo durante os séculos de transição entre a Idade Média e a modernidade.
O que o navio pode revelar sobre a história da Europa?
Segundo especialistas do Institut National de Recherches Archéologiques Préventives (INRAP), o Camarat 4 pode conter artefatos, documentos e cargas comerciais que estavam sendo transportadas entre portos europeus, africanos ou do Oriente Médio. Durante o século XVI, a rota mediterrânea era vital para o transporte de especiarias, tecidos, cerâmicas, metais e manuscritos, e muitos desses materiais podem ter sido preservados no interior do navio.
Embora ainda não tenha sido feita a recuperação total da carga — o processo será lento e delicado —, as imagens preliminares mostram ânforas, estruturas de madeira intactas e partes da cabine de comando, indicando que parte significativa do conteúdo original pode estar intocado.
Essa hipótese é o que empolga historiadores e arqueólogos: o achado pode trazer à tona documentos inéditos, moedas raras, produtos de troca entre culturas distintas e até mesmo objetos pessoais que forneçam pistas sobre o cotidiano de marinheiros e mercadores no início da Europa moderna.
Arqueologia em profundidade: um campo que desafia limites
Descobertas arqueológicas em profundidades superiores a 2.000 metros são extremamente raras. A maioria dos naufrágios históricos é encontrada em áreas costeiras, onde o acesso é mais simples e os riscos são menores.
O caso do Camarat 4 desafia essa lógica. A Marinha Francesa precisou superar desafios logísticos imensos: mapeamento 3D do fundo do mar, pressão atmosférica 250 vezes maior que a da superfície e operação remota de robôs com precisão cirúrgica.
Com essa descoberta, a França entra para o seleto grupo de nações que investem em arqueologia de águas profundas, um campo que exige não apenas conhecimento histórico, mas também domínio de tecnologias avançadas — como georreferenciamento, IA para análise de imagem submersa e engenharia de materiais para resgate seguro.
Comparação com outros naufrágios históricos
A descoberta do Camarat 4 já é considerada a mais profunda da história da arqueologia francesa. No entanto, quando se trata de recorde absoluto, ela ainda perde para o caso do USS Samuel B. Roberts, navio de guerra norte-americano localizado a 6.895 metros no Mar das Filipinas — um feito conquistado em 2022 pelo explorador Victor Vescovo.
Entretanto, há uma diferença crucial: o USS Samuel B. Roberts era um contratorpedeiro da Segunda Guerra Mundial, enquanto o Camarat 4 é um navio mercante renascentista, anterior ao uso generalizado de aço ou propulsão a vapor.
Ou seja, em termos de arqueologia clássica, o Camarat 4 é insuperável em profundidade e importância para a história europeia da Idade Moderna.
O impacto global da descoberta arqueológica feita pela França
Em poucos dias, a notícia do achado se espalhou por veículos internacionais. Universidades, museus e instituições culturais ao redor do mundo já manifestaram interesse em participar das próximas fases do projeto, incluindo escavação, catalogação de itens e estudos comparativos.
Alguns estudiosos apontam que a rota onde o Camarat 4 foi encontrado coincide com antigas redes de navegação que ligavam Marselha, Gênova, Veneza e Alexandria — o que pode indicar que o navio fazia parte de um circuito comercial vital do século XVI, talvez antes da expansão transatlântica.
Outros, mais ousados, acreditam que a embarcação pode conter traços de carga otomana, africana ou até chinesa, reforçando a tese de que o Mediterrâneo foi, por séculos, uma ponte entre civilizações — muito antes da globalização moderna.