Coalizão com 73 empresas e oito associações apresenta proposta à COP30 defendendo ações urgentes de governança e planejamento para garantir a descarbonização do transporte e da indústria no Brasil.
A descarbonização desponta como um dos principais desafios e oportunidades para o Brasil nas próximas décadas. Representantes do setor elétrico afirmam que o país tem plenas condições de liderar a transição energética global, usando sua matriz majoritariamente renovável para reduzir emissões de carbono nos transportes e na indústria. No entanto, segundo o grupo, a falta de governança e o excesso de lobbies políticos estão comprometendo a eficiência do sistema e elevando custos ao consumidor, conforme noticiado nesta sexta, 10.
A mensagem foi enviada à presidência da COP30 por uma coalizão formada por 73 empresas e oito associações. O grupo defende uma transição energética estruturada, com planejamento estatal sólido e regras estáveis para investidores. Apesar do amplo apoio, o manifesto não inclui representantes do setor de energia solar, alvo de críticas devido a subsídios considerados excessivos.
Matriz renovável brasileira é modelo mundial, mas precisa crescer
De acordo com o estudo elaborado pela consultoria PSR, o Brasil possui atualmente 90% de sua matriz elétrica composta por fontes renováveis, o dobro da média mundial. O grande desafio, entretanto, é manter esse índice nas próximas décadas, especialmente diante da crescente eletrificação de setores industriais e de transporte.
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Setor de energia limpa precisa de políticas públicas contra o desperdício
Para garantir o mesmo patamar de renovabilidade até 2050, será necessário mais do que dobrar a capacidade atual de geração, adicionando cerca de 345 gigawatts (GW) em novas fontes limpas. Essa expansão permitiria ao país manter 88% da matriz renovável, mesmo com a ampliação da demanda energética.
O presidente da PSR, Luiz Barroso, destaca que essa projeção considera o avanço da eletrificação e o surgimento de projetos de alto consumo, como plataformas de dados e usinas de hidrogênio verde. Segundo ele, “a manutenção da matriz 90% renovável tem potencial de promover sinergias para a descarbonização nacional e global da economia em até 176 milhões de toneladas de CO₂ por ano”, o que representa cerca de 11% das emissões totais do Brasil.
Transição energética pode reduzir emissões e gerar empregos
A expansão da energia elétrica limpa representa uma oportunidade de transformação estrutural da economia brasileira. “Hoje, a indústria vive de usar combustível fóssil, seja carvão ou gás para esquentar água ou gerar vapor. A gente assume que muitos desses processos podem ser eletrificados”, explica Barroso.
Essa substituição de fontes poluentes por eletricidade renovável poderá reduzir drasticamente as emissões industriais e de transporte, ao mesmo tempo em que impulsiona novos investimentos em infraestrutura, inovação e geração de empregos qualificados.
No entanto, o estudo adverte que, sem uma governança adequada, o setor corre o risco de entrar em uma “transição caótica”, marcada por decisões políticas desconectadas do planejamento técnico.
Governança e planejamento são as principais preocupações
O manifesto entregue à COP30 critica a atual falta de coordenação do governo federal no planejamento energético. Segundo o documento, o Congresso Nacional tem assumido um papel central nas decisões do setor, aprovando leis e subsídios sem embasamento técnico.
Esse cenário, alertam os representantes, resultou na expansão desordenada da geração distribuída de energia solar e na contratação de projetos fósseis sem necessidade real. Para corrigir o rumo, a coalizão propõe restrições à contratação de energia não prevista em planos oficiais e à criação de novos subsídios setoriais, exceto aqueles com fins sociais.
“A escolha é se vamos ter transição organizada ou caótica. O que enfrentamos agora é transição caótica, o que é sintoma de desordenamento setorial”, afirmou Ricardo Brandão, diretor executivo de Regulação da Abradee (Associação Brasileira de Distribuidoras de Energia Elétrica).
Entre as sugestões apresentadas estão ainda a modernização das tarifas, a revisão de subsídios existentes, e o fortalecimento da rede de transmissão para se adaptar às mudanças climáticas.
Descarbonização depende de previsibilidade e metas claras
O estudo reforça que, caso a participação das fontes renováveis na matriz caia para menos de 70%, o Brasil pode deixar de ser referência em energia limpa e até se tornar emissor líquido de carbono. Por isso, o setor privado cobra previsibilidade regulatória, investimentos consistentes e metas de curto, médio e longo prazo.
“O recado do setor privado é que precisa de previsibilidade e planejamento”, afirma Marina Grossi, presidente do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS). “Não se faz nada para 2050 sem planejar um plano de ação para o curto prazo.”
Dessa forma, a descarbonização brasileira não depende apenas de tecnologia ou investimentos, mas de coordenação entre governo, empresas e sociedade. Somente com regras claras e visão de futuro será possível manter o protagonismo do país na transição energética global.