De apostas bilionárias na Amazônia e Namíbia a prejuízos e perda de valor: a história da HRT Oil, que deu lugar à PetroRio (PRIO) após fracassar em descobertas comerciais.
No início da década de 2010, o Brasil vivia um ciclo de otimismo no setor de petróleo e gás. A descoberta do pré-sal e a alta no preço do barril despertavam o interesse de investidores e empreendedores. Foi nesse cenário que a HRT Participações em Petróleo S.A., popularmente chamada de HRT Oil, surgiu com um discurso ambicioso: explorar grandes reservas na Amazônia brasileira e em águas profundas na costa da Namíbia, na África.
A empresa levantou bilhões de reais no mercado, contratou equipes internacionais e anunciou campanhas de perfuração que, segundo projeções internas, poderiam transformar o Brasil em um player ainda mais relevante no setor energético. Mas, em poucos anos, a narrativa de sucesso se desfez diante da realidade técnica e econômica. Sem descobertas comerciais relevantes e pressionada por prejuízos, a HRT passou por uma reestruturação profunda, mudando o nome e o foco de atuação para se tornar a PetroRio, hoje especializada em campos maduros de petróleo.
A fundação da HRT Oil e o sonho amazônico
Criada em 2009 por ex-executivos da Petrobras e da antiga PetroRio, a HRT nasceu com um plano ousado: desenvolver áreas onshore na Bacia do Solimões, na Amazônia, onde estudos indicavam potencial para petróleo leve e gás natural. As concessões obtidas pela empresa abrangiam 21 blocos exploratórios, totalizando mais de 48 mil km².
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O diferencial, segundo a companhia, estava na combinação de expertise geológica com tecnologia de ponta para operar em áreas remotas e ambientalmente sensíveis. O discurso atraiu investidores nacionais e estrangeiros, e a HRT rapidamente levantou capital por meio de ofertas públicas de ações na então BM&FBovespa.
A Namíbia como nova fronteira do petróleo
Além da Amazônia, a HRT buscou diversificar suas apostas adquirindo blocos exploratórios offshore na Bacia de Walvis, na Namíbia. A estratégia era aproveitar a geologia semelhante à da costa brasileira, resultado do rompimento do supercontinente Gondwana, o que indicava possibilidade de encontrar reservatórios equivalentes aos do pré-sal.
A operação africana foi vista como a “joia da coroa” para investidores, com a promessa de colocar a HRT entre as descobridoras de grandes reservas offshore. O programa de perfuração previa inicialmente três poços: Wingat-1, Murombe-1 e Mokopane-1.
O entusiasmo do mercado e a valorização das ações
Em 2010 e 2011, a HRT estava no auge de sua valorização. Analistas destacavam o potencial bilionário das descobertas e comparavam a trajetória da empresa à de outras petroleiras independentes que encontraram reservas gigantes.
As ações chegaram a ser negociadas acima de R$ 20, impulsionadas pela expectativa e pelo cenário internacional favorável, com o barril de petróleo acima de US$ 100.
O fundador e então presidente, Márcio Rocha Mello, usava apresentações e entrevistas para reforçar o discurso otimista, chegando a afirmar que a Namíbia poderia conter “o último grande conjunto de reservas inexploradas do mundo”.
A realidade dos poços e a frustração dos investidores
Entre 2012 e 2013, vieram os resultados das perfurações. O Wingat-1, primeiro poço na Namíbia, encontrou petróleo leve, mas em volumes insuficientes para viabilidade comercial. O Murombe-1 e o Mokopane-1 não apresentaram hidrocarbonetos em quantidade relevante.
Na Amazônia, embora houvesse gás natural, o volume e as condições de mercado não justificavam a produção em larga escala. A logística complexa e a ausência de infraestrutura para escoamento encareciam qualquer projeto.
Com os poços sem retorno esperado, o valor de mercado da HRT despencou. Em dois anos, as ações caíram de mais de R$ 20 para menos de R$ 1.
Prejuízos bilionários e mudança de rumo
A sequência de resultados negativos gerou prejuízos acumulados de centenas de milhões de reais. A companhia foi obrigada a cortar despesas, vender ativos e mudar completamente sua estratégia. Em 2013, Márcio Rocha Mello deixou o comando, e uma nova gestão iniciou o processo de reestruturação.
O foco passou a ser a aquisição e revitalização de campos maduros — aqueles com produção em declínio —, aproveitando a experiência operacional e o momento de oportunidade no mercado, com a Petrobras vendendo ativos para reduzir seu endividamento.
O nascimento da PetroRio – PRIO
Em 2014, a HRT mudou oficialmente de nome para PetroRio S.A., marcando o início de uma nova fase. A empresa abandonou a exploração de áreas de alto risco e passou a investir em campos já descobertos, aplicando técnicas para aumentar o fator de recuperação e prolongar a vida útil dos ativos.
Entre os campos adquiridos estão Polvo e Tubarão Martelo, na Bacia de Campos, que se tornaram a base do crescimento da nova PetroRio. Com gestão mais conservadora e foco em eficiência, a companhia voltou a gerar caixa positivo e recuperar valor de mercado.
O legado da HRT e as lições para o setor de petróleo e gás
O caso da HRT é frequentemente citado como exemplo de como projetos de alto risco exploratório podem destruir valor quando não acompanhados de resultados concretos. A combinação de expectativas exageradas, falta de descobertas comerciais e volatilidade do preço do petróleo mostrou os limites do otimismo no setor de óleo e gás.
Por outro lado, a reestruturação para PRIO demonstra que é possível recuperar uma empresa em crise, desde que haja mudança clara de estratégia, disciplina financeira e foco em ativos rentáveis.
Hoje, a PRIO é a maior produtora independente de petróleo do Brasil e segue expandindo seu portfólio de campos maduros, mas a história de sua origem carrega a lembrança de um dos capítulos mais marcantes do mercado de capitais brasileiro.