O avanço da energia solar no Brasil impulsiona a geração limpa, mas especialistas alertam que o excesso de oferta pode causar sobrecargas e até apagões. Entenda os riscos e o que o ONS faz para equilibrar o sistema elétrico nacional.
O Brasil vive uma revolução energética. A rápida expansão da energia solar transformou a matriz elétrica nacional, tornando-a mais limpa e descentralizada. No entanto, o avanço acelerado da geração fotovoltaica, principalmente por meio de pequenos geradores, começa a expor um novo tipo de risco: o apagão por excesso de oferta.
Esse alerta ganhou força após a interrupção de energia registrada na madrugada da última terça-feira (14/10), que deixou o país parcialmente no escuro por mais de uma hora. O Ministério de Minas e Energia confirmou que a falha teve origem em um incêndio na Subestação de Bateias, no Paraná, o que acabou afetando o Sistema Interligado Nacional (SIN) e interrompendo o fornecimento em todas as regiões — com exceção parcial do Sul, onde a recomposição demorou cerca de duas horas.
Aneel cobra explicações e ONS investiga causas do apagão
Após o incidente, a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) enviou ofícios às concessionárias exigindo explicações detalhadas sobre o ocorrido. A agência também abriu processos de fiscalização para identificar responsabilidades e apurar se houve falhas de operação.
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O país ainda carrega a lembrança dos grandes apagões que marcaram sua história. O mais recente, em 2023, afetou 29 milhões de brasileiros e teve origem em uma sobrecarga na transmissão de energia, supostamente provocada por um incêndio no Ceará. “Até hoje, esse apagão não está bem esclarecido, nem o ocorrido nesta terça-feira”, afirma Walter Froes, presidente da CMU Energia e especialista no setor elétrico.
Energia solar em expansão: o boom que desafia o equilíbrio do sistema
Nos últimos anos, o Brasil assistiu a uma verdadeira explosão de investimentos em energia solar, tanto em grandes usinas centralizadas quanto em sistemas residenciais e empresariais. De acordo com especialistas, o custo dos painéis solares caiu 93% desde 2013, o que impulsionou o crescimento vertiginoso da chamada geração distribuída, ou seja, a produção de energia por consumidores individuais.
Esse modelo descentralizado democratizou o acesso à energia limpa, mas também trouxe complexidades inéditas para o controle da rede elétrica. Isso porque o Operador Nacional do Sistema (ONS) não tem domínio direto sobre a energia gerada por pequenos produtores, o que dificulta o equilíbrio entre oferta e demanda em tempo real.
“O sistema elétrico tem que ter geração exatamente igual ao consumo. Se tiver suboferta ou sobreoferta, há riscos de blecautes”, alerta Froes.
Embora o senso comum associe apagões à falta de energia, o problema oposto — a sobra de eletricidade — também pode causar instabilidade no sistema. Quando há geração solar em excesso, especialmente em horários de pico de radiação, a rede elétrica pode ficar sobrecarregada, resultando em quedas de tensão, falhas em subestações e até incêndios.
Essa situação é chamada de curtailment, termo usado quando o ONS decide cortar a geração de usinas solares centralizadas para evitar sobrecarga. Entretanto, o mesmo controle não é possível com os milhares de microgeradores residenciais, que continuam injetando energia na rede mesmo quando não há demanda suficiente.
De acordo com Froes, essa dinâmica pode ter contribuído para o incidente ocorrido em Bateias (PR). “O desequilíbrio entre oferta e consumo também coloca o sistema em risco e pode gerar apagão, devido à sobrecarga”, explica.
ONS monitora o sistema em tempo real para evitar colapsos
Para evitar colapsos no fornecimento, o Operador Nacional do Sistema Elétrico monitora continuamente a geração e o consumo de energia em todo o país. Quando detecta sobras, o órgão aciona mecanismos de ajuste e corte temporário de produção.
Contudo, com a rápida expansão da energia solar distribuída, nem sempre é possível prever a intensidade da geração, principalmente em dias de alta radiação solar. Esse comportamento imprevisível aumenta o desafio de manter o equilíbrio dinâmico da rede, que exige que a quantidade de energia produzida seja exatamente igual à consumida em cada instante.
O crescimento da energia solar é irreversível e traz enormes benefícios ambientais e econômicos. No entanto, especialistas destacam que será preciso investir em sistemas de armazenamento de energia, redes inteligentes e novos mecanismos de controle para garantir a estabilidade do sistema elétrico nacional.
Enquanto isso, órgãos como a Aneel e o ONS reforçam a importância de aprimorar a regulação e ampliar a capacidade de monitoramento da geração distribuída, garantindo que o avanço das fontes renováveis continue sem comprometer a segurança energética do país.