A Taxa das Blusinhas, criada para regular compras internacionais de baixo valor, teve um efeito colateral grave: os Correios registraram um prejuízo superior a R$ 2,1 bilhões. A queda brusca nas importações por consumidores afetou diretamente a receita da estatal, que agora enfrenta um dos maiores rombos financeiros de sua história.
Uma mudança na legislação, aprovada em 2024, gerou um prejuízo bilionário aos Correios. A empresa estatal calcula ter perdido mais de R$ 2,1 bilhões após a criação da chamada “taxa das blusinhas”. O dado foi revelado em um documento interno obtido pelo g1.
A taxa foi proposta pelo Ministério da Fazenda e sancionada pelo Congresso Nacional em junho do ano passado. A medida alterou as regras de importação para compras internacionais de até US$ 50, afetando principalmente os envios vindos da China.
Receita esperada não se confirmou
Antes da nova lei, os Correios esperavam arrecadar R$ 5,9 bilhões com o transporte de mercadorias importadas da China em 2024.
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Mas o valor arrecadado ficou em R$ 3,7 bilhões, ou seja, R$ 2,2 bilhões a menos. A queda representa cerca de 37% do que era esperado.
Mesmo considerando a nova regra e um cenário já mais conservador, os números ficaram abaixo do previsto. Com uma previsão de arrecadação de R$ 4,9 bilhões, ainda assim houve uma perda de R$ 1,7 bilhão.
“A gente tinha uma expectativa de receita, que ela foi frustrada, então essa expectativa de receita frustrada se traduz depois em prejuízo na empresa“, afirmou.
O presidente dos Correios, Fabiano Silva.
Perda de mercado
Outro ponto levantado por Fabiano foi a perda de espaço dos Correios no mercado de entregas internacionais. Antes da nova legislação, a estatal dominava 98% desse segmento. Hoje, essa participação caiu para pouco mais de 30%.
“A gente está em torno de 30 e poucos por cento”, disse Fabiano, ressaltando a entrada de outras empresas no setor, que passaram a realizar o frete de mercadorias internacionais dentro do Brasil.
Segundo fontes ligadas à estatal, os Correios estudam agora formas de reverter a situação. A principal tentativa é alterar o decreto-lei que estabeleceu o novo modelo de tributação simplificada, buscando voltar às regras anteriores.
Déficit e impacto nas estatais
A crise nos Correios foi citada oficialmente pelo Ministério da Gestão como um dos principais fatores para o aumento do déficit das estatais em 2024. Segundo o governo, a estatal teve um rombo de R$ 3,2 bilhões no ano passado.
“A boa parte da explicação do aumento do déficit é o déficit dos Correios, que de fato aumentou bastante”, disse a secretária de Coordenação e Governança das Empresas Estatais, Elisa Leonel.
Ela destacou ainda que a empresa deixou de investir, encerrou contratos e perdeu receitas desde que foi incluída no Plano Nacional de Desestatização, durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Fabiano também reconheceu que os Correios perderam oportunidades no período da pandemia, quando o volume de encomendas estava em alta. “Aquele era o momento de você ter feito um salto de qualidade. Ali a gente tinha que ter diversificado as nossas atividades”, afirmou.
Como funciona a taxa das blusinhas
A nova lei criou uma tributação específica para compras internacionais de até US$ 50, algo que se popularizou com o nome de “taxa das blusinhas”. Apesar de ter sido criticada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a proposta foi sancionada.
A cobrança agora funciona em duas faixas:
- 20% sobre o valor de até US$ 50;
- 60% sobre o valor que ultrapassar esse limite.
Além disso, incide também o ICMS estadual, que será reajustado em abril, passando de 17% para 20%.
A lei prevê um desconto de US$ 20 em compras acima de US$ 50, o que reduz um pouco o peso da tributação.
Por exemplo, em uma compra de US$ 60, o imposto final seria de US$ 16. Isso porque há uma cobrança de 20% sobre os primeiros US$ 50 (gerando US$ 10 de imposto), e 60% sobre os US$ 10 restantes (US$ 6).
Em uma compra maior, de US$ 3 mil, o desconto continua sendo de apenas US$ 20. Ou seja, quanto maior o valor, maior o peso da nova taxa.
Com a queda de receita, perda de mercado e aumento do déficit, os Correios tentam agora reagir. A principal aposta da estatal é rever a legislação e recuperar parte do espaço perdido.
Enquanto isso, a empresa continua sob observação do governo federal, que avalia medidas para garantir sua sustentabilidade financeira.