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Classe média paga mais IR que milionários no Brasil? Estudo revela alíquota de até 11,4% para salários de R$ 19 mil, enquanto super-ricos contribuem com metade disso

Escrito por Alisson Ficher
Publicado em 08/09/2025 às 16:04
Classe média paga mais Imposto de Renda que milionários no Brasil, revela estudo do Sindifisco com base em dados de 2024.
Classe média paga mais Imposto de Renda que milionários no Brasil, revela estudo do Sindifisco com base em dados de 2024.
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Estudo do Sindifisco revela que trabalhadores com salários médios podem pagar alíquotas efetivas de Imposto de Renda superiores às de milionários, expondo distorções provocadas por rendimentos isentos e pela tributação desigual entre capital e trabalho.

Trabalhadores com renda mensal a partir de R$ 6 mil já arcam com uma carga de Imposto de Renda superior à dos milionários no país.

A conclusão é do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal (Sindifisco), que analisou as declarações do IRPF 2024 referentes ao ano-calendário 2023.

Segundo o levantamento, a alíquota efetiva dos muito ricos ficou em 5,28%, enquanto o pico de tributação para assalariados alcançou 11,40% entre 15 e 20 salários mínimos.

A discrepância aparece quando se observam as faixas de renda. Quem recebe entre 5 e 7 salários mínimos registrou alíquota efetiva de 6,63%. Em seguida, o imposto cresce até atingir o ápice entre R$ 19,8 mil e R$ 26,4 mil por mês, com 11,40%.

Já entre os milionários, a carga efetiva média recua para 5,28%, nível inferior ao enfrentado por boa parte da classe média assalariada.

O estudo também mostra que, na base da pirâmide, a tributação é menor, mas sobe rapidamente. Entre 1 e 5 salários mínimos, as alíquotas efetivas variaram de 0,61% a 3,59%.

A partir de R$ 6 mil, contudo, o imposto passa a pesar mais do que entre os declarantes que concentram patrimônio e rendimentos de capital.

Em resumo, quem depende do salário tende a contribuir proporcionalmente mais do que quem concentra renda em fontes isentas.

Renda isenta amplia desigualdade na tributação

Para o Sindifisco, a chave está na relação entre renda total e renda isenta e não tributável. À medida que a renda cresce, também aumenta a fatia não alcançada pelo IRPF.

Entre contribuintes com ganhos acima de 240 salários mínimos por mês — o equivalente a cerca de R$ 316,8 mil —, a parcela isenta chega a 71% do total declarado, algo como R$ 224.928 mensais livres de imposto nessa faixa.

Nas faixas inferiores, o comportamento é o oposto. Em alguns recortes de renda mais baixa, apenas 5% do que é recebido fica isento, o que limita o espaço para deduções e amplia a proporção efetiva do imposto sobre salários.

O resultado é um sistema que onera mais o rendimento do trabalho do que o do capital.

Lucros e dividendos impulsionam disparidade

O presidente do Sindifisco, Dão Real Pereira dos Santos, atribui parte dessa disparidade ao avanço dos lucros e dividendos isentos na composição da renda dos mais ricos.

Segundo ele, essa categoria ganhou peso nas declarações e reforçou o descompasso entre assalariados e detentores de capital.

Pelos dados analisados, 35% de toda a renda declarada no IRPF 2024 correspondeu a rendimentos isentos e não tributáveis, dos quais cerca de 35% eram lucros e dividendos recebidos.

Em valores, a soma de lucros e dividendos superou R$ 700 bilhões em 2023, alta de aproximadamente 14% em relação a 2022, quando ficou em R$ 614,9 bilhões.

Para Santos, esse movimento está associado a estratégias de planejamento tributário que deslocam a remuneração do trabalho para a distribuição de lucros, reduzindo a incidência do IR sobre os mais ricos.

Pejotização e efeitos da legislação

Na avaliação do sindicato, a legislação que isentou lucros e dividendos estimulou a chamada “pejotização”.

Profissionais que antes recebiam salários passaram a atuar como pessoas jurídicas para serem remunerados via lucro distribuído — renda que, pelas regras atuais, não é tributada no IRPF.

“Essa mudança na lei, que isentou lucros e dividendos, também deu início ao processo que chamamos de ‘pejotização’, ou seja, de trabalhadores sendo convertidos a pessoas jurídicas justamente para receberem lucros isentos em vez de salários tributados”, afirma Santos.

Para ele, o resultado é um sistema menos progressivo. “Vemos cada vez mais um planejamento tributário que amplia as rendas isentas e onera as rendas mais baixas”, completa.

O diagnóstico do sindicato aponta, ainda, que 94% dos declarantes têm renda de até 20 salários mínimos — até R$ 26,4 mil mensais —, grupo responsável por 52% do total declarado.

Os 6% restantes, com renda acima desse patamar, concentram os 48% restantes e, sobretudo, a maior parte das parcelas isentas.

Reforma tributária e perspectivas

A reforma tributária no Brasil avançou no fim de 2023 com a aprovação da emenda constitucional, mas a implementação ocorrerá de forma gradual.

Em julho deste ano, a Câmara dos Deputados aprovou a primeira etapa da regulamentação, focada na tributação do consumo.

A previsão é que as mudanças sejam implementadas por etapas e estejam integralmente vigentes em 2033. A segunda fase, que trata da tributação sobre a renda, segue em discussão.

No fim de agosto, os deputados aprovaram urgência para o projeto que amplia a isenção do IR para quem recebe até R$ 5 mil.

A proposta cumpre promessa de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e integra a estratégia do governo para aliviar a carga sobre a base da pirâmide, ao mesmo tempo em que se discute a taxação de lucros e dividendos e a criação de uma alíquota mínima sobre alta renda.

Santos avalia que esse conjunto de medidas pode reduzir a distorção atual, mas não elimina o problema.

“Esse projeto do governo deve desonerar quem ganha até R$ 5 mil. Mas isso ainda é uma correção parcial do problema e precisará ser revisitado”, diz.

Em sua visão, um ajuste mais amplo passa por revogar a isenção de lucros e dividendos e corrigir a tabela do IR, o que permitiria aliviar a carga sobre assalariados e, eventualmente, reduzir a tributação indireta sobre consumo.

Desafios para tornar o sistema mais progressivo

O sindicato ressalta que a discussão sobre a renda volta à pauta com a regulamentação em curso, mas não se encerra com as medidas de curto prazo.

Para a entidade, é necessário calibrar o sistema para recompor a progressividade, aproximando a contribuição dos muito ricos daquela observada entre assalariados.

“Em 2026, praticamente se encerra a discussão tributária. Esse é um primeiro passo, mas nunca poderá ser considerado um passo definitivo”, afirma Santos.

Enquanto a tramitação avança no Congresso, o quadro atual permanece: a classe média assalariada suporta, em média, uma alíquota efetiva maior do que a aplicada aos super-ricos, principalmente devido ao peso das rendas isentas na ponta de cima da pirâmide.

Essa estrutura, segundo os autores do estudo, ajuda a explicar por que o pico de tributação recai sobre salários entre R$ 19,8 mil e R$ 26,4 mil, enquanto a alíquota efetiva dos milionários fica em patamar praticamente metade desse valor.

Com esse cenário, a pergunta que pauta o debate é direta: taxar lucros e dividendos e ampliar a isenção para a base serão suficientes para recompor a progressividade, ou o país terá de redesenhar mais profundamente a tributação sobre renda e consumo?

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Alisson Ficher

Jornalista formado desde 2017 e atuante na área desde 2015, com seis anos de experiência em revista impressa, passagens por canais de TV aberta e mais de 12 mil publicações online. Especialista em política, empregos, economia, cursos, entre outros temas. Registro profissional: 0087134/SP. Se você tiver alguma dúvida, quiser reportar um erro ou sugerir uma pauta sobre os temas tratados no site, entre em contato pelo e-mail: alisson.hficher@outlook.com. Não aceitamos currículos!

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