1. Início
  2. / Ciência e Tecnologia
  3. / Cientistas descobriram que diferentes espécies de peixes abissais da Fossa das Marianas compartilham as mesmas mutações genéticas raras
Tempo de leitura 4 min de leitura Comentários 0 comentários

Cientistas descobriram que diferentes espécies de peixes abissais da Fossa das Marianas compartilham as mesmas mutações genéticas raras

Escrito por Fabio Lucas Carvalho
Publicado em 01/05/2025 às 07:10
Cientistas coletaram amostras de peixes que vivem na Fossa das Marianas, no Pacífico, e em fossas no Oceano Índico. (Crédito da imagem: Han Xu et al. (2025) Evolução e adaptação genética de peixes ao mar profundo. Cell, Volume 188, Edição 5, 1393-1408.e13.
Cientistas coletaram amostras de peixes que vivem na Fossa das Marianas, no Pacífico, e em fossas no Oceano Índico. (Crédito da imagem: Han Xu et al. (2025) Evolução e adaptação genética de peixes ao mar profundo. Cell, Volume 188, Edição 5, 1393-1408.e13.
Seja o primeiro a reagir!
Reagir ao artigo

Mesmo separados por milhões de anos de evolução, peixes que vivem nas maiores profundidades do oceano desenvolveram a mesma mutação genética. Um novo estudo também mostra que poluentes industriais já atingiram até os pontos mais remotos do fundo do mar.

A região mais profunda dos oceanos, a Fossa das Marianas, abriga peixes abissais com aparências bizarras e adaptações genéticas surpreendentes.

Um novo estudo genético revelou que diferentes espécies de peixes abissais — mesmo tendo evoluído separadamente — desenvolveram a mesma mutação genética para sobreviver a ambientes extremos nas profundezas do oceano.

Os resultados impressionam pela semelhança entre espécies que vivem a mais de 3.000 metros abaixo da superfície, em locais como a Fossa das Marianas, no Oceano Pacífico.

A pesquisa, publicada no dia 6 de março na revista Cell, envolveu a análise de DNA de 11 espécies, entre elas peixes-caracol, enguias-de-crista e peixes-lagarto.

Eeles habitam a zona hadal, uma das regiões mais inóspitas do planeta, localizada a cerca de 6.000 metros de profundidade ou mais.

Mesmo gene, diferentes histórias evolutivas

O dado curioso do estudo foi a identificação de uma mutação idêntica no gene Rtf1, em todas as espécies que vivem abaixo dos 3.000 metros.

Esse gene é responsável por controlar a codificação e expressão do DNA.

Segundo o autor do estudo, Kun Wang, da Universidade Politécnica do Noroeste, a mutação apareceu ao menos nove vezes em diferentes linhagens de peixes, todas adaptadas ao fundo do mar.

Apesar de essas espécies terem ingressado nas profundezas em períodos distintos — desde o Cretáceo (cerca de 145 milhões de anos atrás) até o Neógeno (há apenas 2,6 milhões de anos) — elas adquiriram a mesma mutação, de forma independente.

Isso mostra o quanto as condições ambientais extremas do fundo do mar podem moldar a evolução de forma semelhante em organismos diferentes.

O que é evolução convergente

O estudo é um caso clássico de evolução convergente, quando espécies diferentes, sem relação direta entre si, acabam desenvolvendo características semelhantes por viverem em ambientes parecidos.

É o que explica o ictiólogo Ricardo Betancur, da Universidade da Califórnia em San Diego, que não participou do estudo. “É um lembrete poderoso de que a evolução frequentemente reutiliza o mesmo conjunto limitado de soluções quando confrontada com desafios semelhantes”, disse ele em entrevista à Live Science.

Segundo os cientistas, essas adaptações envolvem não só mudanças genéticas, mas também estruturas ósseas específicas, alteração dos ritmos circadianos e formas especializadas de percepção — seja por meio de visão altamente sensível à luz ou por outros sentidos não visuais.

Tecnologia para alcançar os abismos

As amostras analisadas foram coletadas em profundidades que variam de 1.200 a 7.700 metros, com a ajuda de veículos operados remotamente e submarinos tripulados.

A coleta ocorreu tanto na Fossa das Marianas como em outras fossas oceânicas do Oceano Índico.

Essas regiões representam alguns dos locais mais extremos e inacessíveis do planeta, com altíssimas pressões, temperaturas próximas ao congelamento e escuridão total.

Ainda assim, a vida floresce ali, e agora os cientistas sabem um pouco mais sobre como isso é possível.

Poluição nas maiores profundezas da Terra

Além das descobertas genéticas, os pesquisadores também encontraram algo preocupante.

Foram detectadas substâncias químicas industriais nos peixes e nos sedimentos marinhos da Fossa das Marianas.

Isso inclui compostos como os bifenilos policlorados (PCBs), proibidos desde os anos 1970, e éteres difenílicos polibromados (PBDEs), usados como retardantes de chamas.

Os PCBs foram identificados nos tecidos hepáticos de peixes-caracol hadais.

Já os PBDEs apareceram em amostras de sedimentos coletadas a mais de 10.000 metros de profundidade. Essas substâncias são conhecidas por seus efeitos nocivos à saúde humana e ao meio ambiente.

Impacto humano atinge até a Fossa das Marianas

As descobertas confirmam que a poluição gerada por atividades humanas alcança até os ambientes mais remotos do planeta. Estudos anteriores já haviam identificado microplásticos e poluentes químicos nas regiões abissais, mas este novo levantamento mostra o alcance ainda mais profundo desses contaminantes.

A presença de resíduos industriais a tais profundidades é um alerta sobre como os impactos da civilização se estendem muito além da superfície. Mesmo nos pontos mais isolados da Terra, a marca da atividade humana está presente — uma realidade difícil de ignorar.

Enquanto os ciientistas comemoaram o avanço no entendimento da evolução em ambientes extremos, o estudo também reforça um paradoxo inquietante.

As mesmas tecnologias que permitem explorar as regiões mais profundas do oceano também revelam o quanto esses locais já foram afetados pela ação humana.

Em meio ao frio, à escuridão e à alta pressão, a vida resiste — mas carrega as marcas de um mundo cada vez mais poluído.

Inscreva-se
Notificar de
guest
0 Comentários
Mais recente
Mais antigos Mais votado
Feedbacks
Visualizar todos comentários
Fabio Lucas Carvalho

Jornalista especializado em uma ampla variedade de temas, como carros, tecnologia, política, indústria naval, geopolítica, energia renovável e economia. Atuo desde 2015 com publicações de destaque em grandes portais de notícias. Minha formação em Gestão em Tecnologia da Informação pela Faculdade de Petrolina (Facape) agrega uma perspectiva técnica única às minhas análises e reportagens. Com mais de 10 mil artigos publicados em veículos de renome, busco sempre trazer informações detalhadas e percepções relevantes para o leitor. Para sugestões de pauta ou qualquer dúvida, entre em contato pelo e-mail flclucas@hotmail.com.

Compartilhar em aplicativos
0
Adoraríamos sua opnião sobre esse assunto, comente!x